quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Literalmente inaceitável


Em razão da crônica intitulada “Pelo fim dos abusos”, em que foi analisado um  comentário decorrente do texto original, sob o título “Voos irregulares”, onde fiz crítica acerca do indevido uso de helicóptero colocado à disposição da Presidência da República por familiares do presidente da República, que participaram do casamento de um dos filhos do mandatário brasileiro, um cidadão sempre atento se manifestou fazendo exatamente a seguinte assertiva: “Ao pé da letra, nem a mulher de Bolsonaro deveria ir no helicóptero, só ele é presidente.”.
Na minha modesta concepção, literalmente, somente as pessoas que moram com o presidente da República, como integrantes regulares da sua família, por exemplo, esposa e filhos,  têm direito ao usufruto dos bens públicos e na forma estabelecida na legislação aplicável à espécie.
No caso em comento, foi usado helicóptero da FAB para transportar irmãos e sobrinhos do presidente, que não moram no Palácio do Planalto com ele, mas eram convidados do filho dele para participarem de seu casamento, em atividade cristalinamente de natureza particular.
Diante do estarrecimento apresentado por muitos brasileiros defensores do presidente da República, que consideram normal que ele possa ignorar os saudáveis princípios da legalidade e da economicidade, para o fim de dispor livremente de bens públicos em atividade particular, chega-se à conclusão de que o Brasil ainda pode ser comparado às republiquetas, onde talvez nelas seja possível acontecer procedimento semelhante, diante da absoluta promiscuidade e do abuso com dinheiro público, onde deve ser normal que os contribuintes sejam pacientemente explorados na sua boa vontade.
Já li comentário na tentativa de se justificar o injustificável, sob a alegação de que outros governos também faziam a mesma coisa, com normalidade, fato que não passa de outra grave incompreensão sobre o rigor que precisa ser observado com relação aos gastos públicos, exatamente porque um grave erro não pode servir de exemplo, eis que eles estavam completamente errados e deveriam ter sido responsabilizados pelo uso indevido de bens públicos, em proveito próprio, particular, absolutamente condenável, por ser procedimento sem amparo legal, i.e., ilegítimo, na origem.
Os recursos envolvidos em tais eventos deveriam ter sido destinados para onde tem carência, quando, muitas das vezes, um atendimento médico, por exemplo, deixa de ser feito, em razão da falta de material simples e básico para o procedimento, até de urgência, mas as autoridades públicas não têm a mínima sensibilidade para perceberem esse detalhe, simplesmente porque para elas não tem carência de nada, nem de recursos, quando tudo é bem servido do bom e do melhor, sem demora.
Infelizmente, enquanto ainda houver brasileiro com essa ingênua  mentalidade de se aceitar normal que o presidente, governador, parlamentar, prefeito etc. não estão obrigados a observarem os rigores das leis, o Brasil dificilmente tem condições de valorizar o suado e pesado contributo que se recolhe compulsoriamente pelos bestas dos contribuintes, que são obrigados a sustentar a máquina pública inchada, ineficiente, inoperante, incompetente e, por vezes, comandada por quem considera normal fazer uso de bens públicos em fins particulares, que ainda conta com a beneplácito de parcela de brasileiros, quando eles deveriam repudiar, com veemência, atos nitidamente irregulares e prejudiciais ao interesse público.
          Tenho enorme dificuldade para compreender como as autoridades públicas não conseguem enxergar que interesse público é exatamente o contrário de causa particular, porquanto aquele é regido estritamente por leis, em que nada pode ser feito se não estiver normatizado, enquanto este é livre e independe de norma legal, quanto às despesas.
Nos países sérios e civilizados, em termos administrativos, políticos e democráticos, as despesas públicas somente podem ser realizadas, pela administração pública, estritamente para a satisfação do interesse público, ou seja, festa de casamento de filho do presidente da República é completamente alheia ao interesse da população e, por isso, o uso de aeronave oficial é inadmissível, passível de ressarcimento dos valores comprometidos nas operações irregulares, além da conveniência sobre admoestação aos agentes públicos envolvidos, como forma de importante lição pedagógica, com vistas a se evitar a reincidência de casos análogos.
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 7 de agosto de 2019

Nenhum comentário:

Postar um comentário