Como
de costume, alguma atenção do governo e muito remotamente da sociedade somente
acontece com relação ao falido sistema penitenciário quando situações extremas
mostram o ápice das precariedades, como forma inevitável de se jogar luzes momentâneas
sobre questões inadiáveis que precisam, com urgência, dos cuidados do Estado, em
que pesem elas estarem vinculadas diretamente aos direitos humanos.
Os
casos recentes das rebeliões em presídios superlotados, comandados por sanguinárias
facções criminosas, refletem a grandiosidade dos problemas potencialmente com
poder de explosão e de graves crises internas, consistentes na matança de
presos por grupos adversários, decorrente da demonstração de força para a
demarcação de poder e de liderança nos presídios.
As
rebeliões deflagradas em presídios do Norte e Nordeste sinalizam também para a
falência da autoridade e da ordem pública, tanto interna como externamente nos
presídios, e os assassinatos dentro dos presídios e nas cidades são a evidência
da força das facções que, de maneira inexplicável, controlam presídios e agem nas
ruas, mesmo sob o comando de chefões presos, como se os gabinetes das
lideranças existissem legalmente instalados dentro dos presídios.
Isso
mostra a falta de controle e de responsabilidade das administrações prisionais,
que são incapazes e impotentes para impedir que delitos sejam executados sob as
ordens emanadas dos comandantes de facções cumprindo pena, em clara
demonstração da esculhambação reinante nos presídios.
Não
é de agora que as autoridades públicas reconhecem que os presídios brasileiros
são verdadeiras “masmorras medievais”, assim cognominadas até mesmo por então ministro
da Justiça, que, diante da constatação, simplesmente nada fez para alterar esse
quadro deplorável de indignidade e de irresponsabilidade, quando era de se
esperar que ele, consciente do estado falimentar e precário do sistema
carcerário, houvesse dispensado o mínimo de atenção para a situação deprimente
e inaceitável, por se tratar do suposto complexo correcional brasileiro, que
tem por finalidade, em princípio, transformar criminosos em homens dignos de se
reintegrar à sociedade em condições normais de restabelecimento social.
A
complexidade do tema relacionado às prisões precisa transcender, com urgência,
a simples cara de espanto das autoridades quando fatos mais graves acontecem,
como no caso das mortes acontecidas nos presídios acima aludidos, que deixaram
o rastro de rios de sangue e mortes, em atos de extrema desumanidade, para a
efetiva materialização de medidas e ações consistentes na adoção de políticas
sérias de investimentos nas melhorias das condições físicas das dependências
dos presídios e também na aplicação das normas disciplinares quanto ao seu
funcionamento, com a urgente eliminação das facções e dos comandos agindo livremente
dentro dos presídios, como se eles fossem extensão segura para serem ordenadas as execuções dos delitos, sob
as barbas das autoridades públicas, que, nas circunstâncias, são cúmplices com
a criminalidade.
O
certo é que, diante do quadro de gravíssimo desrespeito aos direitos dos
presos, que somente vem piorando com o passar do tempo, por força do aumento
exponencial da população carcerária, os presídios já deveriam ter sido motivo
de priorização e de permanente preocupação do Estado, por meio de políticas objetivando
o fomento de programas eficientes e sérios de melhorias e de adequação física
ao princípio correcional da aplicação de penas tendentes à reparação social
pela transgressão do ordenamento jurídico do país.
Já
se sabe, de longa data, que as reconhecidas masmorras tupiniquins antes de
contribuir para a recuperação de presos, se prestam para o agravamento das
condições física e moral dos apenados, diante do seu confinamento em sistema
banalizado pela superlotação das celas (em face do absurdo déficit de vagas, pela
superação de mais 600 mil detentos), pelos maus-tratos, pela violência e pelo
desrespeito aos direitos humanos, tudo isso já sendo do reconhecimento de
organismos internacionais de defesa dos direitos humanos, inclusive da
Organização das Nações Unidas.
Não
há a menor dúvida de que o tratamento (mais apropriadamente a forma desumana
dispensada aos detentos) se consubstancia em uma política bastante eficiente e eficaz
de degeneração humana e de transformação dos presídios em verdadeiras universidades
do crime, em que os presos não precisam se esforçar para a aprendizagem da pior
qualidade do submundo do crime.
É
evidente que a gravidade dos problemas no sistema carcerário, além de
imensuráveis, estão relacionados com o baixo índice correcional, que corresponde
diretamente com as altas taxas de reincidência em crimes de apenados que voltam
à liberdade, fato este que também se soma à falta de controle que deve existir
nos presídios, a exemplo da total liberdade concedida, inexplicavelmente, às facções
criminosas, que podem exercer livremente o domínio de seus liderados, o que
evidencia total falta de seriedade e de competência de autoridades públicas.
A
soma do conjunto das precariedades ajuda a explicar a razão pela qual o sistema
penitenciário, que é essencial ao sistema penal, se revela tão inepta no
cumprimento de suas funções, que se junta e se integra em deficiência com os
outros elementos desse importante complexo, como a legislação penal, a execução
de penas, a política correcional, entre outros que precisam urgentemente de
aperfeiçoamento e de atualização com a realidade do desenvolvimento humanitário.
Urge
que os governos federal e estaduais decidam pela adoção de políticas públicas, sob
a forma de mutirão abrangendo várias setores, em consonância com as suas
incumbência constitucional e responsabilidade de Estado, no sentido de cuidar, de
forma prioritária, das questões pertinentes ao sistema carcerário e de outros a
ele interligados, de modo que se busquem as devidas soluções para os problemas
pertinentes, em razão da seriedade presente no caso, ante o envolvimento de vidas
humanas, graves desrespeitos à sua dignidade e menosprezo aos sagrados direitos
dos cidadãos encarcerados. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 16 de fevereiro de 2017
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