sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

O poderoso cartão corporativo

 

Segundo a imprensa, tendo por base dados obtidos por força da Lei de Acesso à Informação, a viagem de férias do presidente da República, no final de ano, feita para Santa Catarina, teria custado aos cofres públicos, pasmem, a bagatela do valor de R$ 899,3 mil.

O presidente do país permaneceu na cidade litorânea de São Francisco do Sul, naquele estado, no período de 27 de dezembro até a madrugada do dia 3 de janeiro, quando precisou antecipar o fim das férias e ir para São Paulo, devido à obstrução intestinal.

É inacreditável que, em tão poucos 8 dias, alguém possa torrar tanto dinheiro, quase R$ 900 mil, exclusivamente para o gozo de descanso, sem nenhum retorno para o interesse da sociedade.

Fica muito difícil acreditar que tudo isso é possível por meio dos gastos secretos, pagos com o famigerado cartão corporativo, que já fora tão criticado pelo próprio presidente, com relação aos seus antecessores, que faziam verdadeira farra com o dinheiro dos contribuintes, nesse particular, mas agora tudo não passa de mero divertimento de férias presidenciais, sem a menor preocupação com os minguados recursos públicos, conforme mostram os gastos em referência.

O que causa maior perplexidade em tudo isso é saber que um dos lemas prediletos do presidente do país, evidentemente no começo do seu governo, era o de que: “acabou a mamata, p....!”, em conjunto com outras ideias que foram jogadas literalmente na cesta do lixo, como estas: “comigo não tem toma lá dá cá; não tem Centrão!” e “se for para fazer o que os outros presidentes fizeram, trocar cargos por votos, nem entro”.

A verdade é que, infelizmente, os desperdícios e as loucuras com o dinheiro público apenas foram potencializados nesse governo, conforme o péssimo exemplo da torração de recursos dos contribuintes, em poucos dias de férias espetaculares, em verdadeiras orgias com a dinheirama consumida, em demonstração de total descontrole, por meio do cartão corporativo.

 O abuso com a gastança é facilitado pela maneira secreta das despesas, por meio desse artifício, em que elas não precisam de prestação de contas, por serem classificadas como secretas, ou seja, o presidente do país fica isento de justificar a destinação de seus gastos por meio do cartão corporativo, algo que é extremamente condenável e censurável, uma vez que a norma orçamentária obriga a transparência dos dispêndios públicos, na forma da comprovação da sua boa e regular aplicação.

O governo, com o mínimo de responsabilidade pública, jamais permitiria a existência do cartão corporativo na sua gestão, que ser forma ultrajante e descabida de gastos públicos, porque esta tem como essência a transparência e a prestação de contas das despesas perante a sociedade, que tem a obrigação de abastecer os cofres por onde fluem os rios do dinheiro fácil, que sustenta a gastança do recriminável cartão.

O que se pode dizer do sentido de que “acabou a mamata, p....!, para o presidente do país, é que ele já realizou 26 viagens internacionais, que, de forma objetiva, não resultaram em quase nada de positivo para o Brasil, salvo muitos e elevados gastos públicos.

Nessas viagens, em 18 delas, ao menos um de seus filhos esteve presente na comitiva presidencial, como acompanhante do pai, quando nenhum deles faz parte da estrutura do governo, que, de uma forma ou de outra, tem despesa com eles, além deles se afastarem dos seus locais de trabalho, conforme o caso, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou da Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, continuando a receberem a devida  remuneração, sem trabalhar.

À toda evidência, isso se chama, no mínimo, desvio de finalidade pública e não condiz com os princípios da boa gestão pública, que tem como essência o respeito e o zelo para com a coisa pública, assim considerado o fiel cumprimento da obrigação funcional e do primor pela austeridade na aplicação do dinheiro público, na forma da lei.

Caso o presidente do país tivesse o mínimo de amor à causa pública, já teria acabado com essa excrescência de cartão corporativo, porque a esdrúxula permissividade de se gastar sem precisar prestar contas é apenas a confirmação da esculhambação e da desmoralização da administração pública, em que o próprio presidente passa a ser cúmplice com a explícita falta de seriedade com os gastos públicos, que estão livres de controle e fiscalização da sociedade.

Acredita-se que nem nas republiquetas seja institucionalizado tamanha desmoralização com os gastos públicos, por meio da promiscuidade amparada por cartão corporativo, que tem as suas despesas classificadas como secretas, em que, por meio desse imoral sistema, seja possível a extrapolação da razoabilidade da despesa, a exemplo do que foi gasto nas últimas férias presidenciais, com o absurdo somatório de quase R$ 900 mil, diante dos minguados orçamentos, sempre limitados com relação aos gastos necessários à satisfação dos serviços e das obras públicos.

Em termos mínimos de seriedade e respeito ao patrimônio dos brasileiros, o presidente da República tem sim o dever constitucional de justificar perante a sociedade a real necessidade de tamanho gasto, de modo que possa comprovar a sua regularidade como despesas realmente indispensáveis ao apoio das atividades presidenciais, embora pareça, em princípio, verdadeiro exagero o gasto de tanto dinheiro logo em viagem de férias.

Por fim, muito se diz e se alega que não tem corrupção no governo, o que não é verdade, porque a má realização de despesa, como nesse caso, fica caracterizado abuso na aplicação de recurso público, só que ela está travestida da suposta legalidade, embutida no biombo secreto do cartão corporativo, que permite a prática de exageros, porque, do contrário, as despesas seriam ostensivas e haveria a devida e a regular prestação de contas à sociedade.

É preciso sim se insistir, com frequência, à vista dos sagrados princípios da austeridade e da economicidade, que os eleitores acordem e se conscientizem sobre a necessidade de exigirem que os representantes do povo tenham compromisso com o rigor nas despesas públicas, de modo que não se permita a banalização de aberração como essa de se jogar fora tanto dinheiro, por causa nada justificável, porque ele poderia ser aplicado em benefício da sociedade, que, muitas vezes, deixa de ser atendida nas suas necessidades pelo Estado, exatamente por falta de recursos, que, em muitas vezes, são jogados no ralo da incompetência e da irresponsabilidade.

Brasília, em 25 de fevereiro de 2022

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