segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

O que disse o papa?

 

Conforme notícia publicada na imprensa, o papa teria afirmado que o processo que culminou com a prisão do presidente eleito à Presidência da República brasileira começou devido a “notícias falsas” contra o político.

Em entrevista publicada ontem, por um jornal espanhol, o pontífice declarou que a disseminação de fake news pode “destruir a vida de uma pessoa” e que o julgamento do mencionado político “parece não ter sido adequado”.

O papa declarou que “Começou com notícias falsas na mídia, que criaram uma atmosfera que favoreceu a colocação de Lula em um julgamento. Um julgamento deve ser o mais limpo possível, com tribunais que não tenham outro interesse a não ser fazer justiça”.

O político protegido pelo papa foi preso em 2018, condenado no âmbito da Operação Lava-Jato, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, com relação ao caso do triplex de Guarujá, São Paulo.

No ano seguinte, ele foi condenado por outros crimes, também sob a alegação de corrupção passiva e lavagem e dinheiro, desta feita com o seu envolvimento no caso do sítio de Atibaia, São Paulo.

O político foi denunciado à Justiça pelo uso dos citados imóveis para receber propinas de empreiteiras contratadas pela Petrobras, na forma do recebimento gracioso do apartamento e de reformas e benfeitorias personalizadas em ambos os imóveis.

As investigações levadas a efeito pela Polícia Federal concluíram pela confirmação das aludidas denúncias, cujos resultados foram aceitos pelo Ministério Público Federal.

O julgamento dos referidos casos pela Justiça brasileira teve por base o conjunto das provas robustamente coligidas e juntadas nos respectivos autos, na forma de depoimentos de testemunhas, delações premiadas, demonstrativos contábeis e financeiros, e-mails, conversas telefônicas e demais provas juridicamente válidas para os casos, cujos procedimentos judiciais foram devidamente observado, conforme os processos legais pertinentes, sob os auspícios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, sem que o réu tenha conseguido provar a sua inocência com relação aos casos em causa.   

Impende se ressaltar que as citadas condenações foram mantidas em instâncias superiores, por sentenças unânimes, prolatadas por três desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e por cinco ministros do Superior Tribunal de Justiça, não restando a menor dúvida quanto à culpabilidade do político, que não teve condições para assumir a culpa pelos atos irregulares no seu governo, prestar contas à Justiça e à sociedade e muito menos, em especial, para comprovar a sua inocência com relação aos fatos denunciados à Justiça.

Ressalte-se que o político ficha suja saiu da prisão após o Supremo Tribunal Federal ter declarado inconstitucional a prisão após condenação em segunda instância, que foi o caso aplicável a ele.

Nessa mesma decisão, aquele tribunal também entendeu que o condenado tem o direito de aguardar em liberdade a decisão definitiva da Justiça até que estejam esgotados todos os recursos, que são tantos permitidos que jamais nenhuma condenação terá definição, à luz da morosidade da Justiça brasileira.

O certo é que o político se tornou elegível graças à nova decisão do Supremo, que anulou as mencionadas condenações, por considerar que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgar as denúncias cuja autoria era atribuída a ele.

Vê-se que, sob o prisma da juridicidade, os crimes atribuídos ao político tiveram a confirmação por meios legítimos das investigações policiais, da conformidade com os pronunciamentos do órgão jurídico competente e das decisões da Justiça, que o condenou com base na transparência e na juridicidade, à luz dos fatos reais e verdadeiros, sem qualquer margem para dúvida quanto ao cabimento ou não sobre a culpabilidade do político nos casos por ele envolvido.

Em primeiro lugar, o papa deixou de ser preciso, como é do seu dever papal, quando se arvora em tratar de assunto fora da sua seara clerical, ao citar apenas a existência de “notícias falsas na mídia”, quando a grandeza da sua autoridade papal exige que ele tivesse mencionado quais foram os fatos precisamente caracterizadores de falsidade, eis que fica feio para a sua autoridade diante da confirmação final dos fatos irregulares, com as condenações à prisão do político, que ele indica como tendo motivação falsa, quando aconteceu exatamente o contrário.

