terça-feira, 25 de outubro de 2016

Simples manipulação de leis?

Um juiz da 10ª Vara Federal de Brasília aceitou denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal e abriu ação penal contra o ex-presidente da República petista e outras dez pessoas, sob a acusação de envolvimento fraudulento em financiamento de recursos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Na aludida denúncia, o MPF afirma que o ex-presidente atuou junto ao BNDES "e outros órgãos de Brasília" para favorecer a construtora Odebrecht em empréstimos para obras de engenharia realizadas em Angola. Em retribuição, diz o órgão ministerial, que a empreiteira teria pago aos envolvidos valores que atingem o montante de R$ 30 milhões.
A denúncia elenca diversas mensagens do celular do dono da Exergia Brasil, trocadas com seguranças do ex-presidente e outras pessoas ligadas a ele, sempre se referindo ao "tio", e mencionando encontros e conselhos para alavancar os negócios.
Segundo o Ministério Público, o ex-presidente teria recebido vantagens indevidas enquanto ainda era presidente do país, para ele próprio, o sobrinho e um irmão, sendo que, para este, foram pagas despesas comprovadas com a juntada de boletos de mensalidades de planos de saúde e de aquisição de combustíveis.
O ex-presidente foi incurso nos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e tráfico de influência, à vista das práticas delituosas cuja autoria é atribuída a ele.
Na decisão, o juiz determina que "Citem-se os réus para a apresentação de resposta à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, oportunidade em que poderão arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas. Quanto ao rol de testemunhas a defesa deve qualificá-las por completo, declinar pormenorizadamente os respectivos endereços e demais dados para que as testemunhas possam ser facilmente localizadas".
Agora, o petista já responde à Justiça, como réu, a três ações penais, sendo uma envolvendo contratos do BNDES, outra sobre suposta tentativa de obstrução da Operação Lava-Jato e a terceira tem a acusação do recebimento de vantagens financeiras indevidas da OAS, como a reforma em um tríplex e o armazenamento do acervo pessoal, levado da Presidência da República, segundo o Tribunal de Contas da União.
Na decisão, o juiz afirmou que a peça acusatória evidencia “plausibilidade e verossimilhança das alegações. Essas considerações (…) levam-me a crer que se trata de denúncia plenamente apta, não se incorrendo em qualquer vício ou hipótese que leve à rejeição, até por descrever de modo claro e objetivo os fatos imputados aos denunciados, individualmente considerados, em organização criminosa, lavagem de capitais e corrupção”.
Consta do resultado das investigadores que foram encontraram “indícios de vantagens auferidas pelo ex-presidente e seus familiares em decorrência de supostos serviços prestados”. 
Nos levantamentos promovidos pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, foi constatado que o petista atuava como “verdadeiro lobista da construtora Odebrecht”, que o contratava, formalmente, para dar palestras em países da América Latina e da África, onde a empreiteira executava projetos bilionários financiados com recursos do BNDES.
As investigações apuraram que o político teria recebido o valor de R$ 7,6 milhões da Odebrecht, que foram repassados à sua empresa, a L.I.L.S., e em doações ao Instituto Lula.
Também foi apurado que o ex-presidente, utilizando a sua influência, encontrava-se com chefes de Estado e autoridades estrangeiras, para discutir e facilitar assuntos do interesse da citada construtora, que contratou a Exergia Brasil, empresa de um sobrinho da primeira mulher do político, para ajudar numa obra em Angola.
A citada empresa, mesmo sem experiência no ramo de engenharia, teria recebido o valor de R$ 7 milhões de reais da Odebrecht, sendo que parte desses recursos foi usada para pagar viagem a Cuba do filho mais velho do ex-presidente e despesas pessoais de um irmão do petista. Segundo os investigadores, a Exergia Brasil também financiou a campanha de amigo do ex-presidente, em São Bernardo do Campo, em 2012.
Consta dos autos, que, antes de assinar contratos milionários com a empreiteira, o dono da Exergia Brasil era dono de uma pequena vidraçaria, mas, em um passe de mágica, ele virou empreiteiro de sucesso, tendo prospectado negócios na América Central e na África, na esteira das viagens internacionais do petista.
A conclusão do juiz é no sentido de que os fatos objeto da denúncia indicam que há "as condutas tidas como enquadradas nos crimes de lavagem de dinheiro, atingem todos os acusados, e os de corrupção, de organização criminosa e corrupção parte dos réus, conforme a descrição feita na denúncia, tendo o MPF, com base nos documentos juntados decorrentes de quebras de sigilo e busca e apreensões, conseguido cindir no tempo as condutas, numa primeira fase entre 2008 e 2010, e numa segunda fase da atividade que se aponta como delituosa entre 2011 e 2015".
O Instituto Lula disse, em nota, que o ex-presidente é vítima do que foi denominado de “lawfare", que é “uma guerra travada por meio da manipulação das leis para atingir alguém que foi eleito como inimigo político" e que "Lula jamais interferiu na concessão de qualquer financiamento do BNDES. Como é público e notório, as decisões tomadas por aquele banco são colegiadas e baseadas no trabalho técnico de um corpo qualificado de funcionários".
Segundo os advogados, o político recebeu dinheiro da Odebrecht por duas palestras que “ele comprovadamente fez” e pelo mesmo preço que cobrou de 41 grupos empresariais. 
O juiz afirma, de forma taxativa, que a peça acusatória demonstrou “plausibilidade e verossimilhança das alegações”, ou seja, a denúncia é aceitável porque os fatos investigados estão em conformidade com as provas levantadas, não restando dúvida alguma quanto à materialidade da ocorrência os fatos elencados na denúncia tratada nos autos.
À luz da verdade, nenhum juiz, sob o prisma da sua responsabilidade funcional, teria a insensatez e a imaturidade de aceitar denúncia do Ministério Público e transformar alguém em réu em uma ação sem o devido cuidado e a indispensável comprovação objeto dos fatos apurados, quanto mais em se tratando que um dos envolvidos é detentor da relevante autoridade de ex-presidente da República, que é figura da maior respeitabilidade do país e do mundo, que tem o dever moral de dar exemplo de licitude, dignidade e moralidade na prática de seus atos como homem público.
Agora, parece de extrema fragilidade a argumentação da defesa, em contraposição à segura convicção do magistrado, de se alegar que há “uma guerra travada por meio da manipulação das leis para atingir alguém que foi eleito como inimigo político”. Ou seja, parece bastante pueril e da maior fragilidade, conquanto bastante grave, se afirmar que o juiz foi capaz de manipular leis para incriminar alguém que teria sido eleito inimigo político, de quem, do próprio juiz?
Convém que o ex-presidente, diante da gravidade dos fatos denunciados, tenha a precisa consciência de que suas alegações, com base em apenas verborragias e acusações estranhas aos resultados das apurações, podem ser incapazes de infirmar a consistência das afirmações descritas nos autos, que precisam ser refutadas com elementos que tenham a robusteza de força realmente probante, sob pena de não se conseguir convencer o magistrado de que ele teria se enganado redondamente ao interpretar os fatos com tanta convicção, a ponto de ter afirmado que a peça acusatória demonstra “plausibilidade e verossimilhança das alegações". Acorda, Brasil! 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 25 de outubro de 2016

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