terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Página deprimente

Em clara demonstração de extrema irresponsabilidade, deputados federais tupiniquins decidiram cometer uma das maiores atrocidades aos princípios democráticos, deixando o mundo civilizado bestificado com estrondosa ousadia perpetrada na “Casa do Povo”, quando eles tiveram a insensibilidade de reverter em causa própria o sentido da proposição popular anticorrupção, para se transformar em medida visivelmente pró-corrupção, em benefício daqueles que praticaram delinquência contra a administração pública, mais precisamente abuso com dinheiro público.
Naquela ocasião, a Câmara precisava aprovar as dez medidas oferecidas pelo Ministério Público, com o respaldo de mais de dois milhões de brasileiros, as quais visavam ao atendimento dos anseios de moralização do povo, mas os parlamentares preferiram ignorá-las, tendo aprovado, em suas substituição, normas que proíbem, na avaliação deles, abuso de autoridade, compreendendo o enquadramento de juízes, procuradores e policiais que têm a incumbência de investigar fatos irregulares, de modo que eles possam ser punidos penal e pecuniariamente, em decorrência de seus trabalhos institucionais, caso a interpretação sobre as denúncias não esteja em consonância com os interesses e as conveniências dos investigados.
A referida proposta deixa multo claro o pensamento dos parlamentares sobre o que seja moralização para eles, por praticamente impedirem que os crimes de corrupção possam ser investigados, e ainda mandam duro recado ao povo, com a manifestação inequívoca de que eles não são mais representantes daqueles que os elegeram, passando a defender exclusivamente os próprios interesses, conforme mostra o resultado da votação.
Não resta conclusão diferente, depois da absurda votação na calada da madrugada, com o propósito de desfigurar e sepultar o verdadeiro objetivo do projeto conhecido e já consagrado como anticorrupção, que foi considerado como iniciativa popular, por ter sido concebida e apoiada por mais de dois milhões de brasileiros.
Como não poderia ser diferente, muitos brasileiros demonstraram seu repúdio por meio de panelaços, protestando com gritaria contra a traição, diante da estupefação causado pela petulância e estupidez de deputados que pegaram carona numa proposta seríssima e a converteram, sem a menor pudor, em um arremedo de revanche contra as instituições sérias e competentes, incumbidas das investigações sobre as denúncias de casos irregulares, naturalmente com grande incidência entre aqueles que contribuíram para a provação desse monstrinho jurídico.
O que seriam dez medidas contra a corrupção, restaram no projeto apenas quatro, sendo que duas parcialmente e as outras não eram tão importantes quanto às que foram simplesmente eliminadas, ou seja, a essência das propostas foi jogada na lixeira, a exemplo daquelas que tratavam do ataque letal ao enriquecimento ilícito de servidores públicos e condenavam com dureza os corruptos impunes.
Não obstante, eles cuidaram, com o maior “carinho” “zelo”, de colocar cabresto nas ações de policiais, promotores e juízes, ao tipificarem como crime o que consideram abuso de autoridade, tendo por finalidade pôr limites às investigações sobre denúncias irregularidades praticadas com dinheiro público.
Na essência das novas medidas, há a tentativa de se reduzir a autonomia dos guardiões da Constituição, ao retirar dela a livre autonomia de apuração dos casos suspeitos de irregularidades.
Na prática, as propostas oferecidas pela população foram simplesmente ignoradas, mas as normas aprovadas têm o preciso escopo de contribuir para dar amparo à blindagem às ações do Ministério Público e dos magistrados, em escandaloso afronto ao sentido da tão perseguida moralização do país.
          O resultado dessa famigerada votação deixa muito claro que os parlamentares que aprovaram essa deformidade jurídica apenas enxergam os eleitores apenas como massa de manobra para o atendimento de suas inescrupulosas ambições, justificando, com isso, a prepotência com que eles impõem suas vontades, sem o menor pudor.
A avaliação que se faz desse triste episódio é que os deputados extrapolaram o senso de sensatez e os salutares princípios de dignidade e ainda pisotearam sobre o pouco do que restava de decência e reputação, além de deixar patente o espírito de pura vingança contra os agentes do Estado, que têm a incumbência de perseguir a verdade, em especial aqueles que são responsáveis pelo trabalho exitoso da Operação Lava-Jato.
O certo é que os parlamentares não tiveram o menor receio de armar contra aqueles que trabalham contra criminosos de colarinho branco, os sanguessugas dos cofres públicos, que estão correndo a toda velocidade para se livrar da prisão e da obrigação de reparar as suas falcatruas e maledicências conta o erário.
A intenção dos deputados não poderia ser tão cristalina, quando tramaram perfeito plano ardiloso para se livrar do encalço das investigações, em forma de retaliação ao competente e eficiente trabalho da força-tarefa da Operação Lava-Jato, que vem amedrontando muitos saqueadores dos cofres públicos, que se encontram encastelados no poder, lamentavelmente com o respaldo do voto popular.
Dizem até que, no calor das discussões e das votações, ouviram-se no plenário gargalhadas e galhofas naturalmente em regozijo contra aqueles poucos parlamentares que, ao meio de ambiente hostil, ainda mostravam brio em protestarem contar as abusivas propostas revanchistas e absurdas.
          Houve quem dissesse exatamente que “Não estou preocupado se vão me esculhambar” e assim, nesse clima de rebeldia, foi escrita uma página deprimente contra a verdadeira democracia tupiniquim, em indiscutível demonstração de desprezo às recentes reafirmações de repúdio da opinião pública às práticas nada republicanas encampadas pelo retrógrado e obsoleto Parlamento.
Os brasileiros precisam se conscientizar, com urgência, sobre a exaustão do limite da paciência da sociedade de aturar a falta de sensatez e de responsabilidade de congressistas, que tudo fazem para testar até onde a pressão social se sustenta sem explodir, não imaginando eles que já é absolutamente inaceitável, na atualidade, a maneira ultrapassada das práticas políticas de compadrio, corporativismo e fisiologismo, centralizadas no exclusivo atendimento de seus interesses e suas conveniências políticos, que precisam ser mudadas urgentemente, em benefício das causas nacionais e dos brasileiros. Acorda, Brasil.
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 17 de janeiro de 2017

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