terça-feira, 16 de julho de 2013

O paradigma absurdo e equivocado

Em resposta aos protestos da sociedade sobre a precariedade da saúde pública, o governo resolveu ampliar, de forma simplista e precipitada, a duração dos cursos de medicina de seis para oito anos de estudos e de prática. Causa perplexidade a extrema incoerência da truculenta medida, por prolongar a disponibilização de médicos, quando o caso emergência da carência de mão de obra especializada na área médica exige a formação de médicos com a menor brevidade possível, sem que isso não prejudique a qualidade do aprendizado. É muito estranho que os “luminares” da República tenham baseado suas “brilhantes” ideias nos cursos similares de países do primeiro mundo, como, por exemplo, os Estados Unidos da América, onde não existem graves problemas no atendimento da saúde pública como no Brasil, que ainda nem engatinha, em relação àquele país. A proposta brasileira é tão absurda que somente dois países do mundo adotam o curso de medicina com duração de oito anos, que são os Estados Unidos e a África do Sul. No resto do mundo, os cursos de medicina têm duração não menos de seis anos e, em alguns, são obrigatórios a formação curricular e alguma espécie de prática e contato com pacientes, mediante orientação da faculdade. O paradigma invocado somente faria sentido se o Brasil estivesse no mesmo nível da saúde pública dos países evoluídos tomados por base, o que não é o caso. Afora isso, constitui precipitação e falta de aptidão para a justificativa da adoção de medida equivocada e absurda, por não se coadunar com a realidade brasileira e ainda ter por base situações totalmente distintas e fora do contexto da saúde pública nacional, tornando infrutífero e inepto o esforço em busca do saneamento de grave situação médica. Trata-se de visível leviandade e incongruência por parte do governo, que, de súbito, sem estudos apropriados sobre as questões envolvidas e desrespeitadas as peculiaridades dos países acerca das condições e dos fatores que afetam a situação da saúde pública, nas suas origem e extensão, resolvem modificar a duração de importante curso, sem a mínima certeza se essa providência redundará em alguma contribuição à eficiência ao nível da já alcançada nos países desenvolvidos. Além do mais, o governo sequer acenou sobre a necessidade de revolucionar e reformar a estrutura e o funcionamento do monstrengo Sistema Único de Saúde - SUS, incumbido da execução do programa da saúde pública no país, que já deveria ter sido reformulado, com a implantação de gestão de verdade e de controle eficiente quanto à efetividade e economicidade dos recursos públicos por ele gerenciados, tendo por objetivo a premente priorização de maciços investimentos nas regiões desassistidas e abandonadas. É utopia se pretender tomar por base algo que já está consolidado no mundo afora, sem a implantação das estruturas de sustentação das premissas necessárias ao funcionamento eficiente e adequado à realidade da região carente do país, para que seja possível a efetivação da assistência médica compatível com as verdadeiras intenções de melhoria da saúde pública. É evidente demonstração de cruento desespero e de falta de alternativa competente a decisão de tomar como parâmetro os cursos de medicina de países avançados nessa especialidade, a exemplo dos Estados Unidos, Inglaterra, Suécia etc., onde o sistema de saúde pública é modelo de referência e de vanguarda no atendimento à população e as pessoas são tratadas antes mesmo de adoecer ou até só em imaginar que podem ficar doente. É evidente que não é tão fácil assim, mas, nesses países, a saúde pública já funciona ano-luz em eficiência comparado ao ineficiente SUS, tornando bastante infeliz a iniciativa de apontá-los como modelo para acrescentar dois anos ao já extenso curso de medicina. A adoção de cotas médicas nas universidades pode ser medida racional e plenamente factível, que teria por objetivo, se não resolver paulatinamente a questão de falta de médico no interior do país, pelo menos, a implantação de algo que possa minorar o caos e evitar a conturbada e polêmica importação de médicos e do absurdo aumento da carga curricular de medicina. Esta última medida demonstra a monstruosidade da incompetência do governo, ante a falta de critério técnico e de plausibilidade. As cotas médicas, nos moldes das cotas raciais e sociais vigentes, destinam-se com exclusividade ao cidadão que, espontaneamente, quiser estudar medicina e depois de formado ir para as regiões carentes e ficar lá pelo tempo da conveniência dos serviços médicos. As cotas médicas implicam a criação de vagas nos cursos de medicina, com o acréscimo, por exemplo, de 50% sobre as já existentes, ficando obrigados investimentos substanciais nas universidades e nas regiões para as quais os novos médicos serão designados, com vistas à estruturação básica das condições de trabalho. A sociedade exige que a administração pública evite a aprovação de medidas mirabolantes para tratar das questões pertinentes à saúde pública e as trate com extrema competência e responsabilidade, principalmente com a implantação de gestão eficiente e eficaz da execução dos recursos destinados ao Sistema Único de Saúde, que tem sido objeto de sérios questionamentos quanto ao seu deficiente funcionamento e aos precários resultados apresentados. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 15 de julho de 2013

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