sábado, 26 de março de 2016

Situação insustentável


O grampo da conversa do ex-presidente da República com a sua sucessora deu a exata dimensão de como o poder é usado, nos bastidores, sob pilares de artificialismo que funcionam com muita desenvoltura em prol e proteção de interesses e conveniências pessoais, partidários, mostrando formas inescrupulosas e nada republicanas, embora tenha sido nesse sentido que a mandatária do país tentou justificar que a sua comunicação estivesse relacionada com assuntos republicanos, quando, na verdade, ela tratava de socorrer o seu padrinho político.
Não à toa que a petista se esforçou, de forma indignada e desesperada, para tentar desfazer a real finalidade de seu telefonema para o novel ministro da Casa Civil, mas o máximo que ela conseguiu foi colocar mais lenha na fogueira da desastrada interlocução presidencial, que teve o condão de levar para o seio do conturbado Palácio da Alvorada questões relacionadas com a Operação Lava-Jato, fazendo com que se complicasse, de forma irreversível, a já difícil situação política brasileira, que passou a ficar mais insustentável.
Não há dúvida de que a nomeação do ex-presidente para chefiar a Casa Civil, principalmente no pior momento que ele vem atravessando, ante a intensificação das investigações contra ele, tendo inclusive pedido de prisão sendo examinado na Justiça, representou muita falta de sensibilidade política da petista, diante da indiscutível tentativa de protegê-lo das garras implacáveis do juiz de Curitiba, que tem sido temido por suas posições inflexíveis contra a corrupção abrangidas nos esquemas que destruíram a Petrobras.
A presidente demonstrou completo despreparo de não perceber que seu ato representou, em essência, gigantesco erro diante da cristalina tentativa de transformá-lo em ministro com o objetivo de tirar a investigação sobre ele da primeira instância da Justiça, para dar-lhe foro privilegiado junto ao Supremo Tribunal Federal e isso ficou patente na conversa entre ambos.
Por seu turno, a fragilidade das justificativas oferecidas pela presidente somente reforçou a veracidade da finalidade objeto da ligação, que era exatamente blindar o ex-presidente, em caso da decretação da prisão dele, cuja artimanha ganhou relevância e insustentabilidade com a desesperada e até inexplicável pressa para a efetivação da nomeação e da posse dele como ministro, justamente para se evitar que ele fosse preso.
A conversa grampeada é assustadora quanto à sua finalidade, onde a presidente diz que encaminhará ao petista o "termo de posse" de ministro para que seja usado em caso de necessidade, dando clara interpretação que o diálogo tratava da tentativa de se evitar a efetivação da prisão do petista, mesmo que decretada.
Na verdade, a presidente cometeu grave irregularidade administrativa, por ter tentado socorrer o seu padrinho político, no momento em que ele se encontra no olho do furacão da Operação Lava-Jato, tendo que responder a investigações sobre possíveis apropriação indébita, quando a liturgia do cargo de Presidente da República jamais poderia sequer pensar em prestar proteção a quem quer que seja, diante dos princípios constitucionais da impessoalidade e da legalidade.
          Embora não fosse esse objetivo, há forte evidência que o episódio contribuiu para que a Operação Lava-Jato adentrasse no Palácio do Planalto de forma definitiva, ficando muito claro que a presidente não pode mais descartar a cola do ex-presidente sob a sua proteção, fato que foi transformado em gigantesco problema de difícil solução, quando se imaginava, sendo vozes palacianas, que “O objetivo inicial era de que ele ajudaria a barrar o processo de impeachment.”, mas não há a menor dúvida de que o tiro saiu pela culatra.
É induvidoso que a presidente do país deixou muito claro que ela quis interferir nos trabalhos da Operação Lava-Jato, tanto com relação ao caso da nomeação em comento como nas informações constantes da delação do senador ex-líder do governo.
O episódio em apreço demonstra, com muita clareza, que a presidente do país se encontra completamente atordoada, perdida e sem assessoramento adequado para evitar desastre administrativo dessa magnitude, que feriu gravemente a liturgia do cargo de presidente do país, com a tentativa de interferir diretamente nos trabalhos da Justiça, na forma como ela deixou transparecer no seu telefonema, cuja ato pode ter contribuído para apressar o processo da queda do governo, ante a gravidade de sua atitude antirrepublicana, em injustificável proteção a um amigo, fazendo uso da máquina pública. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 26 de março de 2016

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