quarta-feira, 12 de junho de 2019

Qual a força da ilicitude?


Mensagens atribuídas ao ex-juiz então responsável pela Operação Lava-Jato e um procurador do Ministério Público Federal foram divulgadas pelo site Intercept Brasil, mostrando que os dois trocavam colaborações no âmbito da força-tarefa daquela operação.
As referidas mensagens fazem referências a casos, na essência, como o processo que culminou com a condenação à prisão do ex-presidente da República petista, com relação à ação do tríplex de Guarujá.
A sentença condenatória do ex-juiz da Lava-Jato foi confirmada pela segunda instância, com sede no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e chancelada pelo Superior Tribunal de Justiça, que reduziu a pena para oito anos, 10 meses e 20 dias de prisão.
A reportagem ressalta que as mensagens vindas a público revelam troca de opiniões, ordem e orientações processual e operacional, cobrança sobre a realização de novas operações, conselhos e pistas sobre deflagração de operações ministeriais.
Segundo a reportagem, especialistas em direito declararam que, em princípio, não haveria nenhuma grave ilegalidade nas mensagens, a ponto de perturbar ou comprometer a legitimidade dos julgados, mas pode ter havido desvio ético que não interfere no resultado do julgamento em causa, ou seja, em princípio, tudo não passa de marola, em termos de efeitos jurídicos.
Após a publicação das reportagens, a equipe de procuradores da operação divulgou nota chamando a revelação de mensagens de "ataque criminoso à Lava-Jato" e disse que o caso põe em risco a segurança de seus integrantes.
A força-tarefa da Lava-Jato afirmou que os procuradores "foram vítimas de ação criminosa de um hacker que praticou os mais graves ataques à atividade do Ministério Público, à vida privada e à segurança de seus integrantes. A violação criminosa das comunicações de autoridades constituídas é uma grave e ilícita afronta ao Estado e se coaduna com o objetivo de obstar a continuidade da Operação, expondo a vida dos seus membros e famílias a riscos pessoais".
Sobre o teor dos diálogos, os procuradores afirmam que as informações foram tiradas de contexto, o que pode gerar interpretação equivocada, porque "Vários dos integrantes da força-tarefa de procuradores são amigos próximos e, nesse ambiente, são comuns desabafos e brincadeiras. Muitas conversas, sem o devido contexto, podem dar margem a interpretações equivocadas. A força-tarefa lamenta profundamente pelo desconforto daqueles que eventualmente tenham se sentido atingidos.".
Os procuradores disseram que "A ação vil do hacker invadiu telefones e aplicativos de procuradores da Lava Jato usados para comunicação privada e no interesse do trabalho, tendo havido ainda a subtração de identidade de alguns de seus integrantes. Não se sabe exatamente ainda a extensão da invasão, mas se sabe que foram obtidas cópias de mensagens e arquivos trocados em relações privadas e de trabalho. Dentre as informações ilegalmente copiadas, possivelmente estão documentos e dados sobre estratégias e investigações em andamento e sobre rotinas pessoais e de segurança dos integrantes da força-tarefa e de suas famílias. Há a tranquilidade de que os dados eventualmente obtidos refletem uma atividade desenvolvida com pleno respeito à legalidade e de forma técnica e imparcial, em mais de cinco anos de Operação",
Os procuradores afirmam ter "três preocupações", a saber: "Primeiro, os avanços contra a corrupção promovidos pela Lava-Jato foram seguidos, em diversas oportunidades, por fortes reações de pessoas que defendiam os interesses de corruptos, não raro de modo oculto e dissimulado. A violação criminosa das comunicações de autoridades constituídas é uma grave e ilícita afronta ao Estado e se coaduna com o objetivo de obstar a continuidade da Operação, expondo a vida dos seus membros e famílias a riscos pessoais. Ninguém deve ter sua intimidade - seja física, seja moral - devassada ou divulgada contra a sua vontade. Além disso, na medida em que expõe rotinas e detalhes da vida pessoal, a ação ilegal cria enormes riscos à intimidade e à segurança dos integrantes da força-tarefa, de seus familiares e amigos. É importante dar continuidade ao trabalho. Apenas neste ano, dezenas de pessoas foram acusadas por corrupção e mais de 750 milhões de reais foram recuperados para os cofres públicos. Apenas dois dos acordos em negociação poderão resultar para a sociedade brasileira na recuperação de mais de R$ 1 bilhão em meados deste ano. No total, em Curitiba, mais de 400 pessoas já foram acusadas e 13 bilhões de reais vêm sendo recuperados, representando um avanço contra a criminalidade sem precedentes. Além disso, a força-tarefa garantiu que ficassem no Brasil cerca de 2,5 bilhões de reais que seriam destinados aos Estados Unidos.”.
