terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Cúmplices com a impunidade


Na terra onde os homens públicos que se envolvem em corrupção com dinheiro público são aplaudidos e saudados, nas ruas, praças e teatros públicos, por importantes células do partido governista, como verdadeiros “guerreiros do povo brasileiro” e aqueles que denunciam as irregularidades são tachados como oportunistas e golpistas, o governo e a sua base de sustentação no Congresso Nacional conseguem dar expressiva demonstração de efetiva desmoralização da política e da administração pública, no que tange ao controle e à fiscalização do sistema monetário nacional.
Embora o Ministério Público Federal e a Polícia Federal tenham se posicionado contrariamente à proposta de legalização de recursos depositados, de forma ilegal, em contas bancárias no exterior, por criminosos, normalmente com origem em esquemas fraudulentos, em visível caracterização de crime de lavagem de dinheiro.
Independentemente dos alertas sobre a gravidade pela regularização em causa, feitos, de forma competente, por autoridades e especialistas, os congressistas estão aprovando norma que representa verdadeira excrescência, em cristalina demonstração de que eles estão na contramão dos princípios da legalidade e da moralidade, por permitirem o retorno ao Brasil de recursos, em princípio, objeto de toda espécie de criminalidade, como fraude, desvio, roubo, trapaça, tráfico de drogas, corrupção e outros ilícitos financeiros, evidentemente com infringência aos princípios da legalidade e da dignidade que se exigem em países civilizados, decentes e sérios.
A Procuradoria Geral da República se posicionou acerca do projeto de legalização em apreço, dando ênfase ao fato de que seu teor tem como objetivo “prevê uma janela de impunidade que poderá ser uma verdadeira blindagem a favor dos criminosos e investigados nas grandes operações contra a corrupção em andamento no Brasil.”, a exemplo dos famigerados casos objeto das investigações da competentíssima Operação Lava-Jato.
Em que pesem os alertas sobre o risco da quebra dos princípios da legalidade e da punição, o Palácio do Planalto e o Congresso simplesmente o ignoraram e se uniram para a consecução de fins absolutamente inexplicáveis, inclusive promovendo a retirada do texto da exigência da indispensável comprovação da origem dos ativos, como condição essencial à repatriação dos recursos, ficando escancarada a entrada ao país de dinheiro com origem no submundo do crime, inclusive da corrupção, permitindo que corruptos e demais criminosos sejam premiados por atos ilícitos e ainda se beneficiem do produto do crime, de forma absolutamente limpa, porque legalizada pela vontade do governo de arrecadar para tapar o rombo que ele causou às contas públicas, em clara demonstração de cumplicidade com o submundo da criminalidade e da delinquência.
Na forma aprovada pelo Congresso, a legalização do dinheiro sujo precisa apenas, para se tornar limpo, que o seu proprietário pague ao Tesouro Nacional 30% do montante declarado.
Essa forma esdrúxula de “legalização” do dinheiro absolutamente irregular nada mais é do que tapa na cara das pessoas honradas, que até chegaram a se escandalizar diante da roubalheira na Petrobras e em diversas empresas públicas, que estão à mercê da bandidagem impune.
Trata-se de clara demonstração de liberalidade legal e acintosa contra os contribuintes honestos e honrados, que pagam com absoluta religiosidade os tributos impingidos, de forma dolorosa aos seus bolsos, por uma das maiores cargas tributárias do mundo, cuja contraprestação em serviços públicos é indiscutivelmente injusta e da pior qualidade da face da Terra.
Diante dos estragos causados ao patrimônio dos brasileiros, os pululantes casos de corrupção deveriam servir de exemplo positivo no sentido de mostrar para as autoridades públicas a premência da conscientização sobre a necessidade de o poder público ser ainda mais implacável contra a criminalidade, notadamente com relação aos fraudadores do sistema monetário nacional, nesse particular da remessa irregular de dinheiros para o exterior, tendo por origem procedimento indiscutivelmente ilícito.
Na verdade, verifica-se exatamente o contrário, em que prevalece a anseia pela arrecadação de receitas, para tapar rombo nas contas públicas, não importando sequer a origem dos recursos, fazendo com que os governantes e as autoridades públicas adiram facilmente às práticas nojentas, antéticas e igualmente ilícitas, por se tornarem, nesse caso específico, cúmplices com a bandidagem de colarinho branco, em evidente demonstração de aderência à irresponsabilidade que eles têm o dever constitucional e legal de evitá-la, afastando a catástrofe da impunidade, que tem sido modelo da degeneração da administração do país, conforme mostram os fatos do cotidiano.
Compete aos brasileiros se conscientizarem de que a perversidade e a injustiça do sistema tributário nacional precisam ser urgentemente reformuladas, para que somente seja exigido dos contribuintes o pagamento de tributos compatíveis com a sua capacidade contributiva, à medida que os governantes prestem serviços públicos de qualidade à população, em estrita obediência às priorizações das ações e políticas públicas, atentando-se ainda para moralização das medidas pertinentes à cobrança dos tributos, que não podem descambar para a cumplicidade com a prática de atos irregulares, sob a infundada justificativa da necessidade de se tapar os rombos das contas públicas. Acorda, Brasil!  
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 29 de dezembro de 2015

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