segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

O poder das ruas

As manifestações deste domingo, em várias cidades do país, acentuaram seu foco para a desastrada atuação dos congressistas, que construíram medidas visando à inibição das investigações da Operação Lava-Jato e de ações de polícias, procuradores e juízes federais, fato que obrigou o Palácio do Planalto e lideranças partidárias do Senado Federal a avaliar as consequências da aprovação do projeto da Lei de Abuso de Autoridade, cuja tramitação poderá passar por ritmo de desaceleração, inclusive com a sua saída da pauta de votação do plenário.
Acontece que o principal alvo dos protestos foi exatamente o presidente do Senado, que é responsável pelo supracitado projeto e foi quem o inseriu no calendário de apreciação da matéria, nesta semana.
Diante da pressão pública, a avaliação de líderes da base e interlocutores do governo é no sentido de que, por absoluta cautela, a tendência política aconselha que a matéria poderá ser retirada da lista de prioridades de votação.
O governo já manifestou a intenção de não se envolver em assuntos do Legislativo, de modo que o projeto em causa não seja aprovado no Congresso e em seguida seja colocado no colo do presidente, que ficaria com a obrigação de decidir pela sanção ou pelo veto das medidas.
O certo é que, por enquanto, o governo foi preservado dos protestos das ruas, mas ele tem forte receio de ser logo em breve engolido pelas ondas de críticas, em razão dos reiterados protestos da população.
O governo também se manifestou defendendo que os “Poderes da República estejam sempre atentos às reivindicações da população brasileira. A força e a vitalidade de nossa democracia foram demonstradas mais uma vez, neste domingo, nas manifestações ocorridas em diversas cidades do país”.
Por sua vez, o líder do governo no Senado disse que é pessoalmente contra a votação do projeto em apreço. Ele lembrou que “A atualização de uma matéria de 1950 não pode ser prioridade agora”.
Já o líder do DEM no Senado afirmou que vai apresentar pedido de retirada de pauta da matéria, porque “Não podemos ter uma pauta provocativa nem podemos fazer uma queda de braço com a população”, ponderando que é preciso preservar a governabilidade do país.
A crise instalada pelos congressistas precisa ser distendida por meio de medida coerente, que levem à reflexão e à avaliação sobre as consequências que as loucuras intempestivas do Parlamento podem contribuir para aumentar ainda mais as graves situações política e econômica, que estão sendo conduzidas ao sabor da incompetência, prepotência e onipotência, onde são visíveis os prejuízos para o interesse público, à vista dos péssimos resultados conseguidos até o momento, principalmente no contexto econômico.
O fato é que a economia se encontra estagnada, em razão da forte recessão, do altíssimo desemprego e da indiscutível falta de investimentos público e privado, exatamente por falta de produção, emprego, consumo, arrecadação, entre outros fatores que estão travando os mecanismos próprios do crescimento econômico, enquanto parlamentares ficam produzindo projeto para aumentar ainda mais os atritos com a sociedade.
É preciso que os homens públicos, não importando suas ideologias senão de brasilidade, sejam capazes de intermediar a grave crise de poder, em especial despontado nas hostes do legislativo, como se a sua origem não fosse o próprio povo, que tem sido, de certa forma, alvo das medidas colocadas em pauta pelo Congresso, uma vez que elas deixam de atender os objetivos de moralização ansiados pela população, que não suporta mais tanta incompreensão dos políticos, quanto à sua resistência à adesão ao sentimento anticorrupção.
Não há dúvida sobre a roubalheira que grassa no país, como peste daninha que dizima os orçamentos públicos, tendo como mentores, na sua maioria, homens públicos, que fazem questão de demonstrar sua oposição aos mecanismos contra a corrupção, a exemplo do que seria o já conhecido "pacote anticorrupção", contendo dez medidas apoiadas pelo povo, que foram, por enquanto, reduzidas a menos de três, com grande possibilidade de ser exprimidas a pó, ou seja, a absolutamente nada.
As referidas medidas, por seu importante espírito de moralização, poderiam ter sido aproveitadas e examinadas, pelo menos, com o escopo de aperfeiçoamento inerente ao que se espera de um Parlamento digno representante do povo, com dedicação e esforço direcionados à produção de medidas legislativas com cunho em estrita defesa do interesse público.
Os projetos oriundos do Legislativos dão a nítida impressão de que os fatos suspeitos de irregulares podem ser investigados, mas sob a condição de que qualquer interpretação não favorável aos envolvidos está possível de punição para aqueles que têm a incumbência constitucional e legal de promover as apurações pertinentes, deixando muito claro que é melhor não haver investigação sobre algum fato suspeito, à vista da possibilidade de alguém ser punido e multado por ter ofendido a dignidade de envolvido em casos suspeitos de incorreção
À toda evidência, as leis sobre abuso de autoridade têm a exclusiva finalidade de intimidar o aparelho do Estado responsável pelas investigações, que perde a autonomia para trabalhar com independência e soberania quanto ao resultado do seu desempenho, que pode ser objeto de avaliação, com vistas à possível teste de validade, sob o critério de ter ofendido ou não às autoridades da República, que não podem ser investigadas por simples suspeitas de fatos irregulares.
As medidas em pauta no Congresso, nitidamente de cunho pro-corrupção, são cristalinas afrontas à tentativa de moralização da administração pública, à vista da implantação de normas jurídicas que impõem freios às atividades normais e próprias dos sistemas do Estado de investigação, que precisam ser independentes e livres de restrições, não podendo ficar na pendência de avaliação sobre seus resultados, como fazem normalmente as nações sérias, civilizadas e cônscias da responsabilidade cívica, considerando que a real finalidade das apurações com isenção e imparcialidade é mostrar a verdade sobre os fatos denunciados, de modo que os envolvidos possam responder, se for o caso, por seus crimes contra a administração pública, em termos de prestação de contas sobre seus atos públicos, com consequente reparação dos prejuízos causados ao erário. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 05 de dezembro de 2016

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