Um
ministro do Supremo Tribunal Federal, que é o relator da Operação Lava-Jato na
Corte, negou, pasmem, habeas corpus a uma mulher de 39 anos, presa em flagrante
em 2011, por ter tentado furtar de um estabelecimento comercial, numa cidade
mineira, dois desodorantes e cinco frascos de chicletes,
cujo valor atualizado soma R$ 42,00.
O
recurso da defesa tinha o objetivo de arquivar o processo criminal, que não
informa se e quando ela foi solta.
O
curioso é que o mencionado relator da Lava-Jato, considerada a maior operação
de combate à corrupção da história brasileira,
terá que decidir, entre outras coisas, sobre a concessão de habeas corpus a
acusados suspeitos de terem se beneficiados de quantias
milionárias conseguidas de forma irregularmente em transações com
o poder público.
O
ministro sustentou a tese de que a insignificância penal,
em virtude da inexpressividade do valor dos bens que se tentou furtar e que foi
restituído ao estabelecimento – sustentada pela Defensoria Pública -, não
poderia ser aplicada devido ao fato de a mulher ser reincidente nesse tipo de
crime.
O
ministro relator da Lava-Jato acompanhou a proposta de decisão do relator da
ação, que entendeu que ficou evidenciada nos autos a reiteração criminosa da ré,
tendo afirmado, in verbis: “A conduta em si mesma, delito tentado de
pequeno valor, se reveste de insignificância, mas o contexto revela que a
acusada, no caso, é pessoa que está habituada ao crime”, e concluiu pelo
indeferimento do habeas corpus.
Anteriormente,
tanto o Tribunal de Justiça de Minas Gerais quanto o Superior Tribunal de
Justiça tinham negado o habeas corpus pelo mesmo motivo, em acompanhamento dos
termos do parecer do Ministério Público Federal, também pelo indeferimento da
causa.
Não
obstante, por fim, o bom senso e sensatez foram devidamente aplicados e o habeas
corpus foi concedido pelo Supremo, com a sensibilidade dos outros três
ministros da Segunda Turma, que discordaram dos supramencionados ministros, que
mostraram sua implacabilidade contra uma senhora absolutamente carente da
compreensão humana.
Um
dos ministros favoráveis à concessão argumentou que “a ré pegou os produtos na gôndola, colocou-os na bolsa e passou pelo
caixa sem pagar e que somente depois é que o funcionário do estabelecimento
acionou a guarda municipal.”.
O
ministro disse que muitas vezes, nesses casos, em que os clientes têm acesso
direto aos produtos e há fiscalização, o estabelecimento espera a pessoa sair
para só então abordá-la, em vez de fazê-lo diretamente na passagem pelo caixa
e, ainda dentro do estabelecimento, cobrar pelos produtos.
Ele
concluiu com a afirmação de que “Nesse
tipo de conduta, em que há vigilância, estamos diante da inexistência de
tipicidade, porque a agente poderia ser abordada dentro do supermercado e
cobrada”.
Já
outro ministro que também votou favorável à causa lembrou do princípio da
ofensividade para afirmar que danos sem importância devem ser considerados
atípicos. Ele rejeitou a chamada perseverança criminal, uma vez que não se pode
falar em reiteração se não existe condenação penal contra a ré e concluiu
dizendo que “Isso ofende inclusive o
postulado da presunção da inocência”.
O simples fato de esse processo precisar ser
submetido ao crivo da Excelsa Corte de Justiça já demonstra a total falta de
razoabilidade quanto à atuação jurisdicional dela, que se permite a
disponibilização de cinco ministros para a análise de causa de pequeno valor,
que poderia muito bem ser decidida em instância bem inferior.
É evidente que não haveria a menor justificativa
para a ocupação de ministros que têm montanhas de milhares de processos de
extrema relevância para apreciar e decidir em benefício do interesse público,
mas eles são preteridos por habeas corpus absolutamente insignificante, porque
poderia ser resolvido e encerrado logo na inicial, poupando o precioso tempo para
o exame de causas realmente importantes para o país.
Há de se convir que muitos processos envolvendo
principalmente políticos deixam de ser apreciados pelo Supremo, sendo simplesmente
arquivados, por terem sido alcançados pela famigerada prescrição, justamente
devido à avalanche de ações sem a menor expressividade como essa, que é
representada pelo insignificante valor atualizado de pouco mais de quarenta
reais.
À vista do exposto, é evidente que o Supremo Tribunal
Federal precisa reformular, com urgência, a sua sistemática de atuação,
levando-se em conta os princípios da razoabilidade, do bom senso, da celeridade
processual, da economicidade, dentro outros que permitam se atribuir prioridade
para o julgamento das causas efetivamente relacionadas não somente com o
interesse público, mas em especial com a sua precípua missão institucional de
zelar sobretudo pela defesa das grandes causas nacionais, com embago de ações
que podem ser resolvidas em instâncias iniciais do Poder Judiciário. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 15 de julho de 2017
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