terça-feira, 25 de setembro de 2012

Absurda incoerência


A propósito da menção do nome da presidente da República pelo relator do mensalão, em julgamento no Supremo Tribunal Federal, para sustentar o seu voto, afirmando que ela teria dito, em depoimento prestado em juízo, em 2009, como testemunha de réu no processo, que ficou "surpresa" com a aprovação rápida, entre 2003 e 2004, de duas medidas provisórias que alteravam a legislação pertinente à área de energia, a reação palaciana foi imediata e carregada de palavras duras, incompatíveis com a liturgia do cargo presidencial. Segundo o relator, à época, ela "Disse que se surpreende, vendo com os olhos de hoje, a rapidez da aprovação desse projeto. Pode se assim avaliar a dimensão ...". Na nota, a presidente esclareceu que a sua surpresa se deu em virtude de acordo celebrado entre líderes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, constituída da base aliada e da oposição, para a aprovação das matérias. Ainda na sua versão, a reação se deu "por termos conseguido uma rápida aprovação por parte de todas as forças políticas que compreenderam a gravidade do tema". Mais adiante, ela disse que o país vinha de "apagão" no fornecimento de energia elétrica, obrigando o governo tucano a decidir pela implantação de plano de racionamento de luz. A nota reproduziu outro trecho do seu depoimento, onde consta: "Ou se reformava ou o setor quebrava. E quando se está em situações limites como esta, as coisas ficam muito urgentes e claras". Essas argumentações foram inventadas agora, num esforço hercúleo para justificar o injustificável, porque elas não constam do texto do depoimento original. Longe de tecer qualquer juízo de valor sobre o episódio, mas, para bom entendedor, a citação do depoimento de quem era ministra das Minas e Energia deixa antever o tamanho do incômodo causado a quem se julga acima de tudo e de todos, inclusive do Judiciário, que, no presente caso, apenas cumpre a sua competência constitucional de julgar os crimes contra o Estado e a sociedade. A nota evidencia absurda incoerência da presidente da República, tendo em vista que, se a matéria aprovada pelo Congresso era de relevância e essencial para a sociedade, por envolver a grave situação por que passava o setor elétrico, isso em absoluto poderia ensejar motivo para a surpresa da presidente na urgente deliberação dos projetos. Ao contrário da motivação da sua surpresa, seria muito estranho se não tivesse havido empenho dos parlamentares para a pronta aprovação dos projetos governamentais. A nota presidencial, além de bastante infeliz e contraditória, ainda mostra a indignação da presidente quando alguém menciona os seus peculiares equívocos. Teria sido mais elegante se ela tivesse tido a dignidade de ter ficado calada, para não atiçar e piorar ainda mais a questão, que depois disso ganhou maior amplitude na mídia e na opinião pública. A sociedade aspira por que as notas presidenciais, se necessárias, no caso do mensalão, sirvam apenas como instrumento capaz de contribuir, de forma isenta e imparcial, para ajudar no julgamento imbróglio. Acorda, Brasil!


ANTONIO ADALMIR FERNANDES


Brasília, em 25 de setembro de 2012

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