quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Tropeço da democracia?


Durante o julgamento do processo de impeachment da então presidente da República, o então presidente do Supremo Tribunal Federal houve por bem defender e aceitar destaque apresentado pela bancada do PT, versando sobre pedido no sentido de que a votação do referido processo fosse dividida em duas partes, e não de maneira conjunta, na forma constitucional, fato que permitiu a manutenção dos direitos políticos da petista, em que pese o seu mandato ter sido cassado.
Agora, o ministro “fatiador”, em clara demonstração de inconformismo com o impeachment, disse que “Deu no que deu. Nesse impeachment a que todos assistiram e devem ter a sua opinião sobre ele. Mas encerra exatamente um ciclo, daqueles aos quais eu me referia, a cada 25, 30 anos no Brasil, nós temos um tropeço na nossa democracia. É lamentável. Quem sabe vocês, jovens, consigam mudar o rumo da história”.
O referido comentário sobre o impeachment foi proferido por ocasião de sua aula na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), onde o ministro leciona Teoria do Estado, quando ele criticou o modelo de presidencialismo de coalizão, que considerou ser fruto da Constituição Federal.
Sem perda de tempo, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do Supremo Tribunal Federal, em resposta ao comentário em comento, disse que o único tropeço no processo de impeachment da petista foi a realização da votação fatiada. O presidente da Justiça Eleitoral afirmou, in verbis: “Acho que o único tropeço que houve foi aquele do fatiamento, o DVS (destaque para votação em separado) da própria Constituição, no qual teve contribuição decisiva do presidente do Supremo”, ao analisar a conduta deste, na condução do processo de impeachment.
No início deste mês, em seguida à decisão do Senado pela cassação do mandato da petista, o presidente do TSE havia dito que a votação fatiada do processo de impeachment foi “no mínimo, bizarra” e não passaria “na prova dos 9 do jardim de infância do direito constitucional”, em clara crítica à atuação do então presidente do Supremo.
À toda evidência, a conduta do então presidente do Supremo teve enorme repercussão negativa não somente no âmbito das Cortes Superiores de Justiça, mas também, em especial, entre os juristas do país, que estranharam como ministro que deveria desempenhar sua missão constitucional de forma exemplar, como defensor dos princípios constitucionais, atuou em total condescendência com a adoção de medida que afronta mandamento pétreo da Carta Magna, eis que o dispositivo atropelado não dá margem de interpretação senão de que a decisão pelo impeachment implica, necessariamente, a perda dos direitos políticos da apenada.
No caso da presidente afastada, os fatos mostram com imensurável robusteza que ela não teria cometido somente o crime de responsabilidade, que resultou no seu impeachment, porque a má gestão dos recursos públicos, com os rombos das contas públicas extrapolou, de forma exagerada, todos os tropeços que seriam possíveis sob a incumbência um administrador público, à vista dos resultados maléficos dos indicadores político, social, econômico, financeiro, administrativo, entre outros pertinentes à missão presidencial, conforme evidenciam, em especial, a forte recessão econômica e o recorde do desemprego, cujas consequências se traduzem no desespero da população, que, em grande maioria, foi seduzida pela onda das promessas mentirosas e absurdas da candidata petista à reeleição, na última campanha eleitoral, quando ela fez promessas que foram imediatamente descumpridas, em seguida à sua reeleição.
          Não há dúvida de que os descomunais tropeços dos então presidentes da República e do Supremo foram extremamente prejudiciais, respectivamente, ao país, em razão da desastrada, incompetente e ineficiente administração dos interesses dos brasileiros, e ao ordenamento jurídico, ante a incompatibilidade da decisão adotada pelo fatiamento com o disposto no artigo 52 da Carta Magna.
Os brasileiros anseiam por que o Supremo Tribunal Federal seja capaz de repor o sentimento de justiça no exato lugar onde nunca deveria ter saído, reafirmando o entendimento segundo o qual a decisão de impeachment implica também a perda dos direitos políticos, com embargo da descabida medida magnânima adotada, no caso, por ter ficado a impressão do mero atendimento de conveniência absolutamente espúria, ante o indiscutível atropelamento de dispositivo constitucional que disciplina o procedimento pertinente, de modo que seja respeitado o primado aos princípios jurídicos. Acorda, Brasil! 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 05 de outubro de 2016

Nenhum comentário:

Postar um comentário