Não tem o menor cabimento que a maior autoridade da Igreja Católica possa vir se imiscuir em escândalo cuidadosamente analisado e julgado pela Justiça brasileira, sob argumento fajuto de que teria havido “notícias falsas” e que elas tenham sido, mas que os resultados são realmente verdadeiros, mostrando que houve desvio de conduta do político protegido pelo pontífice, que não tem nenhum direito de servir de instrumento de defesa de pessoa sem a menor condição moral para praticar atividades políticas, eis se trata de autêntico ficha suja, por força do seu envolvimento em esquemas criminosos, conforme as confirmações por meio de investigações policiais e julgamentos judiciais, tudo em consonância com as normas constitucionais e legais.  

Que até tenha havido a disseminação de fake news, na voz do papa, mas se houve a destruição da vida de uma pessoa, que na verdade nem houve, diante do resultado das urnas declarado pela Justiça eleitoral, isso não é verdade, porquanto o julgamento do político foi absolutamente justo e adequado às circunstâncias, ficando muito feio para o papa afirmar que o julgamento “parece não ter sido adequado”.

Nesse caso, o santo papa pode ter sido extremamente ingênuo, por ter se baseado em notícias imprecisas, quando ele afirma que “parece...”, quando, na Justiça, esse verbete significa imprecisão, dúvida e incerteza, quanto ao resultado do que se afirma como verdadeiramente ocorrido, que somente tem validade com a comprovação de que os fatos alegados por ele tenham sido realmente fantasiosos, tendo por base provas sobre o ocorrido, ficando muito claro que tudo conspira contra os dizeres do pontífice, porque “parece” somente mostra vácuo de certeza, no mundo jurídico.

Convém que se aplauda o papa por sua feliz afirmação de que “Um julgamento deve ser o mais limpo possível, com tribunais que não tenham outro interesse a não ser fazer justiça”.

Só que essa assertiva não se aplica aos casos do político brasileiro protegido pelo pontífice, uma vez que os julgamentos dele foram com base na maior limpeza permitida, na forma constitucional da ampla defesa e do contraditório, cuja tribunal, a cargo da competente Operação Lava-Jato, somente tinha interesse em fazer justiça, à vista de que a sua excelente padronização de decisões alcançou níveis jamais atingidos pela Justiça brasileira de qualidade e otimização, à vista do reconhecimento de que as sentenças proferidas no âmbito da 13ª Vara Federal de Curitiba foram, praticamente, confirmadas, sempre à unanimidade, nas instâncias recursais superiores, fato que somente comprova os desideratos de julgamento limpo e da imperiosa necessidade de se fazer justiça, tendo por base os fatos constantes dos autos, que não mereceram reparos nas instâncias superiores.

A confirmação das premissas indicadas acima põe por terra todas as injustas e indevidas alegações papais, na tentativa de destacar a inexistência de imaculabilidade do político estranha e declaradamente protegido por ele, quando os fatos investigados e julgados mostram a verdadeira desgraça que ele representa perante os princípios da moralidade, da dignidade e da honestidade, exigidos na administração pública.

O certo é que a verdade sobre os esquemas criminosos consistentes nos escândalos do mensalão e do petrolão recomendam que o papa, para o bem dele e sua santa igreja, poderia ter ficado à margem dessa vergonha brasileira e mundial, uma vez que seu nome fica vinculado, quer queira ou não, ao pior exemplo de gestão pública brasileira, quando o próprio envolvido foi completamente incapaz de provar a sua inculpabilidade com relação aos fatos cuja autoria é atribuída à pessoa dele.  

Além do mais, não fica bem para a autoridade máxima da Igreja Católica tentar livrar a imagem de político ficha suja, que ainda responde a vários processos penais na Justiça, sob a suspeita de envolvimento na prática de atos irregulares, quando somente compete ao papa opinar sobre as questões relacionadas com os assuntos da competência eclesiástica, sendo absolutamente questionável o seu comportamento fora disso, em especial quando em defesa de político em plena decadência moral, conforme mostram, à saciedade, os fatos policiais e judiciais, constantes de autos específicos, que certamente não são do conhecimento daquela autoridade.

Enfim, é possível se concluir que o santo papa, na tentativa de proteger indevidamente político ficha suja, perde especial oportunidade para dignificar a sua atividade pastoral de chefe da Igreja Católica, conforme é da sua maravilhosa missão apascentadora do seu rebanho.


Brasília, em 19 de dezembro de 2022

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