O
ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, que se foi com a queda de avião, vai
deixar lacuna impreenchível no mundo jurídico, contribuindo para diminuir a
qualidade do trabalho desempenhado por essa Corte, em razão, principalmente, da
destemida, segura e altiva postura de magistrado com suas peculiaridades de
discrição, competência e coragem.
Certa
feita, ele decidiu negar pedido formulado pelo político mais importante do país, com base
em argumentos da maior solidez e firmeza, ao declarar que o recurso apresentado
pelo ex-presidente é "mais uma das
diversas tentativas da defesa de embaraçar as apurações" da Operação
Lava-Jato.
O
ex-ministro decidiu rejeitar ação que questionava a atuação do juiz de Curitiba,
responsável pela citada operação, que pedia que três inquéritos que estavam sob
a análise daquele magistrado fossem suspensos e enviados à Excelsa Corte.
Na
decisão, o ex-ministro indica outra ação interposta pela defesa contra a
atuação do juiz de Curitiba, sob o argumento de que ele teria mantido sob seu
controle interceptações telefônicas de autoridades com foro privilegiado, tendo
o ministro dito que se trata de "insistência
do reclamante”, em dar "contornos
de ilegalidade, como se isso fosse a regra" aos atos do juiz de
primeira instância.
Na
ocasião, o ex-ministro frisou que o Supremo tem "amplo conhecimento" sobre os processos que tramitam na Lava-Jato
e as fraudes na Petrobras, tendo acrescentado que, "Apesar de esses argumentos serem objeto de análise naqueles autos, tal
quadro revela a insistência do reclamante em dar aos procedimentos
investigatórios contornos de ilegalidade, como se isso fosse a regra. Nesse
contexto, é importante destacar que esta Corte possui amplo conhecimento dos
processos (inquéritos e ações penais) que
buscam investigar supostos crimes praticados no âmbito da Petrobras, com seus
contornos e suas limitações, de modo que os argumentos agora trazidos nesta
reclamação constituem mais uma das diversas tentativas da defesa de embaraçar
as apurações".
A
defesa rebateu o posicionamento do ex-ministro, afirmando que o próprio Supremo,
em outras oportunidades, já havia reconhecido erros na atuação da primeira
instância e que todo cidadão tem o direito de entrar com recursos na Justiça
para contestar "procedimentos
investigatórios que ostentam clara perseguição pessoal e política. O STF, por meio de
decisões do Ministro Teori Zavascki, já reconheceu ilegalidades praticadas pelo
juiz Sergio Moro na condução da Operação Lava Jato, inclusive em relação ao
ex-Presidente Lula. Isso ocorreu, por exemplo, no tocante à autorização dada
por Moro para a divulgação de conversas interceptadas envolvendo Lula e, ainda,
no tocante ao monitoramento dos advogados do ex-presidente".
Posteriormente,
a defesa criticou o comentário feito pelo relator da Lava-Jato no despacho, ao
afirmar que é "profundamente
preocupante" que o exercício do direito de defesa possa ser
interpretado pela Suprema Corte como "entrave"
às investigações.
A
defesa do político foi bastante enfática, ao afirmar que "É profundamente preocupante que o exercício
do direito constitucional de defesa, com combatividade e determinação, possa
ser encarado na mais alta Corte de Justiça do País como fator de entrave às
investigações ou ao processo. A Constituição quer defesa efetiva e ampla e não
meramente formal ou retórica. Negar tal garantia representa inominável agressão
ao direito de defesa".
A
defesa insiste com reclamação junto ao Supremo, alegando que o ex-presidente é
alvo de apurações sobre os mesmos fatos no Supremo e na Lava-Jato, uma vez que
ele é tratado, no Paraná, como "arquiteto"
do esquema criminoso que atuava na Petrobras, enquanto consta no inquérito em
tramitação no Supremo que seja feita investigação para se saber se existiu
organização criminosa na Petrobras, tendo a defesa afirmado que o procurador-geral
disse que o esquema "jamais poderia
ter funcionado por tantos anos e de uma forma tão ampla e agressiva no âmbito
do governo federal sem que o ex-presidente Lula dela participasse".
Os
advogados de defesa negaram as suspeitas do envolvimento do ex-presidente e asseguraram
que as apurações tratam de "fatos
idênticos", sendo proibido pelo princípio do "bis in idem", que garante que ninguém
pode ser duplamente punido ou processado com base no mesmo ato.
Na
avaliação do ex-ministro, não assiste razão à defesa, porque o próprio juiz da
Lava-Jato havia dito que não houve ultrapassagem dos limites de sua atuação,
haja vista que ainda não há em nenhuma das apurações a delimitação dos fatos, o
que só ocorre quando há denúncia oferecida, fato que ainda não teria acontecido.
O
ex-ministro sublinhou que "Não
prospera a insurgência. Na decisão ora questionada, o magistrado de primeiro
grau não admitiu as exceções de incompetência opostas pelo reclamante, sob o
fundamento de que, 'antes do oferecimento da denúncia, não se tem o objeto da
imputação que é exatamente o que definirá a competência do juízo'. (...) Como
se vê, aquela autoridade não emitiu qualquer juízo acerca da tipificação penal
das condutas que seguem em investigação nos procedimentos objeto desta
reclamação, não sendo suficiente, para justificar a viabilidade da ação
constitucional".
Em
conclusão, o ex-ministro disse que, "De
fato, em análise do ato reclamado, conclui-se que, apesar de os fatos
investigados no Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Inq 3.989, possuírem
correlação com aqueles que são objeto de investigação perante a 13ª Vara
Federal de Curitiba, não houve demonstração da usurpação, pela autoridade
reclamada, da competência desta Corte, tendo em vista que agiu conforme
expressamente autorizado".
Posteriormente,
o ex-ministro achou por bem excluir dos autos a sua declaração de que o
ex-presidente insistia com recursos para travar o desempenho da Lava-Jato.
O
certo é que, à luz dos fatos, dificilmente outro magistrado possa demonstrar
tanto pulso forte para rebater as insistentes argumentações apresentadas pela
defesa do político-mor, que luta com unhas e dentes para se desvencilhar das
“garras” do magistrado da Lava-Jato, que tem sido preciso e firme nos golpes
desferidos contra os envolvidos no esquema criminoso que fraudou contratos da
Petrobras, para desviar fortuna de seus cofres.
As
manifestações do ex-ministro não poderiam ter sido mais claras e objetivas,
mostrando a insistência com que o ex-presidente tenta, de forma reiterada,
encerrar as apurações ou retirá-las da jurisdição de Curitiba, sem que elas
tenham sido concluídas, à vista das argumentações jurídicas do magistrado, que se
insurgia contra a onipotência explícita de quem não aceita ter seus atos
investigados, em que pesem as inúmeras denúncias de irregularidades, que precisam
ser devidamente esclarecidas, como primada da indispensável busca da verdade
real, em harmonia com os salutares princípios da transparência e da legalidade,
à luz dos melhores conceitos de civilidade e democracia. Acorda, Brasil!
ANTONIO
ADALMIR FERNANDES
Brasília,
em 29 de janeiro de 2017
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