Em conclusão, os membros do Ministério Público Federal afirmaram que “Renovam publicamente o compromisso de avançar o trabalho técnico, imparcial e apartidário e informam que estão sendo adotadas medidas para esclarecer a sociedade sobre eventuais dúvidas sobre as mensagens trocadas, para a apuração rigorosa dos crimes sob o necessário sigilo e para minorar os riscos à segurança dos procuradores atacados e de suas famílias".
A defesa do ex-presidente afirmou que a reportagem do Intercept revela detalhes de trama, já denunciada, que envolve "uma atuação combinada entre os procuradores e o ex-juiz Sergio Moro, com o objetivo preestabelecido e com clara motivação política, de processar, condenar e retirar a liberdade do ex-presidente. A atuação ajustada dos procuradores e do ex-juiz da causa, com objetivos políticos, sujeitou Lula e sua família às mais diversas arbitrariedades. A esse cenário devem ser somadas diversas outras grosseiras ilegalidades".
Possivelmente essa incontrolável euforia possa ter por base as manifestações exacerbadas de causídicos favoráveis à liberdade do principal político do país, por também acreditarem na inocência dele e, inacreditavelmente, na culpabilidade do ex-juiz e dos procuradores da força-tarefa da Lava-Jato, evidentemente no afã de se sentirem aliviados nos seus sufocantes sofrimentos pela prisão de pessoa considerada injustiçada, por eles, por certo, à luz da sua concepção sobre o que sejam princípios de honestidade, dignidade e moralidade, entre outros que devem se exigir dos homens públicos de verdade.
Nesse contexto de muita ansiedade, parece importante também se conhecer a opinião de quem tem visão dissonante dos defensores do condenado, com vistas a se colocar luzes sobre os últimos acontecimentos e assim possibilitar melhor compreensão sobre eles.
Trata-se da manifestação do jurista e catedrático Modesto Carvalhosa, que disse, in verbis: “Para todos aqueles que tenham ainda alguma dúvida sobre a idoneidade do ministro Moro e do procurador Dallagnol, por desconhecimento ou por acreditar na mídia que tenta fazer ‘tempestade em copo d’água’, esclarecemos, de modo sucinto, segundo este exígua espaço permite, os termos da lei: 1 – As mensagens trocadas entre Moro e Dallagnol foram obtidas ilicitamente, mediante prática do crime de invasão de dispositivo informático por parte de hackers (art. 154-A do Código Penal). Tais mensagens só poderiam ser obtidas de maneira lícita, caso fossem objeto de decisão judicial em inquérito ou processo criminal, tendo em vista a proteção da intimidade e da inviolabilidade das comunicações e mereceriam interpretação sistemática relacionada com o contexto da atividades dos dois. Fragmentos montados não representam o todo. 2 – Além disso, cabe notar que o conteúdo das conversas divulgadas não demonstra quebra de imparcialidade: as conversas dizem respeito apenas a questões  processuais e procedimentos quanto ao trâmite de processos; 3 – Não se verifica antecipação do juízo de mérito pelo Juiz. Percebe-se que Juiz e Procurador da República conversam sobre ordem, tramitação e admissibilidade de ações penais, matérias procedimentais e processuais. Não são tratadas questões relativas à culpa dos acusados, se são inocentes ou culpados. 4 – É normal a comunicação entre MPF e o Juiz quanto ao fluxo e ritmo dos processos, dado que a força tarefa foi instituída com a finalidade de conferir maior eficiência na tramitação dos referidos processos. Não há qualquer vedação legal à comunicação entre Juiz e Ministério Público, e tampouco entre advogado e Juiz. 5 – Observe-se que questões procedimentais costumam normalmente ser tratadas por advogados e Ministério Público em despachos e audiências com Juízes, sendo absolutamente comuns na prática forense. 