terça-feira, 21 de agosto de 2012

Legitimidade do voto consciente

Com a finalidade de orientar os fiéis a votarem nas próximas eleições municipais, um padre da cidade de Cajazeiras, interior do Estado da Paraíba, disse que a igreja não está a favor de políticas partidárias, mas sim de políticas públicas, que o voto deve ser livre e que é muito importante o eleitor conhecer a história e as propostas do candidato. Na sua visão, o mais importante é que o eleitor vote em alguém que tenha personalidade semelhante à sua, porque a escolha do representante deve combinar com a parecença de quem seleciona. Na concepção “moderna” do pároco, o candidato escolhido deve ser, pasmem, aquele que seja capaz de adotar as mesmas medidas que o eleitor tomaria caso o cargo público fosse por ele ocupado, nestes termos: “Está muito claro. Se você é ladrão vota no ladrão, se você é assassino vote no assassino, mas se você é honesto vote em uma pessoa honesta”, por entender que isso melhor satisfaz, de forma tranquila, a consciência do eleitor. É bastante lamentável que autoridade eclesiástica, em princípio, possuidora de elevada bagagem de conhecimentos bíblicos, filosóficos e humanitários, tenha visão tão destorcida e retrógrada da realidade que se pretende para melhorar e aperfeiçoar o sistema da livre escolha da representatividade política. O nobre padre perdeu excelente oportunidade de esclarecer à comunidade, de forma didática e pedagógica, sobre a necessidade de escolher pessoas para representá-la tão somente tendo por fundamento perfil de competência, honestidade, disposição para trabalhar para o bem-comum, experiência com problemas sociais e outros atributos que contribuam para a melhoria das condições de vida da população envolvida. Não há a menor dúvida de que essas ideias do padre, de que o criminoso deve votar em delinquente e que o incompetente em incapacitado, sob o argumento de semelhança de personalidade, não condizem em absoluto com os princípios sadios de sociabilidade e muito menos com os ensinamentos religiosos e cristãos, que primam pela valorização do ser humano nos seus procedimentos, que não podem desviar da ética e da moralidade, inclusive por ocasião da escolha de pessoas para cuidar dos interesses sociais. Caso a intenção do sacerdote seria contribuir realmente para orientar os menos esclarecidos sobre o voto seguro, ele teria a obrigação de expor questão tão importante com a humildade daqueles que precisam de informação clara e esclarecedora e jamais centrar a sua ideia em questão polêmica de que, por exemplo, ladrão vota em ladrão, quando se sabe que há comunidades onde não existem ladrões, nem assassinos e vice-versa candidatos ladrões nem assassinos. São reprováveis, por todos os meios, as ideias absurdas em referência, por contribuírem para confundir ainda mais os eleitores carentes de orientações precisas e seguras. À vista da orientação em comento, fica claro que a pessoa versada, com sapiência, sobre assuntos religiosos deveria cuidar somente das suas vocações eclesiásticas e sacerdotais, deixando que as questões políticas fiquem sob a exclusiva incumbência dos especialistas da matéria, como forma de contribuir legitimamente para o beneficio da democracia.

ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 21 de agosto de 2012

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