terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Falha injustificável



Segundo notícia publicada pelo site do jornal O Estado de S. Paulo, um menino de 12 anos morreu, em Brasília, após a impossibilidade da realização do transplante do coração doado, por falta de aeronave para o transporte do órgão.
A Central Nacional de Transplantes localizou coração compatível em Minas Gerais, mas a Força Aérea Brasileira (FAB) teria alegado que não tinha avião disponível para fazer o voo até o Distrito Federal. 
Diante da gravidade do estado de saúde do menor, que já se encontrava na lista nacional de espera para transplante, em caráter prioritário, a vida dele dependia do coração do doador que estava em Itajubá, a 40 minutos de carro de Pouso Alegre, cidade mais próxima com pista de pouso para aviões, mas a FAB informou que não pôde atender ao pedido "por questões operacionais". 
Embora a notícia inicial se refira à falta de aeronave, a assessoria de imprensa do Ministério da Saúde destacou a dificuldade logística para a realização do procedimento, considerando que, do momento da retirada do coração do peito do doador até o seu implante no receptor, o interregno máximo é de quatro horas, sob risco de insucesso do transplante: "Esse exíguo tempo (chamado tecnicamente de tempo de isquemia fria) dificulta a sua realização da retirada e do transplante em casos em que o potencial doador se encontra no interior do país,...".
O Ministério da Saúde ressaltou, por meio de nota, a colaboração da FAB e a parceria com empresas de aviação civil no transporte gratuito de órgãos para transplante. Enquanto isso, a FAB lembrou a existência de acordo de cooperação técnica com esse ministério, para a priorização de transporte de órgãos e tecidos, colaborando para a ampliação da quantidade de transplantes. 
Por seu turno o Centro de Comunicação Social da Aeronáutica disse que "Além dessas atribuições, a FAB realiza o transporte de órgãos em aproveitamento de missões militares, de acordo com a disponibilidade e considerando aspectos operacionais. No dia 1º de janeiro, a FAB não pôde atender ao pedido por questões operacionais".
De repente, aparecem tantas explicações e versões sobre o lamentável ocorrido, mas de efetividade mesmo ficou a gigantesca e injustificável omissão das autoridades públicas, que contribuiu para o óbito de uma criança, que até poderia ter sido salva se tivesse havido o mínimo de empenho no sentido de, pelo menos, tentar o resgate do coração compatível ao caso, ficando muito claro que isso não foi feito e uma jovem vida foi perdida.
Causa perplexidade que uma vida humana seja simplesmente descartada, sob o ridículo argumento de que não tinha aeronave disponível ou condições operacionais, como se isso fosse possível justificar para a sociedade imperdoável lacuna de atendimento na agonizante e contestável saúde pública, objeto de permanente e crônica insatisfação dos brasileiros.
Com absoluta certeza, caso alguma autoridade do governo federal tivesse requisitado avião da FAB, no mesmo dia, ela teria sido atendida prontamente, porque tudo seria feito para não deixar de satisfazer pedido dessa natureza, que é sempre atendido sem necessidade de prévia avaliação ou justificativa quanto à satisfação do interesse público, embora seja sabido que todos os voos de autoridades podem perfeitamente ser feitos em escala comercial, sem qualquer prejuízo para o serviço público, mas as aeronaves oficiais ficam à mercê das autoridades do governo federal, sem a menor preocupação com o custo-benefício e muito menos com o princípio da economicidade.
No caso em comento, confirmada a impossibilidade de atendimento, devidamente justificada, por parte da FAB ou por quem quer que seja, caberia ao Ministério da Saúde a incumbência de arranjar a aeronave, por meio de recursos próprios, não importando o valor a ser despendido, porque a vida humana não tem preço e todo esforço deveria ter sido adotado para o salvamento de um jovem ser humano.
O mais inaceitável e estranho de tudo isso é que, de forma irresponsável, somente foi informado que não houve o atendimento do caso de emergência, ficando simplesmente encerrado o assunto, sem que não se cogitasse sobre a indispensável apuração do caso lamentável, com vistas às responsabilizações pelos extremos descaso e omissão diante da imperiosa necessidade da salvação de vida humana.
Além da necessidade da devida apuração sobre o caso em comento, convém que isso não fique impune e que esse péssimo exemplo sirva de alerta, em termos preventivos, para que novas vidas não sejam perdidas em razão do descaso ou da omissão das autoridades públicas, que têm obrigação constitucional e legal de adotar todas as medidas para assegurar a vida das pessoas, quanto mais nos momentos mais difíceis.
Os brasileiros precisam repudiar, de forma eloquente, descaso injustificável dessa natureza e exigir com muito afinco que as autoridades públicas incumbidas da saúde dos brasileiros cumpram suas funções com responsabilidade, competência e eficiência, não medindo esforços para a salvação de vidas humanas e muito menos permitindo a reincidência de situações semelhantes a essa, como forma da reafirmação da valorização da vida humana. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 19 de janeiro de 2016

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