segunda-feira, 26 de maio de 2014

E a proteção da sociedade?

Conforme notícia veiculada pela mídia, a Band desistiu da contratação da jornalista do SBT que se manifestou, no ar, sobre o caso do adolescente que foi torturado e amarrado a um poste pelo pescoço no Rio de Janeiro, após cometer um delito. À época, esse fato chegou a causar enorme polêmica, diante das interpretações de que seus comentários na bancada do jornalístico da emissora equivaleriam à incitação à justiça com as próprias mãos. Segundo a repórter, ”em um país que sofre de violência endêmica, a atitude dos vingadores é até compreensível”. A questão veio à lume em razão do linchamento até a morte de uma mulher, acusada injustamente, em virtude de ter sido confundida com suposta sequestradora de crianças. A propósito disso, um jornalista da Band teve a indelicadeza de afirmar que “Esse crime aí, minha gente, tem tanta responsabilidade o autor do boato espalhado pela internet, quanto pessoas que, mesmo em emissoras de televisão, estimulam a cultura da justiça com as próprias mãos. Isso está dentro do mesmo panorama que propicia, estimula, que justifica linchamentos como que nós andamos vendo recentemente em várias cidades do país. É hora dessas pessoas, agora, virem a público e dizerem como se sentem depois da consumação de sua própria teoria, na prática”. Não há dúvida de que as interpretações da jornalista não ultrapassaram os limites do bom senso e da razoabilidade, porquanto ela não teria se manifestado favorável à agressividade, mas sim que é plenamente compreensível que, numa sociedade onde os bandidos são presos apenas proforma, quando são, e logo em seguida soltos, é mais do que natural que a população se revolte, se indigne, passando a agir por contra própria, como forma desatinada de tentativa de fazer justiça com as próprias mãos. Não houve explícito apoio a essa ideia absurda, porque declarar ser compreensível que determinado fato ocorra não significa, em absoluto, indução ou apologia à realização de algo. Somente ao desarrazoado é justificável entender diferentemente disso, com interpretação elástica que não encontra guarida na lógica nem no bom senso, que não tem sentido combater a violência com mais violência, quando se sabe que compete à Justiça o papel de realizar a justiça dos homens. É evidente que não se soluciona a grave crise da segurança pública com a imposição de mordaças na imprensa e muito menos nos jornalistas e repórteres, porque isso contradiz o salutar princípio da imprensa livre e independente, onde deve funcionar num país que diz que valoriza a liberdade de expressão, que se encerra na contextualização e na consagração dos princípios democráticos, que são os pilares da civilidade e humanização. O povo tem necessidade de encontrar alguém que tenha coragem e sabedoria para se expressar em seu nome, principalmente apartidário, para mostrar as partes podres da administração do país, que se mostram perniciosas às aspirações de serviços públicos de qualidade, em consonância com as nações desenvolvidas, onde são priorizadas também as políticas públicas de salvaguarda e proteção da sociedade. O que a jornalista paraibana falou traduz o autêntico pensamento das pessoas lúcidas que gostariam se expressar, justamente à vista da caótica situação em que se encontra a segurança pública do país, que, de forma generalizada, passa por terrível crise de incapacidade para combater, com efetividade a vertiginosa onda de criminalidade, que praticamente se banalizou às claras e de forma escancarada, mas as autoridades incumbidas de zelar e proteger a sociedade preferiram recriminar a manifestação da sociedade, nas palavras da brava, lúcida e inteligente repórter, quando o correto seria correr em busca do cerne da questão, para saná-la com as medidas da sua alçada, tendo em conta o seu dever constitucional de proteger a sociedade. À proporção que cresce a censura às opiniões e às críticas construtivas, o país segue a passos largos no caminho do retrocesso, do preconceito, da corrupção, da incompetência, da criminalidade e do comodismo político, em completa harmonia com as retrógradas republiquetas, cujo povo nada anseia em termos de desenvolvimento. É pena que o povo brasileiro não tenha a conscientização sócio-política da jornalista paraibana, que teve sabedoria para exprimir o sentimento da enorme maioria dos brasileiros, que não suportam mais a omissão das autoridades incumbidas de cuidar da segurança pública, que foi totalmente sucumbida impunemente pela criminalidade predominante e cruel. A opinião da jornalista, por ter sido tão realista, diante da notória esculhambação da segurança pública, não fez nem faz apologia senão à convocação dos governantes para terem a dignidade de priorizar políticas públicas capazes de combater a criminalidade e a violência. A repórter fez alerta às autoridades públicas sobre o verdadeiro caos existente em potencial na segurança pública, em razão do qual a sociedade, sentindo-se acuada, desprotegida e desprezada pelo Estado, não vendo alternativa senão tentar reagir, antes de ser tragada pelo sistema maléfico, em legítima defesa, fazendo as vezes daqueles que deveriam fazê-lo em cumprimento da sua missão institucional, em contrapartida dos elevados impostos arrecadados dos cidadãos. É evidente que um erro não justifica o outro, mas também não é justo nem admissível que a sociedade seja encurralada nos próprios lares e não tenha o direito de se defender, repita-se, em legítima defesa. Os fatos precisam ser analisados sem paixão ou revanchismo, sem estrelismo, mas sob a ótima da sua realidade, de modo que as providências para o saneamento da questão sejam cobradas das autoridades incumbidas de cuidar e zelar pela manutenção da ordem pública e da segurança da sociedade, como forma positiva para a contribuição ao desenvolvimento do país, notadamente no que diz respeito ao efetivo combate à criminalidade e à violência. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 26 de maio de 2014

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