quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Recriminável "jeitinho brasileiro"


As eleições de 2018 terão quase 350 chapas na disputa pelo Senado Federal, sendo que, entre elas, merecem destaque os casos em que parentes próximos ocupam o mesmo palanque para alcançar lugar àquela Casa.
Foi constatado que há pai ou filho e vice-versa como cabeça de chapa, ou ainda pai ou filho na suplência, como também marido e mulher na mesma composição, incluídos irmãos juntos na mesma disputa, tudo isso na corrida eleitoral ao Senado, que, sem a menor dúvida, trata-se de cargo da menina dos olhos de políticos menos inescrupulosos e aproveitadores, diante das prerrogativas, facilidades e benesses generosamente disponibilizadas no exercício do cargo de que se trata, pelos bestas dos brasileiros, porque o elegem e têm o ônus da sua manutenção.
Normalmente, os principais critérios para a definição dos nomes dos suplentes são os laços de parentesco ou de amizade, principalmente, neste caso, quando o amigo tem potenciais condições econômico-financeiras para financiar a campanha eleitoral do titular, que entra na campanha com o prestígio político.
Em se tratando de suplente do mesmo partido do titular, isso contribui para manter a influência parlamentar do partido, em caso de afastamento temporário ou definitivo.
Em que pese essa forma esdrúxula de ocupação de cargo público eletivo esteja contemplada na Lei Maior do país, as próximas eleições terão sete chapas constituídas por, ao menos, dois parentes bem próximos, mesmo na evidência de que esse procedimento não condiz exatamente com os princípios de seriedade, moralidade e eficiência próprios da democracia moderna, por ficarem patenteadas as gigantescas questões quanto à real capacidade política dos suplentes e a proximidade de parentesco que não condiz nem pouco com o sentimento de bons propósitos, ficando explícito o sentido de se levar vantagem em tudo, próprio do escrachado e vergonhoso “jeitinho-brasileiro”.
O que se espera dos partidos, por ser mais do que natural, que os suplentes sejam políticos do mesmo nível do titular, com potenciais histórico, experiência e capacidade políticos, e não apenas pessoas que tenham afinidades de parentesco ou amizade com o cabeça da chapa, porque, à toda evidência, trata-se de indiscutível demonstração de falta de legitimidade, por inevitável denúncia sobre censurável defesa  de interesses pessoais, mesmo que a medida esteja prevista na legislação de regência, porque isso se caracteriza sim aproveitamento espúrio da situação, que precisa merecer o repúdio do povo.
Importa ser ressaltado que, na atual legislatura, 41 suplentes de senadores assumiram a titularidade do cargo, em algum momento, e isso revela que mais da metade dos senadores se afastaram por algum motivo previsto em lei, evidentemente propiciando que os suplentes pudessem se beneficiar das prerrogativas próprias do titular.
Sabe-se que cada chapa ao Senado é composta por 3 nomes, sendo o titular, os primeiro e segundo suplentes e, nas próximas eleições, serão eleitos dois senadores em cada estado e no Distrito Federal, na forma prevista na Carta Magna.
Impende frisar, com vistas a bem informar ao eleitor, que cada senador faz jus, evidentemente somente o titular, às seguintes prerrogativas: remuneração de R$ 33.763,00; apartamento mobiliado ou auxílio moradia de R$ 5.500,00; automóvel, gasolina e motorista; pasmem, a média de 39  servidores, como assessores de livre nomeação; reembolso mensal, no valor de R$ 44.276,00, para aluguel de veículos, táxis, aeronaves etc., alimentação, passagem aérea, contratação de empresa para divulgação de atividades parlamentares, serviços e segurança privada etc.; passagens internacionais; passaporte diplomático, inclusive para familiares; plano de saúde, inclusive familiares; gastos ilimitados com celulares e R$ 500.00 para telefones fixos; ajuda de custo de R$ 33.763,00, no início e no fim do mandato; uso da gráfica do Senado, até o valor de R$ 8.500,00, além da assinatura de duas revistas e quatro jornais.
Não se pode conceber, na atualidade, que, em pleno século XXI, ainda haja situações absurdas e contraditórias como essa de suplência senatorial, notadamente com indiscutível histórico para se possibilitar aproveitamento da situação pelas partes envolvidas e, por pior, sem a mínima causa a justificar que essa estapafúrdia suplência seja constituída tão somente pela vontade generosa do titular da chapa para senador, visto que o suplente ou substituto de senador não recebe nem mesmo o seu voto.
A deformada figura política de suplente precisa ser extinta, com a máxima urgência, máxime porque esse cargo não condiz com a autenticidade da representatividade política, pela notória ausência de voto, que é a essência da legitimidade da delegação política emanada pelo povo.
Nesse caso, o verdadeiro suplente do senador, por respeito ao princípio da legitimidade, passa ser a constitucionalmente atribuída ao candidato mais votado no mesmo pleito eleitoral, na sequência do titular, cujo direito de substituição se legitima por força do voto, nos casos de vacância previstos em lei, como forma de harmonização desse instituto com os autênticos princípios democráticos.  
Em razão de a sistemática atual expor ao ridículo a própria instituição Senado, diante da sua nobre relevância no contexto da República, convém se primar, no mínimo, para que a ascensão ao cargo de senador tenha por essência a legitimidade, que se consubstancia por meio do voto dado a candidato conhecido e em condições comprovadas de capacidade política à altura do exercício do cargo de senador, com embargo da presença de ilustres desconhecidos, meros milionários financiadores da campanha eleitoral ou parentes com íntima relação com o titular, sem a indispensável qualificação para ocupar cargo de tamanha relevância no contexto senatorial republicano.
É preciso sublinhar que, na figura do suplente de senador, ficam evidenciadas cristalina anomalia inominável e flagrante afronta à vontade livre e soberana do eleitor, além da transparência do injustificável desprezo àqueloutro candidato que disputou o mesmo cargo e se habilitou na sequência daquele, na melhor forma política, porque obteve votos nas urnas para o preenchimento do cargo senatorial, no caso de vacância.
Ou seja, na ordem decrescente da mesma votação ao mesmo cargo, é preciso que se reconheça, por legitimidade, o direito à nomeação do substituído de senador que se afastar do cargo, ante a legitimidade política alcançada no mesmo pleito, mediante o sufrágio universal, acabando em definitivo com esse maquiavélico jeitinho político-tupiniquim, que, possivelmente, só ainda deve existir no Brasil, infelizmente.
No atual momento, em que o país vem se arrastando perigosamente por caminhos de crises, com destaque para a política, é inevitável que não se pense em reforma política, quanto mais diante de caso chocante e inadmissível como esse do suplente de senador, que contradiz, na origem, com os salutares princípios democrático e de interesse público, caso em que a modernidade política clama por sua eliminação da vida pública.
Por não se coadunar com o genuíno sentimento de representação política emanada pela vontade do povo, a figura ilegítima e estapafúrdia do suplente de senador, quanto mais em duplicidade, precisa ser extinta o quanto antes do contexto político brasileiro, à vista de que o seu formato não atende, por minimamente que seja, ao verdadeiro sentido de escolha daquele que tem a preferência do eleitor, quando, em muitos casos, o contemplado (não o eleito) não tem as mínimas qualificações para o exercício do relevante cargo de senador e muito menos em termos de representatividade política, exatamente por não ter sido votado, mas sim catapultado ao cargo por obra e graça de indicação normalmente espúria, como a que envolve, principalmente parentescos consanguíneos. Acorda, Brasil!
Brasília, em 6 de agosto de 2018

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