domingo, 5 de julho de 2015

Afirmações juridicamente inconsistentes

Os depoimentos prestados aos procuradores da Operação Lava-Jato pelo empresário da empreiteira UTC ampliaram as pressões sobre a presidente da República e o seu partido, o PT, à vista da revelação de novas acusações acerca da suspeita maneira como as campanhas petistas foram financiadas, ao longo da sua história política.
Com fundamento na delação premiada firmada com a Procuradoria Geral da República, o dono da UTC declarou que fez doação do valor de R$ 7,5 milhões à campanha à reeleição da petista, por temer prejuízos em seus negócios na Petrobras, se não houvesse ajuda o PT.
A revista Veja afirmou que o empresário teria revelado em seus depoimentos a efetivação dos repasses de R$ 15 milhões ao ex-tesoureiro do PT e R$ 750 mil a um ex-deputado federal do PT-SP, que foi tesoureiro da campanha da petista em 2010.
Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, o empresário declarou que os repasses indicados acima teriam sido feitos de maneira ilegal, e não por meio de doações oficiais, mas, como de praxe, em nota, o PT afirmou que "todas as doações recebidas pelo partido aconteceram estritamente dentro da legislação vigente e foram posteriormente declaradas à Justiça".
Os depoimentos em tela contribuem para potencializar a já complicada situação dos atordoados e perdidos inquilinos do Palácio mais importante do país, exatamente porque, embora os envolvidos neguem peremptoriamente, o depoente assegura com total convicção que os repasses para o ex-tesoureiro e um ex-deputado, ambos do PT, foram sob a mácula inaceitável da ilegalidade, e não por meio de doações oficiais.
Não há a menor dúvida de que nenhum ricaço abestado e insensível seria capaz de doar, apenas de forma generosa e graciosa, tanto dinheiro se ele não tivesse origem suja ou então se a operação não envolvesse interesses escusos e comprometedores, como deixou claro o próprio delator em causa, de que o financiamento irregular teria o condão de se evitar prejuízos à sua empresa, com relação à perda dos contratos celebrados com a Petrobras.
É indiscutível que, somente pelo fato de haver doação processada em consonância com o rito segundo as normas pertinentes possa ela ser considerada legal, haja vista que importa, nesse caso, é, sobretudo, a comprovação da licitude da origem dos recursos.
A origem do dinheiro é que legitima a doação, mesmo que ela seja chancelada pela Justiça Eleitoral, que não tem competência para transformar dinheiro sujo de desvio dos cofres públicos, por meio de fraude, em moeda legítima, salvo nas republiquetas, onde não se respeita os princípios jurídicos.
Ao contrário, em harmonia com o mandamento jurídico, é do dever da Justiça Eleitoral promover, imediatamente às denúncias de irregularidade dos financiamentos, a revisão de seus julgados, com relação aos fatos inquinados de irregulares, com a suspensão de seus julgados, até que a Justiça Federal se pronuncie em definitivo sobre a regularidade das doações suspeitas de máculas às normas constitucionais e legais, de modo que não reste qualquer dúvida quanto à sua atuação, de se ignorar a extrema gravidade dos fatos denunciados pelos delatores, que, em princípio, merecem credibilidade enquanto não forem declarados, pela Justiça, em contrário, ou seja, pela sua improcedência.
Já se tornaram ridículas, por que inadmissíveis juridicamente, as reiteradas afirmações de políticos e partidos de que as doações recebidas estão respaldadas pela legalidade, pelo simples fato de haver os devidos registro e homologação da Justiça Eleitoral, embora as investigações revelem que se trata de doação de dinheiro sujo, enlameado com a podridão da corrupção.
É absolutamente inaceitável a aludida conclusão, por ela ser inconsistente, simplória e destituída de seriedade e legitimidade, porque, à toda evidência, não se pode afirmar que recurso objeto de fraude possa ser registrado por partido honesto como dinheiro limpo, em que pese o doador afirmar que se trata de dinheiro obtido de maneira ilegítima, não ficando bem para a imagem do órgão da Justiça Eleitoral incumbido da homologação das doações para financiamentos de campanhas.
Nesse caso das doações de campanha, parece indiscutível que o Brasil deva ser o único país do mundo que desconhece o verbete "seriedade", que é também sinônimo de honestidade, dignidade, nobreza.
Nos países com o mínimo de dignidade, as doações de dinheiro com origem fraudulenta são motivo mais do que suficiente para macular completa e terminantemente a operação e implicada a responsabilização dos envolvidos, como forma de reparação dos danos causados aos cofres públicos e principalmente de lição pedagógica para servir de prevenção e se evitar casos futuros semelhantes, mas, no país tupiniquim, nada acontece, porque as irregularidades simplesmente se banalizam.
O certo é que, na forma da legislação pátria, o receptor de objeto oriundo de crime normalmente é enquadrado no Código Penal, como partícipe da infração legal. No caso, sendo o dinheiro doado ao PT fruto de fraude em contratos firmados com a Petrobras, ou seja, dinheiro sujo, por ter origem ilegal, como então transformar o objeto de falcatrua em algo legítimo?
À toda evidência, essa fórmula mágica somente é concebida por milagres operados pelos partidos políticos, inclusive com a utilização do caixa 2, que também é considerado legítimo pelo PT, conforme amplamente defendido no escândalo do mensalão.
É pena que não se possa generalizar, mas há forte evidência, à vista dos fatos revelados no dia a dia pela imprensa, de que a falta de seriedade como a política é praticada no país é motivo bastante suficiente para que os homens de dignidade e de se recusam a fazer parte desse clube seleto denominado classe dominante do país, que participam de falcatruas e, pasmem, as classificam de mera operação legal.
Não fica nada difícil se entender como funciona o sistema de interesses neste país que prevalece o jeitinho para se ganhar espaço, seja político ou empresarial, quando os princípios essenciais da seriedade e da honestidade nem sempre servem de parâmetro quando estão em jogo os interesses empresariais e políticos, à vista das revelações daqueles que dominam as megas contratações com o Estado, que é o primeiro a se prostituir por meio dos agentes públicos sem caráter, que ignoram e desprezam o primado fundamento da política e da administração pública, que é o interesse público. Acorda, Brasil!
 
          ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 05 de julho de 2015

Um comentário:

  1. Verdade ADALMIR!
    Estamos acompanhando, estarrecidos, os desdobramentos desses fatos que realmente evidenciam total descompromisso com a ética e a moral. Necessitamos, urgentemente, de leis que coíbam essa prática danosa, que envolve doações vultosas em troca de favores daqueles que estão no poder. Esse ato é criminoso e envergonha o nosso país.
    Um forte abraço e parabéns por mais esse texto importante para a nossa reflexão e amadurecimento cívico e político.

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