Em
resposta aos protestos da sociedade sobre a precariedade da saúde pública, o
governo resolveu ampliar, de forma simplista e precipitada, a duração dos
cursos de medicina de seis para oito anos de estudos e de prática. Causa
perplexidade a extrema incoerência da truculenta medida, por prolongar a
disponibilização de médicos, quando o caso emergência da carência de mão de
obra especializada na área médica exige a formação de médicos com a menor
brevidade possível, sem que isso não prejudique a qualidade do aprendizado. É
muito estranho que os “luminares” da República tenham baseado suas “brilhantes”
ideias nos cursos similares de países do primeiro mundo, como, por exemplo, os Estados
Unidos da América, onde não existem graves problemas no atendimento da saúde pública
como no Brasil, que ainda nem engatinha, em relação àquele país. A proposta
brasileira é tão absurda que somente dois países do mundo adotam o curso de
medicina com duração de oito anos, que são os Estados Unidos e a África do Sul.
No resto do mundo, os cursos de medicina têm duração não menos de seis anos e,
em alguns, são obrigatórios a formação curricular e alguma espécie de prática e
contato com pacientes, mediante orientação da faculdade. O paradigma invocado
somente faria sentido se o Brasil estivesse no mesmo nível da saúde pública dos
países evoluídos tomados por base, o que não é o caso. Afora isso, constitui
precipitação e falta de aptidão para a justificativa da adoção de medida
equivocada e absurda, por não se coadunar com a realidade brasileira e ainda
ter por base situações totalmente distintas e fora do contexto da saúde pública
nacional, tornando infrutífero e inepto o esforço em busca do saneamento de
grave situação médica. Trata-se de visível leviandade e incongruência por parte
do governo, que, de súbito, sem estudos apropriados sobre as questões
envolvidas e desrespeitadas as peculiaridades dos países acerca das condições e
dos fatores que afetam a situação da saúde pública, nas suas origem e extensão,
resolvem modificar a duração de importante curso, sem a mínima certeza se essa providência
redundará em alguma contribuição à eficiência ao nível da já alcançada nos
países desenvolvidos. Além do mais, o governo sequer acenou sobre a necessidade
de revolucionar e reformar a estrutura e o funcionamento do monstrengo Sistema
Único de Saúde - SUS, incumbido da execução do programa da saúde pública no
país, que já deveria ter sido reformulado, com a implantação de gestão de
verdade e de controle eficiente quanto à efetividade e economicidade dos
recursos públicos por ele gerenciados, tendo por objetivo a premente
priorização de maciços investimentos nas regiões desassistidas e abandonadas. É
utopia se pretender tomar por base algo que já está consolidado no mundo afora,
sem a implantação das estruturas de sustentação das premissas necessárias ao
funcionamento eficiente e adequado à realidade da região carente do país, para
que seja possível a efetivação da assistência médica compatível com as
verdadeiras intenções de melhoria da saúde pública. É evidente demonstração de
cruento desespero e de falta de alternativa competente a decisão de tomar como
parâmetro os cursos de medicina de países avançados nessa especialidade, a
exemplo dos Estados Unidos, Inglaterra, Suécia etc., onde o sistema de saúde
pública é modelo de referência e de vanguarda no atendimento à população e as
pessoas são tratadas antes mesmo de adoecer ou até só em imaginar que podem
ficar doente. É evidente que não é tão fácil assim, mas, nesses países, a saúde
pública já funciona ano-luz em eficiência comparado ao ineficiente SUS, tornando
bastante infeliz a iniciativa de apontá-los como modelo para acrescentar dois
anos ao já extenso curso de medicina. A adoção de cotas médicas nas universidades pode ser
medida racional e plenamente factível, que teria por objetivo, se não resolver
paulatinamente a questão de falta de médico no interior do país, pelo menos, a
implantação de algo que possa minorar o caos e evitar a conturbada e polêmica
importação de médicos e do absurdo aumento da carga curricular de medicina.
Esta última medida demonstra a monstruosidade da incompetência do governo, ante
a falta de critério técnico e de plausibilidade. As cotas médicas, nos moldes
das cotas raciais e sociais vigentes, destinam-se com exclusividade ao cidadão que,
espontaneamente, quiser estudar medicina e depois de formado ir para as regiões
carentes e ficar lá pelo tempo da conveniência dos serviços médicos. As cotas
médicas implicam a criação de vagas nos cursos de medicina, com o acréscimo,
por exemplo, de 50% sobre as já existentes, ficando obrigados investimentos substanciais
nas universidades e nas regiões para as quais os novos médicos serão
designados, com vistas à estruturação básica das condições de trabalho. A
sociedade exige que a administração pública evite a aprovação de medidas
mirabolantes para tratar das questões pertinentes à saúde pública e as trate
com extrema competência e responsabilidade, principalmente com a implantação de
gestão eficiente e eficaz da execução dos recursos destinados ao Sistema Único
de Saúde, que tem sido objeto de sérios questionamentos quanto ao seu
deficiente funcionamento e aos precários resultados apresentados. Acorda,
Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 15 de julho de 2013
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