quinta-feira, 16 de julho de 2015

A indignidade nas campanhas eleitorais

Ex-diretor do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea declarou à Justiça Eleitoral que foi impedido de divulgar, durante a campanha de 2014, dados da Pnad - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, referente ao ano de 2013, que mostravam aumento da extrema pobreza no país, sob a presunção que isso poderia prejudicar a campanha da petista.
O depoimento integra a ação movida pelo PSDB contra a presidente da República e seu vice junto ao Tribunal Superior Eleitoral, tendo por objeto pedido de cassação da chapa encabeçada pela petista, sob a alegação de abuso de poder econômico e político, ante a ocultação de dados oficiais indiscutivelmente desfavoráveis à candidata situacionista.
No depoimento, o ex-diretor disse que os dados mostravam que a ''pobreza tinha aumentado de 3, alguma coisa para 4, alguma coisa''.
O ex-diretor disse que entrou em contato com o então presidente do Ipea e lhe disse: "Olha, esse aumento é marginal, e a gente tem que falar isso para a população''. Segundo ele, a divulgação da Pnad era praxe, mas "Aí eu recebi a notícia de que eu não podia falar com a imprensa por causa da lei eleitoral.”.
Ele disse ter recebido e-mail de um diretor com os dizeres: "É, Herton, acho que nesse período de eleição o que é terra vira mar e o que é mar vira terra. Eu estou com um monte de produto aqui que eu estou querendo divulgar e foi pedido para a gente divulgar só depois das eleições.".
O ex-diretor do Ipea foi interrogado se o assunto foi levado a outras esferas do Poder Executivo, como ministros. Ele disse que, quando entregou sua carta de demissão, o então ministro o procurou para tentar reverter a sua decisão.
O ex-diretor disse que "(Neri) Sabia que tinha aumentado (...), aí quando o dado foi ruim, ele recuou. Na minha opinião. Como estava aquele contra-ataque na política, a política influenciou muito. Acho que as pessoas ficaram com medo''.
O ex-presidente do Ipea informou que a decisão de não divulgar o estudo em tela foi tomada pela diretoria colegiada, seguindo orientação da Controladoria Geral da União.
Por discordar da inusitada proibição de divulgar os dados em causa, o ex-diretor de Estudos e Políticas Sociais pediu exoneração do cargo.
À toda evidência, há nesse procedimento explícito ato de desonestidade, deslealde e indignidade, em razão de ficar demonstrada a forma espúria de manipulação de dados oficiais, quando eles eram potencialmente desfavoráveis à candidata oficial, que até então se considerava a suprassumo da gestão pública.
É evidente que, ao contrário disso, não haveria nenhuma proibição caso os dados fossem positivos, porque eles serviriam para beneficiar a candidata à reeleição, fato que representa indiscutível manipulação imoral e antiética, em contrariedade ao princípio da dignidade que deve ser rigorosamente observado não somente nas campanhas eleitorais, imunes de impurezas, vícios e falcatruas, que, infelizmente, ainda não têm sido possíveis na medíocre politicagem tupiniquim.
Não à atoa que o país se encontra, no momento, assoberbado de crises e de dificuldades de magnitudes espantosas e praticamente sem a menor possibilidade de recuperação, em curto prazo, das atrocidades cometidas fundamentalmente contra as estruturas administrativas, políticas, morais e legais que alicerçam o Estado brasileiro, em cristalino prejuízo aos interesses da sociedade.
Há fortes evidências, à luz de elementos incontestáveis, que a última eleição presidencial foi marcada pelos piores fatos maléficos à dignidade política, com o espúrio emprego, pelo uso da máquina pública, de artifícios especialmente direcionados para beneficiar algum candidato e prejudicar outros, em nítida demonstração de jogo sujo e condenável, ante a sabotagem dos bons conceitos da moralidade e da ética.
Esse caso específico do Ipea é o exemplo clássico de como é possível se deixar de adotar medida administrativa, com a finalidade de beneficiar alguém por deliberada conveniência, o que não é justo que esse artifício fique impune, ante o claro ferimento do regramento jurídico do país, cabendo à Justiça Eleitoral promover as devidas apurações, com vistas às sanções cabíveis.
Causa enorme perplexidade que, na plena e acirrada disputa ao principal cargo da República e no curso do século XXI, ainda se constate o desavergonhado emprego de manipulação, proibição e outros malefícios com influência no resultado da eleição, em indevido benefício para uma das partes e injusto prejuízo para outrem, com infringência aos salutares princípios da dignidade, pureza e nobreza, a evidenciarem os escrachados empobrecimento e subdesenvolvimento da nação e de seu povo, que, lamentável e inexplicavelmente, já se acostumaram e se acomodaram com a crônica falta de princípios dos homens públicos.
Urge que os brasileiros se conscientizem sobre a importância de se protestar e repudiar, com veemência, as ilicitudes e indignidades protagonizadas na administração do país, com destaque para os métodos desonestos empregados nas campanhas eleitorais, em visíveis degradações dos princípios ético, moral e legal, que podem ser menosprezados nunca, independentemente dos interesses e das conveniências pessoais, partidárias ou políticas. Acorda, Brasil!
 
          ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 16 de julho de 2015

Nenhum comentário:

Postar um comentário