Por ocasião do voto
proferido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, no processo do mensalão,
uma afirmação sua teria causado constrangimento ao Poder Executivo, porque o
ministro disse que um dispositivo - que mencionou no momento - do projeto de
lei versando sobre nova regulação para repasses do “bônus-volume” - repasses que
as agências recebem das empresas de comunicação como incentivo aos comerciais
veiculados - foi alterado de propósito para beneficiar réus da ação em
julgamento naquela Corte. A demonstração
do desconforto do Planalto com o entendimento esposado pelo magistrado ficou
escancarada porque o Executivo, até o memento, estava alheio ao julgamento do
mensalão, mas, de repente, sentiu-se atingido pela ilação acerca da mudança na
legislação, tendo por finalidade salvar procedimentos considerados irregulares
pela Procuradoria Geral da República. Segundo foi ventilado, o ministro não teria
respeitado, à luz das normas da boa diplomacia, as fronteiras da autonomia dos
poderes, uma vez que a lei teve a iniciativa do Executivo - autoria do atual
ministro da Justiça - e a aprovação do Legislativo. Ocorre que o dispositivo
original (Executivo) só amparava as situações futuras, mas a redação final
(Congresso) mandou retroagir a sua abrangência e, dessa forma, passou a
legalizar as situações pretéritas, inclusive já concluídas e encerradas, como
aconteceu com algumas operações constantes do mensalão, fato esse que teria
levado o Tribunal de Contas da União, de forma precipitada, a mudar seu
entendimento sobre essa mesma questão. Em que pese terem sido proferidas
palavras duras, mas juridicamente acertadas e apropriadas no contexto, capazes
de gerar insatisfação e atrito entre os poderes da República, porque o ministro
disse, em reforço à sua tese, que a “manobra
era um atentado veemente, desabrido, escancarado” contra a Carta Magna, a
considerar a forma de apreciação e aprovação do projeto de lei, não resta a
menor dúvida de que a finalidade da lei era salvar questionamento daquela Procuradoria
Geral sobre a falta de repasse ao Banco do Brasil, no valor de R$ 2,9 milhões
de “bônus-volume”, que, por força de contrato, teria que ser devolvido pela
empresa de publicidade, mas não o foi. Na forma da lei sancionada pelo
ex-presidente da República, a prática questionada passa a ser considerada legal,
porém jamais poderia retroagir para salvaguardar situações já encerradas, que
tiveram por base legislação diferente e vigente à época das contratações. Afora
os melindres ineptos do Planalto, as importantes colocações do ministro, se
fossem oferecidas num país avançado, funcionariam não como críticas, mas como
verdadeira ajuda jurídica ao aperfeiçoamento e à modernização do cipoal da
legislação brasileira, que em muitos casos, como o aqui comentado, leis são
aprovadas para adequação de situações específicas, destinadas a dar
legitimidade a situações irregulares de interesse do governo e dos seus
aliados, a exemplo dessa famigerada lei do “bônus-volume”, editada para, de
forma injustificada, livrar corruptos do xadrez. A sociedade tem que se
conscientizar com urgência sobre a necessidade da mudança do gerenciamento dos
negócios do país, como forma de moralização e legalização dos atos do Estado.
Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 31de agosto de 2012
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