domingo, 31 de março de 2019

A garantia da cidadania


Certamente aproveitando o aniversário da Revolução de 1964, o celebrado escritor brasileiro, autor de várias importantes obras literárias, entre as quais O Alquimista, escreveu artigo para o The Washington Post, que foi publicado na última sexta-feira,
O mencionado escritor descreveu, com detalhes a tortura que sofreu durante o regime militar, tendo narrado que sua casa foi invadida no dia 28 de maio de 1974 e ele foi levado ao Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), tendo sido fichado e fotografado.
Depois de liberado mais tarde, ele disse que teria pego um táxi, que “é fechado por outros dois carros, e ele é tirado de lá por homens armados. Apanha no caminho, depois na sala de tortura. Quando permitem que ele tire o capuz, se dá conta de que está numa sala a prova de som com marcas de tiro nas paredes.”.
Ele conta que a tortura segue em ritmo muito forte, da seguinte maneira, ipsis verbis: "Depois de não sei quanto tempo e quantas sessões (o tempo no inferno não se conta em horas), batem na porta e pedem para que coloque o capuz. (...) Sou levado para uma sala pequena, toda pintada de negro, com um ar-condicionado fortíssimo. Apagam a luz. Só escuridão, frio, e uma sirene que toca sem parar. Começo a enlouquecer, a ter visões de cavalos. Bato na porta da 'geladeira' (descobri mais tarde que esse era o nome), mas ninguém abre. Desmaio. Acordo e desmaio várias vezes, e em uma delas penso: melhor apanhar do que ficar aqui dentro.".
O escritor relata todos os detalhes sobre o que teria sofrido e conta ainda que anos mais tarde, quando os arquivos da ditadura foram abertos, ele teve a chance de saber quem o denunciou, mas não quis, tendo dito que isso "Não vai mudar o passado".
O escritor disse que teve a iniciativa de publicar a sua história quando o presidente brasileiro sugeriu que os quartéis celebrassem o dia 31 de março de 1964, data que marca o início do regime militar e também porque, quando ele ainda era deputado federal, disse, no Congresso Nacional, que um coronel do Exército, "um dos piores torturadores", nas palavras do escritor, era seu ídolo (do parlamentar).
Não deixa de ser traumática a narrativa referente à terrível tortura aplicada ao célebre escritor brasileiro, mas um fato não foi esclarecido à opinião pública, qual seja, o real motivo que deu ensejo ao "carinho" que ele teve na "geladeira" e noutros encontros com seus algozes.
Não que isso vá justificar ou minimizar o seu sofrimento, pelo tanto que ele possa ter sido martirizado durante as sessões de tortura, mas, pelo menos, poderia ajudar a esclarecer que as forças militares de repressão não ficavam, o tempo todo, invadindo lares de inocentes, pessoas que acataram o regime do momento, e praticando barbaridades e atrocidades, as mais cruéis possíveis.
Todas as pessoas que se dizem injustiçadas certamente tiveram participação, leve ou mais grave, em atos de repressão ao regime militar, porque, ao contrário, não se tem registro de fatos nesse sentido.
Até agora, nenhuma pessoa trabalhadora, respeitadora e acatadora das instituições vigentes reclamou de ter havido violação de seus direitos de cidadão e que tivesse sido agredida ou torturada indevida e injustamente, sendo obrigada a confessar algo para ser incriminado.
    Agora, muitos daqueles que se insurgiram voluntariamente contra o regime militar, normalmente por meio de agressão, foram obrigados a passar pelo constrangimento de se explicar, na extensão do seu envolvimento, cujos métodos aplicados estavam condizentes com os costumes, que certamente não contavam senão com a metodologia própria das investigações aplicadas para a obtenção de informações indispensáveis ao sistema utilizado à época, que, por óbvio, não seria com base na paz nem no amor.
No caso em tela, o famoso escritor faz marcante e penoso depoimento, com o circunstanciamento sobre fatos que podem ter sido reais, com o peso da minudência como ele os expõe, mas ele se apequena e perde muito em credibilidade justamente pela ausência do fato ensejador dessa conversa nada amigável.
Ou seja, a bem da verdade, ele poderia ter deixado claro o que realmente fez em contrariedade às regras vigentes na ocasião, porque somente acusar as torturas sofridas pode induzir ao possível erro de entendimento ou avaliação de que ele foi injustiçado, por ter sido martirizado de forma absolutamente graciosa e indevida.
Repita-se que não se tem conhecimento de alguém ter sido torturado sem ter praticado nadinha que não levantasse, nem que seja minimamente, qualquer suspeita quanto ao seu comportamento perante o regime militar.
A par de se reconhecer a gravidade dos maus-tratos, por serem absolutamente contrários ao saudável princípio humanitário, seria aconselhável, a bem da verdade e da justiça, que o nobre escritor brasileiro, de fama mundial, de futuro, seja mais fiel aos fatos e conte também, com a maior fidelidade possível, o ato que teria levantado a suspeita da sua participação contrária ao regime militar, a ponto de se permitir avaliação, pela opinião pública, se a martirizante tortura aplicada a ele teria sido realmente muito injusta ou somente decorreu de ato incompatível com o usufruto da normal cidadania, garantida aos brasileiros.
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 31 de março de 2019

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