domingo, 4 de maio de 2014

Julgamento político, sério?

O ex-presidente da República petista concedeu entrevista à TV portuguesa, manifestando sua opinião sobre vários assuntos, mas a que continua causando enorme repercussão e ecoou com intensidade nos meios político e jurídico, por ressuscitar o julgamento do escândalo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal - STF, se refere ao que ele concluiu que "O mensalão... teve praticamente 80% de decisão política e 20% de decisão jurídica. O que eu acho é que não houve mensalão. Eu também não vou ficar discutindo a decisão da Suprema Corte. Eu só acho que essa história vai ser recontada. É apenas uma questão de tempo, e essa história vai ser recontada para saber o que aconteceu na verdade. O processo foi um massacre que visava destruir o PT, e não conseguiram”. Ele negou, de forma enfática, a existência do esquema, que segundo o STF, consistiu na compra de apoio político no Congresso Nacional, no início de governo petista, entre os anos de 2003 e 2005. Ele declarou que, apesar de haver "companheiros do PT presos", "não se trata de gente da minha confiança". Essa afirmação soa com muito perplexidade, porque, entre os petistas presos, estão o ex-ministro da Casa Civil da Presidência da República, o ex-presidente do PT e o ex-presidente da Câmara dos Deputados, importantes integrantes dos quadros históricos do partido fundado pelo ex-presidente. O petista também foi muito enfático ao rebater as críticas sobre o custo da Copa do Mundo e à deficiência do país em infraestrutura, educação e saúde, que motivaram as manifestações de junho de 2013.  Ele disse que "Nós não vamos conseguir em 11 e nem 15 anos resolver as mazelas e as responsabilidades de cinco séculos. O dado concreto é que nós conseguimos evoluir de maneira extraordinária. É ótimo o povo querer mais, porque quanto mais as pessoas reivindicam, mais nós temos que fazer". Para quem declarou, no auge das denúncias de irregularidades no seu governo, que nada viu nem nada sabia, não deixa de ser manifesta incoerência do ex-mandatário do país, ao vir agora a público para declarar que o julgamento do imoral esquema do mensalão foi predominantemente político, quando os atos e fatos investigados por especialistas e autoridades em corrupção terem atestado as maldosas malversações de recursos públicos. As irracionais declarações do petista foram contestadas com veemência pelo presidente da Excelsa Corte de Justiça, que declarou sua indignação pela descortesia e indelicadeza para com a Justiça brasileira. As declarações do petista mostra o nível de cultura política dos brasileiros, que ainda não se conscientizaram sobre a sua enorme responsabilidade de eleger cidadão que não seja verdadeiro estadista, possuidor de sensibilidade e responsabilidade político-administrativas, cultural e democrática, com capacidade mínima para respeitar os atos e as decisões dos poderes da República, o que seria feito em demonstração de grandeza e de dignidade que são esperadas dos homens públicos. Ao contrário do que ele imagina, as declarações do ex-presidente têm o condão de mostrar que a conduta dos homens públicos precisa passar por urgente aperfeiçoamento e modernização, para que haja dignidade e respeito nas relações entre os poderes constituídos. As afirmações do petista, que inclusive chegou a ser reeleito pelo sufrágio universal, estão totalmente fora do contexto da modernidade política e democrática, porque o seu conteúdo afronta o respeitável veredicto da Suprema Corte de Justiça, porém elas se harmonizam com o nivelamento da sociedade, que elegeu e reelegeu seu autor, apesar ser possuidor da diminuta capacidade de tentar denegrir e desrespeitar a dignidade daquela Corte. Por seu turno, a realização da Copa do Mundo no Brasil é a síntese da incompetência dos administradores públicos tupiniquins, que demonstraram ao mundo a absoluta falta de priorização das ações de governo, quanto à aplicação de recursos públicos, ao disponibilizarem montanhas de dinheiros em obras faraônicas, muitas das quais não terão qualquer utilidade pública depois da copa e ainda continuarão sugando verbas públicas com a sua altíssima manutenção. O governo poderia demonstrar competência ao chamar a atenção do mundo com a realização de obras simples, como hospitais, escolas, creches, ginásios desportivos, estradas, nos moldes feitos com o Bolsa Família, que tem sido o programa alardeado aos quatro cantos do mundo pelos petistas, em que pesem os graves percalços de organização e de controle. O Brasil precisa de homens públicos que tenham a capacidade de analisar os fatos com decência e com senso de responsabilidade cívica, sem qualquer paixão partidária, política ou ideológica, por não condizer com os princípios democráticos e da dignidade entre seus semelhantes. Não fica bem para o político menosprezar a inteligência e a capacidade jurídica dos dignos e ilustrados ministros do STF, que, na sua absoluta maioria, tiveram atuação exemplar, pontuando com o máximo de dignidade no julgamento do processo do mensalão, cujas irregularidades foram julgadas com fundamento em elementos substanciais e irrefutáveis, levantados de forma insuspeita por CPIs, Polícia Federal, Ministério Público e outros órgãos confiáveis, não restando dúvida senão por quem ajudou a desmoralizar o país. Por ter declarado que nada viu nem tomou conhecimento de coisa alguma, embora a operação dos fatos irregulares tivessem ocorridos na proximidade do seu gabinete de trabalho, falece capacidade ao petista para julgar os ministros do Supremo Tribunal Federal, que condenaram os amigos dele exatamente com base nas provas materiais, testemunhais, periciais e nos demais elementos legalmente válidos carreados aos autos, tendo sentenciado que o mensalão foi o maior escândalo da história republicana. Caso o famigerado mensalão tivesse ocorrido num país sério, civilizado e evoluído, não há dúvida de que não somente os envolvidos ficariam excluídos do convívio da sociedade o resto da vida, como o partido a que eles são filiados seria extinto, por execração pública, diante da afronta e do ferimento aos preceitos ético, moral, legal e, em especial, da honestidade. Urge que a sociedade se conscientize sobre a necessidade de os administradores públicos serem escolhidos sob o rigoroso critério da capacidade gerencial, política e administrativa, sobretudo quanto à observância dos salutares princípios ético, moral e do respeito às instituições da República. Acorda Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 03 de maio de 2014

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