terça-feira, 7 de setembro de 2021

Conselho da República?

No discurso feito aos manifestantes, em Brasília, no Dia da Independência, o presidente da República declarou que vai reunir o Conselho da República, amanhã.

O aludido conselho é o órgão superior de consulta do presidente da República, criado na forma do artigo 89 da Constituição e tem por precípua finalidade assessorar o chefe do Executivo em momentos de crise, repita-se, em momento de crise.

Segundo a Lei nº 8.041/90, compete ao presidente do país convocar o conselho especificamente para tratar dos casos de “intervenção federal”, “estado de defesa e sítio”; e também sobre questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas.

A situação se torna emblemática, nesse caso, porque a fala da convocação do presidente ocorreu ao meio de protesto em que apoiadores defendiam novo golpe militar, com fechamento do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional, ou seja, esses assuntos com ingredientes os mais explosivos possíveis sendo tratados por força de crise criada e alimentada sistemática e insistentemente pelo próprio ocupante do Palácio do Planalto.

Em que pese o presidente do país ter mencionado o nome do presidente do Supremo, em sua fala sobre a convocação com forte fedor golpista, não há previsão legal sobre a participação do chefe do Poder Judiciário nesse conselho e ainda que tivesse certamente que ele jamais compareceria ao evento, uma vez que a corte é o cerne de possível decisão, ante a referência no discurso presidencial de ministro daquela casa.

Como se trata de presidente fragilizado, em termos políticos, muito dificilmente os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal também devem comparecer ao ato, justamente porque os manifestantes pediram o fechamento do Congresso, que fatalmente será objeto de discussão no encontro de líderes.

Ao anunciar a reunião do Conselho da República, o presidente do país dá a entender que ele pretende decidir sobre questões cruciais, com o respaldo do principal órgão de assessoramento da República, para que o seu ato não seja considerado golpista, à luz da opinião pública, porque isso seria terrível para ele, em termos da sua imagem política, tendo inclusive enorme e negativo reflexo perante o mundo, ante o indiscutível atropelamento das normas constitucionais, caso ele venha a conseguir enquadrar a gigantesca crise criada por ele como assunto a ser discutido onde se deveria cuidar exclusivamente de matéria de natureza nacional, com possíveis repercussões aos interesses dos brasileiros.

Na verdade, a crise existe e é bastante grave, apenas sendo necessário se compreender que ela foi criada de propósito pelo próprio presidente que quis que ela atingisse as dimensões que chegou, com a potencialização do protesto dos brasileiros, cujo ato também foi criado por ele, ou seja, se o mandatário tivesse tido o mínimo de sensibilidade política jamais a situação teria atingido esse desconfortável estágio, em que a principal autoridade nunca teve interesse em minimizar os fatos, na busca da convergência de entendimentos.

Para que isso tivesse ocorrido, em forma de tolerância e diplomacia entre os poderes da República, não precisaria qualquer forma de crítica e acusações, mas sim o emprego dos saudáveis diálogos, com o adjutório dos recursos contra todas as decisões prolatadas pelo ministro, de modo a se mostrar, por meio de argumentos e esclarecimentos juridicamente inteligentes, a inconsistência, conforme o caso, das sentenças adotadas nos casos em que são alegados abusos de autoridade.

O certo é que esse caminho, que é normalmente percorrido nos países com o mínimo de seriedade e evolução, em termos jurídicos, políticos e democráticos, nunca foi aceito pelo presidente brasileiro, que queria mesmo que a bolha viesse a explodir, como acaba de acontecer, e assim há, na imaginação dele, a possibilidade da reunião do Conselho da República, para, finalmente, ser apresentado o seu primeiro projeto de governo, revolucionário e golpista, que somente se tornou viável exclusivamente pelo acúmulo da insensibilidade e da intolerância, em todos os sentidos político-administrativos.

Os brasileiros esperam que, caso haja a reunião do Conselho da República, que a maioria dos seus integrantes diga, com todos as letras, ao presidente da República que ele precisa se conscientizar sobre as urgente e prioritária necessidade da concentração dele nos reais assuntos inerentes às atribuições constitucionais, próprias de quem se elege para cuidar exclusivamente dos interesses da população, respeitando a autonomia e a independência dos outros poderes da República, porque é exatamente assim que fazem os verdadeiros estadistas, tendo o zelo de honrar o seu nome como homem público preocupado com o bem comum.      

          Brasília, em 7 de setembro de 2021 

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