6 – Quanto à possível suspeição por aconselhamento da parte (art. 254, IV), esta não se aplica ao Ministério Público, apenas ao réu ou à vítima. No processo penal brasileiro, o Ministério Público, órgão de Estado essencial à Justiça, não é considerado parte no sentido estrito, pois vela pelo interesse público (art. 127 da CF), detém a condição de fiscal da lei e de velar pela pretensão punitiva estatal. 7 – Embora se incumba da acusação criminal em Juízo, como fiscal da lei, pode o Ministério Público pedir tanto a condenação quanto a absolvição do acusado. Por outro lado, a defesa privada sempre é parcial em favor do réu, não possuindo as mesmas atribuições  de caráter público conferidas ao Ministério Público”.
A aludida manifestação mostra os fatos sem um pingo de paixão, apenas tendo a tentativa de dizer que a gravidade da revelação de fatos sigilosos pode implicar seríssima punição para os culpados, ficando muito claro que a prática pelo crime de invasão à privacidade não tem o condão de beneficiar condenado nem de contribuir para mostrar a sua inocência, porque os fatos objeto da denúncia ainda se encontram à espera das provas para se infirmar a acusação.
Ou seja, tudo não passa do que se pode chamar de alarme falso, mesmo porque não tem cabimento, na Justiça, que alguém seja beneficiado pelo surgimento de fatos conseguidos por meios ilícitos e que não dizem respeito diretamente ao cerne do objeto da condenação, qual seja, prática dos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva, conquanto sobre isso nada foi acostado aos autos, para provar a inocência do condenado.
O site Intercept Brasil, pela demonstração de competência de interceptação ilegal e criminosa, por que feita sem autorização legal ou judicial, até que poderia ter prestado excelentes serviços ao Brasil, tendo o cuidado de ter gravado e revelado as ilicitudes relacionadas com os escândalos do mensalão e do petrolão, mostrando, de forma minuciosa, as operações de desvios de dinheiro público, com a complacência de políticos, executivos, executivos e outros agentes aproveitadores do dinheiro público, tudo sob o conhecimento de autoridades púbicas, o que poderia ter contribuído para facilitar o espinhoso trabalho desenvolvido pela Operação Lava-Jato, para investigar e desentranhar os meandros das falcatruas que resultaram na maior roubalheira já perpetrada contra os cofres públicos.
É pena que esse site tenha deixado de prestar importante serviço de interesse dos brasileiros, diante de sua enorme capacidade de interceptação, de forma irregular, de informações preciosas que poderiam ter levado facilmente aos criminosos que agiram impunemente contra os interesses nacionais.
          O trabalho sujo - por que feito ilegalmente - apresentado agora pelo referido site mostra a fragilidade do sigilo empregado pela Operação Lava-Jato, em possibilitar que hacker se apoderasse de informações de trabalhos da sua lavra, cujas falhas de controle poderiam ter sido evitadas caso o sistema fosse capaz de interceptar invasões ilícitas e retirada de importantes dados pertinentes às suas operações.
Não há dúvida de que a Operação Lava-Jato demonstrou, até o momento, falhas absolutamente formais, sem nenhum comprometimento à seriedade dos fatos objeto da denúncia feita à Justiça, a ponto de justificar qualquer motivação que leve à anulação das sentenças proferidas pela Justiça, com base em fatos devidamente comprovados nos autos, ante a confirmação da sua materialidade.
