Como não poderia ser diferente, há muitas versões
para possível enquadramento jurídico sobre as condutas do último ex-presidente do
país, que se encontra sob investigação sobre tentativa de golpe, cuja interpretação
sobre o fato em si tem suscitado um mar de controvérsias entre os especialistas
em direito criminal.
É preciso que se discuta se alguém pode ser punido
sem sequer ter praticado ato passível de enquadramento legal, à vista da
inexistência de crime capitulado como tal, exatamente diante da falta do objeto
criminal, que é o ato propriamente, uma vez que somente a intenção não gera
dano para ninguém, especialmente para a democracia, quando somente o ato concreto
do golpe poderia conduzir à ruptura efetiva do Estado Democrático de Direito e
nada aconteceu nesse sentido.
Falam-se, apenas em forma de argumentos para a sustentação
das investigações inerentes ao pseudogolpe, com base na existência de mensagens
em que o ex-presidente do país teria discutido com oficiais-generais a edição
de decreto golpista, tendo pedido modificações na minuta do documento, que
ainda continha medida para a prisão de ministro da corte maior do país e a
realização de novas eleições.
Nesse contexto, são alegados que, em reunião
ministerial, o ex-presidente do país teria ordenado que integrantes do governo propalassem
ideias sobre fraude no sistema eleitoral, entre outras estratégias destinadas a
garantir a manutenção dele no poder.
Segundo o ministro-relator do processo pertinente, os
fatos narrados pela Polícia Federal indicam a materialidade dos crimes de golpe
de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, uma vez que ele se
configura quando alguém tenta depor o governo legitimamente constituído, por
meio de violência ou grave ameaça.
Na linha dessa interpretação, o crime de abolição
do Estado Democrático de Direito se efetiva a partir de ato com violência ou
grave ameaça para tentar impedir ou restringir o exercício dos poderes
constitucionais, a exemplo do livre funcionamento da corte maior do país.
Na verdade, não há consenso entre os especialistas
criminais sobre a configuração de crime a simples conduta preparatória de determinado
crime, à vista da falta da sua materialidade, como assim é defino na lei.
Na verdade, há sustentação no sentido de que os
episódios sob suspeitas, por si sós, já configuram crime, mesmo somente na
forma de tentativa, sem a existência de algum de dano a coisa alguma, vez que a
simples minuta de decreto de golpe caracterizaria grave ameaça.
Vejam-se tamanha a estupidez de interpretação feita
por catedrático professor de importante universidade brasileira, pasmem: "O
crime é tentar abolir, ou seja, nós transformamos num crime completo a
tentativa. Isso torna muito difícil a gente limpar o que é ato preparatório
nesses casos".
Na verdade, talvez no campo da ideologia esquerdista
tenha tanta facilidade para se concluir que mera ideia sobre a tentativa de ato
infracional, à luz dos princípios jurídicos, possa caracterizar crime sem
qualquer lesão a coisa alguma, ficando muito claro tudo isso não passa de
estapafúrdio instinto de perseguição, sem o menor respaldo jurídico, sob o
prisma do bom Direito,
Enquanto isso, um professor de direito penal da
Universidade Humboldt de Berlim, após avaliar os elementos constantes da
questionada decisão, com base na aludida reunião, diz que não estariam
configurados os crimes de golpe de Estado e de abolição do Estado Democrático
de Direito, exatamente, segundo ele, diante da falta do início da execução
desses tipos penais, dado que ambos exigem violência ou grave ameaça para a sua
configuração.
Aquele professor deixou claro que "A
reunião não é início da execução de violência ou de grave ameaça. Uma reunião
para discutir uma estratégia de ação, isso é ato preparatório.", sem
qualquer consequência prejudicial aos interesses de terceiros.
Ele entende que, a princípio, as reuniões sozinhas
nunca serão tentativa destes crimes, salvo se essas medidas forem agregadas a
outros elementos correlatos, sendo possível que haja essa configuração.
Em que pese o ex-presidente do país ter tido alguma
intenção de golpe, diante da realização da malsinada reunião, nada de efetivo
aconteceu, conquanto também não tem como relacionar isso como forma causal com
os atos de protestos e ataques acontecidos em Brasília, à vista da inexistência
de liame os fatos que pudessem configurar golpe ou mesmo tentativa dele.
Na verdade, não fosse o indiscutível espírito de
efervescente animosidade reinante entre o ex-presidente do país e integrantes da
corte maior do país, jamais se voltariam atenção e cuidados para assuntos que
nada configuram, de forma efetiva, espécie de crime, exatamente diante da
inexistência de materialidade do seu objeto, capaz de gerar lesão a absolutamente
nada, na precisa conceituação clássica de crime em que fique evidenciada a sua marca
indelével, nos termos jurídicos.
Segundo a definição de
dicionário: “Crime é uma infração de maior potencial ofensivo e um tipo de
espécie do gênero Infração penal, que é toda conduta que gera lesão penalmente
relevante a um bem jurídico tutelado pelo estado, que está previamente
tipificado como ilícita e que determine, expressamente, o conceito primário e
secundário do tipo penal.”.
Na realidade, sob o prisma não
somente do dicionário, mas especialmente do jurídico, crime é a ação de poder
ofensivo aos direitos constituídos, cuja incidência é evidenciada pela marca da
lesão, do dano que precisa ser reparado por meio de penalidade cabível, evidentemente
estando capitulado em lei, tendo por princípio efeito pedagógico de servir também
como exemplo à sociedade, para se evitar a sua reincidência.
No caso dos atos que estão
tentando imputar ao ex-presidente do país, nada existe, de forma ofensiva e
concreta, com capacidade para a caracterização de lesão a coisa alguma, uma vez
que não houve implementação de golpe nem alteração do Estado Democrático de
Direito, não cabendo sequer se falar em medida punitiva, salvo em termos persecutórios
de notória e cruel perseguição política.
Às vezes, em circunstâncias
que tais, fica em mente, evidentemente sem resposta, a fundamental indagação
sobre o que se passa em mente de quem tem ideia de golpe e não a executa,
quando o resultado disso pode ser tão prejudicial do que a própria medida, se
ela tivesse sido executada?
Em se tratando do
envolvimento de pessoa pública, que tem o dever da transparência e da prestação
de contas à sociedade sobre os seus atos, na vida pública, como dever
constitucional e legal, conviria que a verdade fosse mostrada publicamente, com
o devido esclarecimento sobre tudo circunstancialmente relacionado com as suspeitas
de golpe, com a citação da motivação dele e tudo que realmente aconteceu, finalmente,
para que não fiquem quaisquer dúvidas sobre a lisura do desempenho do homem
público.
Por fim, parece muito importante a transcrição do pensamento
do grande jurista brasileiro, Rui Barbosa, que escreveu: "A Justiça
sustenta numa das mãos a balança que pesa o Direito, e na outra, a espada de
que se serve para o defender. A espada sem a balança é a força brutal; a
balança sem a espada é a impotência do direito".
O sonho dos brasileiros, na atualidade, é
certamente o de que a Justiça do país possa respeitar os princípios jurídicos,
sob os auspícios do Direito que utiliza a balança para sopesar o equilíbrio na
busca da verdade e a espada, para a dosimetria da pena, mas somente se ela for
necessária.
Brasília,
em 15 de fevereiro de 2024
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