quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Ideia desarrazoada

Os advogados do ex-presidente da República petista solicitaram ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) a anulação do processo referente ao tríplex do Guarujá, SP, onde ele se tornou réu, sob a alegação de que a medida é necessária “em virtude de diversos atos que mostram que o juiz Sérgio Moro perdeu a imparcialidade para julgar Lula.”.
Os advogados argumentam que o processo contém “provas pré-constituídas” e relatam algumas ações do juiz da Operação Lava-Jato que, na opinião deles, justificariam a anulação dos autos.
Entre outros assuntos, a defesa do político elenca a condução coercitiva do ex-presidente para depor na Polícia Federal – que, segundo eles, não teria previsão legal -, autorização de busca e apreensão sem observar a lei aplicável à espécie, interceptação telefônica e divulgação de áudios das conversas do ex-presidente em dissonância com a legislação.
Os advogados também argumentam que o juiz de Curitiba teria antecipado juízo de valor sobre o recebimento da denúncia e conduzido as audiências de instrução de modo a expor evidência de “inimizade” com o político, além daquela autoridade ter participado de eventos com políticos de grupos políticos que fazem oposição ao ex-presidente – como o prefeito de São Paulo (PSDB) e o presidente do PSDB – e feito manifestações de caráter político (sem indicá-las).
Em conformidade com os resultados das investigações, os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato concluíram que o político teria recebido benesses da empreiteira OAS – uma das que integravam o cartel que pagavam propinas na Petrobras – em obras de reforma no apartamento 164-A do Edifício Solaris, no Guarujá.
O prédio foi construído pela Cooperativa Habitacional do Sindicato dos Bancários (Bancoop), que foi presidida por um ex-tesoureiro do PT que se encontra preso pela Lava-Jato. O imóvel foi adquirido pela OAS, recebeu benfeitorias da empreiteira e teria sido oferecido ao político.
Vê-se que o juiz da Lava-Jato não tem qualquer participação na fase instrutória do processo, não cabendo qualquer suspeição da sua parte quanto ao julgamento do caso, porquanto a sua atuação se refere ao acolhimento da denúncia, já conclusa com o resultado das provas que sintetizam a materialização dos crimes arrolados nele.
Agora causa perplexidade se verificar que os fatos indicados pela defesa para a anulação do processo nada dizem com o cerne da denúncia, que se encerra com o possível recebimento pelo político de benesses da empreiteira OAS, por meio da reforma do imóvel e da colocação de móveis nele.
Não obstante, à vista dos possíveis desvios de conduta do magistrado de Curitiba, no que tange à inobservância do ordenamento jurídico, ao relacionamento dele com políticos de oposição ao réu e às manifestações de caráter político caberia, muito apropriadamente, no máximo, denúncia aos órgãos competentes do Judiciário, com vistas à possível apuração das condutas cívica e profissional dele, como forma da aplicação, se for o caso, de penalidades cabíveis.
Ou seja, mesmo que os fatos elencados pelo político, no seu recurso, pudessem constituir algo de eventual gravidade contra as condutas do juiz da Lava-Jato, nada disso aconselharia a anulação do processo, ante a falta de conexão entre a atuação dele e os fatos objeto da denúncia.
À toda evidência, na pior das hipóteses, a defesa em referência até poderia alegar desvios de conduta do juiz para solicitar a redistribuição do processo para outro juiz, que poderia julgá-lo normalmente, com a desejável isenção e imparcialidade, no sentir do interessado, mas jamais há cabimento para essa estrambólica e desarrazoada ideia de anulação dos autos, sem antes ser analisado o mérito dos assuntos neles retratados, que são a suspeita do recebimento de propina por quem tem o dever de mostrar licitude na prática de seus atos, justamente por ser considerado o principal político do país, que precisa provar, no caso, a sua inculpabilidade e, para tanto, a defesa é o caminho legal apropriado. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 1 de fevereiro de 2017

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