          Tanto isso é verdade que, sobre a ação, três instâncias já se pronunciaram sobre ela e foram unânimes quanto ao veredicto da lavra do juiz da Lava-Jato, que até pode ter sido descuidado em conversas no âmbito dos trabalhos que fazem parte da força-tarefa, quando estava sob o seu comando, mas sem qualquer possibilidade de aliviar ou agravar a culpabilidade do réu, que não teve condições de produzir argumentos em sua defesa, contrários às provas constantes dos autos, ou seja, a sua inocência deixou de ser socorrida justamente por quem tinha a obrigação de prová-la.
Agora, não passa de tremendas ingenuidade e infantilidade alguém se vangloriar, diante de informações obtidas por meios ilícitos, consistentes  em conversas sobre estratégias de trabalho, mesmo que isso possa ser considerado antiético, cujos atos merecem, no máximo, investigações, para o fim de se apurar a sua veracidade, como se elas tivessem o condão de transformar, em passe de mágica, caso escabroso e irregular em ato legítimo, honesto, digno, a ponto de o condenado passar a ser aplaudido como verdadeiro herói de muitas pessoas que se mostram insensíveis aos sentimentos de moralidade e honestidade, tão somente pelo prazer de se aferrar à mórbida ideologia que já demonstrou, de maneira inexplicável, achar que condutas antiética e imoral de político endeusado por não ter feito senão verdadeira manipulação social em nome do populismo e do caudilhismo, centralizados em região que insiste em conservar esse sentimento que, à luz do bom senso e da racionalidade, não condiz com a valorização dos princípios verdadeiramente da moralidade, do decoro, da ética, da dignidade, da honestidade e principalmente do mínimo amor à conduta retilínea de correção que precisa necessariamente existir no âmago dos homens públicos.
Esses princípios, à toda evidência, são nitidamente inexistentes em quem responde na Justiça, como réu, a processos contendo graves denúncias por práticas de crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, tráfico de influência, obstrução à Justiça, falsidade ideológica, além de condenações, pela prática de crimes contra a administração pública, fatos que somente afiançam o nível de tantos quanto acham isso absolutamente natural, fazendo questão de nem perceber, à luz dos sentimentos de civilidade mesmo pouco evoluída, que isso nada mais é do que a marca plena da decadência moral da sociedade, que despreza, sem o menor pudor, exclusivamente por apego à ideologia, os comezinhos princípios de cidadania e todos os outros que ajudam a reafirmar e consolidar o sentimento razoável de dignidade do ser humano, quando ele simplesmente não consegue valorizar condutas retilíneas de correção e verdade.
Causa perplexidade que essa idolatria, de homens de bem, pessoas trabalhadoras, pais de família, em sã consciência de suas responsabilidades cidadãs, possam acreditar na inocência de pessoa pública com as costas sobrecarregadas com os fardos pesados dos volumosos processos recheados de gravíssimas denúncias de irregularidades praticadas contra a administração pública e o que é pior, conforme fica muito claro agora, os culpados nesse imbróglio são o ex-juiz e os procuradores, que, cumprindo as suas funções de agente do Estado, levaram-no à prisão, ou seja, quem combate a corrupção e defende os interesses da sociedade, em um país com gente com essa mentalidade diferenciada, merece condenação, evidentemente sob o prisma deles.    
Estão em investigação e julgamento atos contrários ao interesse do Brasil e os brasileiros, como se tudo isso ainda não fosse suficiente para mostrar que um dos envolvidos não se trata de pessoa imaculada nem absolutamente inocente, porque se fosse de boa índole nem teria sido condenada pela Justiça em circunstâncias diferentes, pelos mesmos crimes, o que vale dizer que a vanglória em prol de condenado é o mesmo que se avalizar cumplicidade com a prática de atos contrários aos princípios republicanos da moralidade, da dignidade, da probidade, entre outros que precisam ser rigorosamente observados nas vidas pública e privada.              
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 12 de junho de 2019

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