quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Sociedade doente e odienta?


Um senador pelo MDB de Alagoas saiu em defesa do médium de Abadiânia (GO), logo depois que ele foi alvo de enxurrada de denúncias de assédio sexual contra mulheres.
Em um primeiro momento, foram somente 10 casos de denúncias, que se tornaram conhecidas por meio de um programa de televisão, mas, como diz o velho ditado, onde passa um boi, sempre passa uma boiada, e foi exatamente o que terminou acontecendo, quando as denúncias, agora já ultrapassam de 500 e muitas das vítimas já confirmara em depoimentos à Polícia Civil e ao Ministério Público os maus-tratos do médium.
Para o político alagoano, na sua ânsia de defesa, o médium de Goiás "Não é o maior problema do Brasil. Não é um Roger Abdelmassih (referência ao médico paulista abusador de mulheres à procura de se engravidar) qualquer, e deve, até pelo menos o trânsito em julgado, continuar curando a sociedade, que parece mais doente e odienta".
O senador das Alagoas também afirma que o médium goiano é um "patrimônio nosso, da espiritualidade, da cura e da crença", evidentemente não enxergando as máculas tão sublinhados nos seus atos de sublime abusador de mulheres.
O senador alagoano disse que fala com a autoridade e a responsabilidade de quem fez a Lei Maria da Penha, que cominou com a figura do feminicídio na legislação e os avanços contra a violência, a pedofilia e todos os crimes do gênero.
Simplesmente, causa perplexidade à sociedade a insensata mentalidade do senador alagoano, em achar, em primeiro plano, que a população, e não o médium, é mais doente e odienta, somente porque mostrou abominação às práticas desumanas de violência contra algumas de suas pacientes, no tratamento espiritual, como se o continuado abuso sexual fosse permitido em nome da cura da sociedade, como forma de recompensa pelo trabalho operado por meio da ajuda espiritual, onde ele, pelo que faz, merece ser perdoado e compreendido.
Nem se pode dizer que esse político é insensível ao drama da sociedade, por dá a entender que o médium pode continuar a cometer barbaridades em nome do trabalho operado por ele, por via das entidades espirituais incorporadas nele, ou seja, no entendimento do político, o médium não merece castigo por seus crimes, em razão de ser atribuído a ele a cura de pessoas, quando uma coisa não tem nada a ver com a outra, mas isso não foi levado na devida consideração pelo médium.
Diante da altíssima “credibilidade” do senador alagoano, demonstrada na vida pública, com o devido e arraigado “zelo” aos princípios do “decoro” e da “moralidade”, conforme atestam para mais de 15 processos de investigações e denúncias, em tramitação no Supremo Tribunal Federal, pode-se imaginar que, além de o médium ser homem de "deus", ele é também homem santo e honrado, nas palavras do citado político, nada republicano, a ponto de ter a dignidade enxovalhada por apenas mais de cinco centenas de mulheres, que devem ter, no que se pode intuir sobre o pensamento pueril do político,  aproveitado a fragilidade do anjinho e cometido abusos contra ele, mas, para não serem castigadas pelas entidades do além, elas possivelmente estão inventando essa terrível história de que o médio é que teria sido capaz de molestá-las.
Numa coisa, o senador alagoano tem razão, ao afirmar que o médium não é o médico paulista, citado acima, porque este teve monstruosos 181 casos confirmados de estupros atribuídos a ele, enquanto o abusador de Abadiânia, por enquanto, já contabiliza mais de 500 denúncias, que ainda podem crescer, e essa diferença mostra a enorme diferença entre um doente sexual do outro, mas a deformidade de ambos se assemelha em crueldade contra as suas vítimas, em termos de irracionalidade e monstruosidade, que, infelizmente, ainda tem gente que o defende, porque doente é a sociedade, que também é odiosa, possivelmente por repudiar os procedimentos deformados e abomináveis, tidos por alguns como normais.
É visível a pobreza moral do Brasil, onde ainda tem político desse quilate como lídimo representante do povo, o qual nem se toca em  responder a montanha de acusações sobre suspeitas de irregularidade com recursos públicos, cujas ações acerca de suspeitas sobre a prática de atos nada republicanos, mais precisamente por corrupção na vida pública, jamais aconselhariam que ele pudesse se manter em atividade pública, exatamente diante indiscutível incompatibilidade entre os fatos denunciados à Justiça e os sentimentos de moralidade e decoro ínsitos do exercício de cargos públicos eletivos.
Com tanta evidência como essa, nos países sérios, civilizados e evoluídos, em termos políticos e democráticos, nenhum homem público na situação do senador alagoano se sustentaria na vida pública, justamente porque, nessas nações, há o devido respeito aos princípios republicano e democrático da ética, do decoro, da moralidade, da dignidade no exercício de cargos públicos eletivos.
Nesse contexto em que político sem condições morais para opinar, por que sem a menor credibilidade, sobre questão da incumbência da Justiça, suscita-se a ideia necessária, urgente e prudencial da aprovação de norma jurídica prevendo que o homem público, com denúncia aceita pela Justiça, fica automaticamente inelegível e, estando no exercício de cargo público eletivo, é obrigado a se afastar dele enquanto seu caso não for solucionado, em termos da comprovação da sua inocência, com a ação transitada em julgado.
É evidente que o político alagoano, por seu histórico negativo com ligação a processos em tramitação na Justiça, não tem a mínima credibilidade para se manifestar em defesa de quem está completamente complicado, em termos morais, que até já se encontra preso, por força exatamente da gravidade das denúncias sobre casos terrivelmente deprimentes de abusos sexuais contra mulheres, em ambiente de trabalho espiritual e em nome justamente da cura e da assepsia das impurezas espirituais, porque as suas características, em termos de moralidade, não ajudam muito ao médium acusado de incontáveis casos delituosos contra suas pacientes, que foram molestadas de forma cruel e desumana, salvo provas em contrário, sendo que cura ou outra forma de trabalho espiritual não tem o condão de justificar tamanhas irracionalidade e debilidade mental.
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 19 de dezembro de 2018

Nenhum comentário:

Postar um comentário