sábado, 1 de setembro de 2012

Justas ponderações

Por ocasião do voto proferido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, no processo do mensalão, uma afirmação sua teria causado constrangimento ao Poder Executivo, porque o ministro disse que um dispositivo - que mencionou no momento - do projeto de lei versando sobre nova regulação para repasses do “bônus-volume” - repasses que as agências recebem das empresas de comunicação como incentivo aos comerciais veiculados - foi alterado de propósito para beneficiar réus da ação em julgamento naquela Corte.  A demonstração do desconforto do Planalto com o entendimento esposado pelo magistrado ficou escancarada porque o Executivo, até o memento, estava alheio ao julgamento do mensalão, mas, de repente, sentiu-se atingido pela ilação acerca da mudança na legislação, tendo por finalidade salvar procedimentos considerados irregulares pela Procuradoria Geral da República. Segundo foi ventilado, o ministro não teria respeitado, à luz das normas da boa diplomacia, as fronteiras da autonomia dos poderes, uma vez que a lei teve a iniciativa do Executivo - autoria do atual ministro da Justiça - e a aprovação do Legislativo. Ocorre que o dispositivo original (Executivo) só amparava as situações futuras, mas a redação final (Congresso) mandou retroagir a sua abrangência e, dessa forma, passou a legalizar as situações pretéritas, inclusive já concluídas e encerradas, como aconteceu com algumas operações constantes do mensalão, fato esse que teria levado o Tribunal de Contas da União, de forma precipitada, a mudar seu entendimento sobre essa mesma questão. Em que pese terem sido proferidas palavras duras, mas juridicamente acertadas e apropriadas no contexto, capazes de gerar insatisfação e atrito entre os poderes da República, porque o ministro disse, em reforço à sua tese, que a “manobra era um atentado veemente, desabrido, escancarado” contra a Carta Magna, a considerar a forma de apreciação e aprovação do projeto de lei, não resta a menor dúvida de que a finalidade da lei era salvar questionamento daquela Procuradoria Geral sobre a falta de repasse ao Banco do Brasil, no valor de R$ 2,9 milhões de “bônus-volume”, que, por força de contrato, teria que ser devolvido pela empresa de publicidade, mas não o foi. Na forma da lei sancionada pelo ex-presidente da República, a prática questionada passa a ser considerada legal, porém jamais poderia retroagir para salvaguardar situações já encerradas, que tiveram por base legislação diferente e vigente à época das contratações. Afora os melindres ineptos do Planalto, as importantes colocações do ministro, se fossem oferecidas num país avançado, funcionariam não como críticas, mas como verdadeira ajuda jurídica ao aperfeiçoamento e à modernização do cipoal da legislação brasileira, que em muitos casos, como o aqui comentado, leis são aprovadas para adequação de situações específicas, destinadas a dar legitimidade a situações irregulares de interesse do governo e dos seus aliados, a exemplo dessa famigerada lei do “bônus-volume”, editada para, de forma injustificada, livrar corruptos do xadrez. A sociedade tem que se conscientizar com urgência sobre a necessidade da mudança do gerenciamento dos negócios do país, como forma de moralização e legalização dos atos do Estado. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 31de agosto de 2012

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