quinta-feira, 30 de março de 2017

Proceder com correção e lisura

Conforme mostram os fatos e indicadores, o legado do PT se traduz em verdadeira hecatombe ética, política, econômica e administrativa, mas nem por isso, como se não fosse um dos autênticos responsáveis pela ruína do país, à luz das investigações da Lava-Jato, o ex-presidente petista aparece empunhando a bandeira de “salvador da pátria”, a antecipar o lançamento de sua candidatura ao Palácio do Planalto, em 2018.
Na verdade, a real finalidade de seu espetaculoso movimento objetiva tão somente tentar intimidar a Justiça, com vistas a se evitar que ele sofra pesada condenação, em face dos cinco processos que já responde como réu.
Como explicar que um político que responde a vários processos na Justiça, com enorme possibilidade de ser enquadrado como réu em novas ações, ainda seja defendido entusiasticamente por simpatizantes enlouquecidos, ao fazerem arruaças, a criticarem a imprensa e gritarem palavras de apoio ao ex-presidente, que foi descrito pelo Ministério Público Federal como o “comandante máximo” do esquema de corrupção investigado pela Operação Lava-Jato?
Na gestão petista, houve inovação na forma de governo, com a introdução do sistema presidencialista de coalizão, tendo por base o estabelecimento de projeto estruturado na corrupção e no poder, onde se discutia a plena dominação das classes política e social e a perenidade no poder, não importando os fins empregados para o atingimento dos meios, a exemplo do mensalão e petrolão, em que a corrupção predominou e se consolidou como base da estrutura delituosa que sustentava os objetivos políticos.
Mas o petrolão foi a forma engenhosa arquitetada para dilapidar os cofres da Petrobras, que foi destronada da liderança de empresa estatal sólida depois que sofreu o golpe fatal com o desvio de recursos para a irrigação de campanhas eleitorais de inescrupulosos políticos, sob o artifício de crime quase perfeito, qual seja, a doação registrada oficialmente na Justiça Eleitoral.
Como se não bastassem os benefícios políticos, com a garantia da consolidação e perenidade no poder, a propina desviada da estatal serviu também para abarrotar os bolsos de políticos, executivos e de outros criminosos assemelhados, em medíocre festim que levaria ao enriquecimento deles, sem o menor esforço.
O esquema criminoso engendrado vicejou por mais de década, na forma do mensalão e petrolão, que vêm de longa data, tendo beneficiado principalmente o petista-mor nos seus projetos políticos, que mereceu incondicional apoio de congressistas, sendo lícito também se imputar a ele a principal responsabilidade pela debacle do sistema político, muito bem representada na lista do procurador-geral da República, recém-divulgada, que elenca em seu bojo corriola de beneficiários das propinas.
Embora o considerado pai da institucionalização da corrupção, dos malfeitos e da hecatombe ética, política e econômica, na conclusão do Ministério Público Federal, também indicado por ele como o comandante da “organização criminosa”, o político se apresenta como o único “salvador da pátria”, como se nada tivesse ocorrido de ilícito contra os interesses dos brasileiros, que teria ignorado e esquecido as maldades protagonizadas pelos governos petistas, em que o país ingressou em forte recessão e foi obrigado a administrar forte onda de desemprego, juros altos, falta de investimentos público e privado, além do descrédito do sistema produtivo, que não confiava na gestão do governo afastado.
O político dá a impressão de que as investigações da Lava-Jato não passam de brincadeirinhas para, na interpretação dele, apenas persegui-lo e macular a sua reputação política, por acreditar que os fatos denunciados não têm consistência capaz de incriminá-lo e muito menos de fundamentar a sua condenação, à vista da sua convicção de que, ao final, ele ressurgirá impávido das acusações da Lava-Jato.
Entrementes, ao que tudo indica, o político pretende manobrar no sentido de, mesmo sem comprovar nada em contrário, transformar as denúncias, em um passe de mágica, em simples miragens, como forma de, se possível, construir majestoso palácio sobre os escombros de um edifício (no caso, o Brasil) que foi implodido com a maligna engenhosidade atribuída a ele pela força-tarefa da Lava-Jato.
É visível a ardilosa e cuidadosa estratégia de antecipação da candidatura dele ao Palácio do Planalto, com a clara tentativa de pressionar a Justiça o quanto possível, para que ela seja constrangida a evitar condená-lo, para não politizar o que deveria ser examinado apenas nas esferas policial e judicial, tendo em vista que a condenação dele em primeira instância é tida inapelavelmente como certa.
Por seu turno, com a finalidade de não ser descartado do processo eleitoral, já existe discurso pronto, segundo o qual não há fatos que justifiquem a condenação dele e se isso acontecer será por mera perseguição política, com vistas a evitar que ele se candidate, conquanto a antecipação do lançamento do seu nome à Presidência da República visa evitar justamente sua condenação.
Quando o ex-presidente se sentou, pela primeira vez, no banco dos réus, foi colocada em prática a tática da intimidação contra autoridades judiciárias, por meio da exortação à militância da agremiação a processar aquele que acusar seu partido de ser uma organização criminosa, nos termos da qualificação feita pelo Ministério Público, conquanto isso seja forma de tentar ignorar os gravíssimos indícios de desvios de recursos de empresas estatais, que foram desfalcadas para suprir não somente os cofres de seu partido, mas também o bolso de políticos, executivos e outros aproveitadores do dinheiro público.
