terça-feira, 5 de janeiro de 2016

A blindagem como regra


O Palácio do Planalto vai tentar blindar o titular da Fazenda contra possível condenação decorrente das pedaladas fiscais, por ele ser considerado peça fundamental para o governo tentar a recuperação da credibilidade na economia.
É evidente que, na forma legal, o simples pagamento das pedaladas fiscais, como não podia ser diferente, porque apenas tem o peso de confirmar as irregularidades, não foi suficiente para afastar o fantasma das manobras em 2016, fato esse que reacende foco de preocupação do governo com sede no Tribunal de Contas da União, com relação ao ministro daquela pasta.
Decorrentemente, o TCU está prestes realizar o julgamento da última parte do caso pertinente às pedaladas fiscais e definir a atribuição de responsabilidades para as 17 autoridades do governo envolvidas nesse episódio, cujas penas passíveis de aplicação podem ser desde multas pecuniárias até inabilitação para o exercício de cargos públicos, o que exigiria, se aplicada, neste último caso, a imediata demissão dos condenados.
Induvidosamente, eventual condenação do ministro da Fazenda pelo TCU teria enorme repercussão no mercado financeiro, em razão do surgimento de especulação quanto ao seu sucessor, fato que poderia suscitar mais insegurança e incerteza acerca do futuro da economia, que já se encontra cambaleante ao extremo.
Segundo o Estado, o governo vai montar força-tarefa junto ao relator do feito no TCU, com o objetivo de evitar condenação grave de seus ministros, porque isso envolveria enorme constrangimento para a equipe econômica, que poderia dificultar em muito as negociações com o Congresso Nacional, para aprovação das medidas referentes ao ajuste fiscal.
Veja-se a absurda alegação do governo de que os atos relativos às pedaladas fiscais nem eram considerados ilegais quando praticados, entre 2013 e 2014, embora a proibição se encontrasse de forma cristalina nas normas pertinentes à administração orçamentária e financeira a que se referem as Leis de Responsabilidade Fiscal e de Diretrizes Orçamentárias, fato que demonstra o desprezo dele pela observância do salutar princípio da legalidade, em especial.
Na avaliação do governo, o novo julgamento das pedaladas fiscais pelo TCU será dramático, diante da possibilidade de potencializar em muito a temperatura do processo de impeachment contra a presidente, que poderá estar sob exame em concomitância na Câmara dos Deputados, uma vez que o afastamento dela foi pedido pela oposição com base nas famigeradas pedaladas fiscais, que teriam constituído crime de responsabilidade fiscal, nos termos da legislação de regência.
Como se sabe, as pedaladas fiscais foram julgadas irregulares pelo TCU, que condenou a manobra, de forma unânime, ao considerar que elas infringiram a Lei de Responsabilidade Fiscal, implicando que o órgão de controle externo recomendasse que o Congresso Nacional rejeitasse as contas do governo, referentes ao exercício de 2014, restando, nesta fase, a atribuição de responsabilidades para que seja concluído o julgamento pertinente às pedaladas em tela.
          O caso em comento até parece verdadeira piada do cotidiano, em que o verbete blindagem é empregado invariavelmente quase todo dia, a começar pela presidente do país, para se evitar que altas autoridades do governo sejam salvas da degola ou do processo de condenação, em clara demonstração de que a administração do país está sempre envolta com dificuldades de gestão, porque sempre há agente público precisando de socorro para ter a sua pele colocada a salvo, como no caso, agora, mais especificamente do ministro da Fazenda, que não pode ser arrolado em processo que apura irregularidades oriundas do Palácio do Planalto, para que isso não tenha reflexo no desempenho do mercado financeiro.
Especula-se até quando os brasileiros vão aturar passivamente tanto desmazelo com a gestão pública, que não consegue ter segurança e legitimidade quanto aos atos praticados, porque eles, invariavelmente, são passíveis de questionamento, dando a entender que o país está entregue a pessoas carentes de melhor qualificação profissional, ante as reiteradas demandas em defesa de seus atos?
Os brasileiros precisam cuidar melhor dos interesses nacionais, repudiando os atos do governo prejudiciais ao bom gerenciamento do país, de modo que jamais a administração pública precise recorrer a esse abominável verbete blindagem, ultimamente tão comum nas hostes palacianas, porque ele tem sido utilizado com frequência justamente para se evitar mal ainda pior quanto à credibilidade da gestão pública, conquanto, normalmente, fato grave já houve que precisa circunstancialmente ser abafado ou não potencializado o seu efeito, para que o estrago não seja de maior proporção aos interesses nacionais. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 05 de janeiro de 2016

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