O
velório da ex-primeira-dama transcorreu em clima tenso e concorrido por
populares, militantes e principalmente lideranças políticas, quando, alguns dos
quais, aproveitaram o ensejo para politizá-lo, como forma de extravasar seus rancores
e ódios contra aqueles que não comungam da cartilha petista, notadamente a
força tarefa da Lava-Jato, principal alvo do líder-mor e de seus seguidores e
simpatizantes.
Antes
de o político discursar, o presidente do Partido dos Trabalhadores, a par de mostrar
pesar pela morte da ex-primeira-dama, afirmou, criticando indiretamente a
Lava-Jato, que ela foi “uma das maiores
vítimas dos cruéis ataques da elite brasileira”, porque “rasgaram princípios caros ao Estado
Democrático de Direito, como o da necessidade de provas em uma acusação.
Quebraram sigilos pessoais de sua vida e de sua família, sem sequer uma prova”.
Já
um senador do PT-RJ afirmou que a ex-primeira-dama foi “vítima de perseguição”, o que teria contribuído para agravar seu
estado de saúde, e acrescentou que “Estou
engasgado com isso. Ela foi vítima de uma perseguição gigantesca e não aguentou”.
Não
obstante, o momento mais contundente aconteceu com o discurso do ex-presidente,
tendo dito, no auge da emoção, que “Na
verdade, Marisa morreu triste. Porque a canalhice que fizeram com ela, e a
imbecilidade e a maldade que fizeram com ela, eu vou dedicar (o
ex-presidente não encerrou a frase). Eu
tenho 71 anos, não sei quando Deus me levará. Acho que vou viver muito, porque
eu quero provar que os facínoras que levantaram leviandade com a Marisa tenham,
um dia, a humildade de pedir desculpas a ela”. A ex-primeira-dama era ré
junto com ex-presidente em duas ações penais, no âmbito da Lava-Jato.
O
petista, encerrando seu discurso político no velório, afirmou que não tem medo
de ser preso, esclarecendo que “Se alguém
tem medo de ser preso, este que está aqui, enterrando sua mulher hoje, não tem.
Não tenho que provar que sou inocente. Eles que precisam dizer que as mentiras
que estão contando são verdadeiras”.
Não
há a menor dúvida de que o momento era do maior pesar pelo desaparecimento de
pessoa querida, mas são por demais inadmissíveis os absurdos, idiotices e
ignomínias que saíram na mídia sobre a triste e lamentável perda, ante a insensibilidade
por parte de pessoas inescrupulosas que teceram considerações e se manifestaram
alheias ao devido senso humanitário, mas também são absolutamente sem noção os
discursos inflamados de políticos, que aproveitaram do evento de tristeza,
desolação e sofrimento para expor formas rancorosa de estupidez e de repúdio a
fatos que até podem ser plausíveis, porém a ocasião era absolutamente
incompatível com os desabafos.
Em
se tratando da despedida de ser humano, em especial por sua importante representatividade
para os presentes, não caberia a presença do corpo como palanque e palco para
discursos políticos inflamados, justamente porque isso não condiz com os
sentimentos cristão e humanitário.
É
lamentável que em momento de muita tristeza e dor, com a perda de pessoa
importante para o partido, suas lideranças aproveitassem o ensejo para fazer
acusações à elite, como se a cúpula do partido fosse constituída de pobres
coitados.
O
momento era somente de muito pesar, por se tratar da perda de pessoa importante
para a história política do país, não sendo o caso de acusações despropositadas
e inadequadas à situação de sentimentos e dor.
Por
seu turno, jamais o PT vai conquistar a simpatia da elite, por ser
permanentemente atacada até mesmo em ocasião especial como a do velório, que caberia,
à luz do bom senso, tão somente de se lamentar a precoce ida de pessoa querida de
seus familiares e amigos, que merece sim partir em paz com tudo e com todos,
porque, para ela, o passado são aproveitáveis apenas os bons acontecimentos...
Na
verdade, não se sabe o que é mais doloroso, se a dor da morte ou a dor da
insensatez de pessoa que aproveita a intensidade do sofrimento do velório para
demonstrar rancor e ódio contra investigadores e membros da Justiça, com
relação aos fatos ainda em fase de apreciação, cujo desfecho depende muito da
apresentação da defesa, por meio da qualidade das provas materiais capazes de
anular as suspeitas que já resultaram em denúncias aceitas pela Justiça.
Por
mais que seja doloroso o envolvimento de ex-presidente da República e de sua esposa
em processos sob suspeita da prática de irregularidades, quando eles têm
obrigação moral, à vista do relevante cargo por ele ocupado, de ser espelhos da
ética, moralidade e honradez, nada justifica tamanho desabafo em local absolutamente
inadequado.
É
de se lamentar que isso tenha acontecido na vida deles, mas o momento de
velório não condiz com essa forma destemperada de desabafo, por extrapolar o
verdadeiro sentimento da sublime dor da morte, que precisa ser respeitado sobre
quaisquer outros sentimentos, por mais razoáveis que sejam, até mesmo nesse
caso da Operação Lava-Jato, que deve ser cuidado na esfera própria, mesmo por
que o desabafo rancoroso não tem o condão de modificar os resultados das
investigações já concluídas, que precisam ser contestadas na esfera adequada,
como acontece com os demais brasileiros envolvidos em casos de suspeitas da
prática de irregularidades.
Embora
se trate de episódio estranho, essa forma de repúdio apenas guarda coerência
com a personalidade estrambótica do político considerado o mais poderoso do
país, que reluta em não ser julgado pela Justiça, mesmo que haja indícios sobre
a materialização dos fatos denunciados contra ele e já aceitos pela Justiça, lembrando
que os juízes incorrem em crime de prevaricação em caso da aceitação de
denúncia que não esteja devidamente formalizada com os elementos exigidos pela
lei de regência.
Diante
disso, convém que o político se digne a provar a sua inculpabilidade, por meio
de elementos juridicamente válidos, como forma capaz de se livrar das garras da
Justiça, que precisa cumprir a sua missão institucional de julgar igualmente
todos os casos chegados à sua presença, não importando a relevância da
autoridade que, perante a lei, não faz a menor diferença, em termos de
julgamento.
À
luz do sentimento humano, o político perdeu excelente oportunidade, em
homenagem às pessoas de bom senso, de ter ficado calado por ocasião do velório
de sua ex-esposa, no que se refere à lembrança sem sentido de fatos da
Lava-Jato, ante a sua incompatibilidade com a situação de imensurável dor da
despedida derradeira de ente querido, quando se aconselha o máximo de respeito
para com quem parte, à vista dos salutares princípios cristão, humanitário e de
civilidade.
ANTONIO
ADALMIR FERNANDES
Brasília,
em 6 de fevereiro de 2017
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