Ainda na ocasião, o político disse ao juiz que “Eu tô cansado de ver procurador dizer que não precisa de prova, que ele tem convicção. De juiz dizer que ‘não preciso de prova, eu tenho fé, vou votar com fé’. Eu quero provas, alguém tem que dizer qual é o crime que eu cometi, aonde que eu cometi. Chamar o PT de organização criminosa? Se dependesse de mim, cada deputado do PT, cada vereador do PT, cada militante abria um processo para quem disser qual é a quadrilha”, dando a entender que seu partido é o mais ético do planeta, quando os fatos indicam a necessidade da urgente reparação dos estragos causados à dignidade dos brasileiros.
O político, ao invés de contestar, com elementos plausíveis, o mérito das graves denúncias contra ele e seu partido, em harmonia com a grandeza da moralidade, preferiu recorreu ao teatro do absurdo, para interpretar o principal papel de vítima e de perseguido político, ao afirmar, ainda no banco dos réus, que “Há mais ou menos três anos, doutor, eu tenho sido vítima de quase que um massacre. Eu acho que todos aqui têm dimensão do que é um cidadão que foi presidente da República, que foi considerado o mais importante presidente da história desse país, que saiu com 87% de aprovação de bom e ótimo, que fez com que o Brasil fosse respeitado no mundo inteiro e virasse protagonista internacional, de repente é pego de surpresa por manchete de jornais, por notícias de televisão, todo dia, todo santo dia. No café da manhã, no almoço e na janta, alguém insinuando: ‘Tal empresário vai prestar uma delação e vai acusar o Lula. Tal deputado vai prestar uma delação e vai acusar o Lula. Agora vão prender fulano, agora vão pegar o Lula. Prenderam a Odebrecht, vai delatar o Lula. Prenderam a OAS, vai delatar o Lula. Prenderam Bumlai, vai delatar o Lula. Prenderam o Delcídio, vai delatar o Lula. Prenderam o papa, vai delatar o Lula”.
Embora existam muitas acusações e até denúncias contra o político, ele insiste em se passar por vítima de investigadores insensatos e usa, como tática de intimidação, o ingresso de ações na Justiça contra delegados, procuradores e juízes, cobrando reparação por danos morais, mediante indenização pecuniária.
Numa das ações, a Advocacia Geral da União foi bastante elucidativa, ao se expressar nestes termos: “Ao tentar fazer o réu responder a uma ação com pedido de indenização exorbitante, o autor visa interferir nas decisões e medidas adotadas no âmbito da Operação Lava Jato, criando um receio generalizado de que as ações legítimas contra o autor estarão sujeitas a fortes reações. O verdadeiro fim é intimidar e retaliar, e não compensar o dano moral dito abalado”.
Ou seja, o político se insurge contra os fatos, por achar que deve ser submetido a um regime especial, diferenciado dos demais brasileiros, que não pode ser investigado e que qualquer decisão do juiz da Lava-Jato contra ele representa descabida e abusiva, mesmo que as provas sejam contundentes.
Ao que tudo indica, na ausência de justificativas plausíveis contra as acusações referentes ao recebimento de benefícios e vantagens repassados por empreiteiras, em troca de favores, o político encontra a estratégia dos famosos ataques com palavras e ações judiciais para se defender, na tentativa de acuar e constranger autoridades que cuidam das investigações da Lava-Jato e de sobreviver ao mar de gravíssimas denúncias que o envolvem em atos de corrupção, ainda não infirmada.
Em que pesem os gigantescos esforços nesse sentido, os resultados mostram a inocuidade e a completa falta de êxito, porquanto os robustos e substanciosos indícios prevalecem sobre as meras falácias, de vez que os fatos falam por si sós, evidenciando as dificuldades para rebatê-los senão com a força da apresentação de provas legalmente válidas e cabais.
Urge que o político, ao invés de tentar intimidar e constranger as autoridades com ameaças próprias de quem tem intimidade com o poder e o tráfico de influência, se conscientize de que os fatos investigados pela Lava-Jato emergem com força tal que é preciso humildade para se reconhecer que ninguém está acima da lei, conforme princípio constitucional segundo o qual todos são iguais perante a lei, em direitos e obrigações, a se confirmar a sábia ponderação do juiz da Lava-Jato, que afirmou, certa vez, verbis: “Aqui, até o príncipe está sujeito à lei” e não poderia ser diferente, principalmente porque mesmo a maior autoridade tem obrigação de proceder com correção e lisura, além de prestar contas à sociedade sobre seus atos na vida pública.  
Como o Brasil tem pressa para ser passado a limpo e a revelação da verdade é forma essencial para se alcançar os objetivos da tão ansiada moralização, não resta alternativa melhor do que se contribuir para que os fatos denunciados sejam devidamente investigados e esclarecidos, não importando quem esteja incluído no rol dos envolvidos, mesmo que isso possa custar o altíssimo preço do prestígio político, porque o que se encontra em jogo é a sustentabilidade dos princípios da ética, moralidade, legalidade, dignidade e demais conceitos capazes de contribuir para a consolidação da democracia e da República. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 30 de março de 2017

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