sábado, 20 de julho de 2019

A tristeza da fome


O presidente da República afirmou que é "grande mentira e um discurso populista que pessoas passem fome no Brasil”, porque, segundo ele, “não há nas ruas do país pessoas com físico esquelético".
Ele disse que “Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora passar fome, não. Você não vê gente pobre pelas ruas com físico esquelético como a gente vê em alguns outros países por aí pelo mundo".
O presidente disse que "É um discurso populista (falar de fome no Brasil), tentando ganhar simpatia popular, nada mais além disso. O que nós temos que fazer, nós, Poder Executivo e Legislativo, em grande parte um depende do outro, é facilitar a vida do empreendedor, de quem quer produzir".
O presidente ressaltou ainda que o solo brasileiro é "rico para praticamente qualquer plantio, mas que as autoridades políticas não devem atrapalhar o nosso povo a crescer.”.
          O presidente disse que "É só as autoridades políticas, nós do Legislativo e do Executivo, não atrapalharem o nosso povo, e essas franjas de miséria por si só acabam no Brasil, porque nosso solo é muito rico para tudo o que você possa imaginar".
Naturalmente que alertado por quem conhece o assunto e se encontra atualizado com as informações, o presidente cuidou de se retratar, ao afirmar que "O brasileiro come mal. Alguns passam fome. Agora, é inaceitável em um tão rico país como o nosso, com terras agricultáveis, água em abundância. Até o semiárido nordestino tem pluviométrico maior que Israel".
Questionado por jornalistas se estava recuando da declaração, o presidente se irritou e ameaçou encerrar a entrevista, tendo declarado: "Pelo amor de Deus, se for para entrar em detalhes, em filigrana, eu vou embora".
Ele ainda aproveitou para brincar, dizendo: "Não estou vendo nenhum magro aqui. Temos um problema alimentar no Brasil. Temos, não é culpa minha, vem de trás, estou tentando resolver. O que tira o homem e a mulher da miséria é o conhecimento, não são bolsas e programas assistencialistas. Temos que lutar nesse sentido.".
Não obstante, números realistas e cruciais, embora levantados ainda em 2017, pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), apontam que, no Brasil, ao menos 2,5% da população ainda se encontra em grave situação alimentar.
Os dados, divulgados no final do ano passado, apontam que, em 2017, ano utilizado como base para o relatório, mais de 5,2 milhões de brasileiros passaram um dia inteiro ou mais dias sem consumir alimentos ao longo do ano.
Por sua vez, dados oficiais, fornecidos pelo Ministério da Saúde brasileiro, sobre segurança alimentar no país, contradizem as declarações do presidente da República, porque 5.653 pessoas morreram de desnutrição no Brasil, em 2017 — último dado disponível — e isso equivale à média de mais de 15 pessoas morrendo de fome, por dia.
Uma professora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, disse que “A desnutrição é a expressão corporal da fome. A morte por desnutrição é um extremo, mas a gente tem estágios de desnutrição e estágios de insegurança alimentar nutricional. A gente não quer só que as pessoas não morram de fome, quer que as pessoas não vivam com fome.”.
Em 2018, o Ministério da Cidadania fez o Mapeamento da Insegurança Alimentar e Nutricional (Mapa InSAN), cujos dados mostram que, em 2016, foram coletados dados sobre a fome, tendo sido constatadas que 427.551 crianças, com menos de cinco anos, atendidas pelo programa Bolsa Família, tinham algum grau de desnutrição, que é medido de acordo com o déficit de peso por idade ou de altura, por idade.
Foram classificadas com desnutrição muito alta 44.462 crianças e com desnutrição alta 102.947, entre as que são atendidas pelo Bolsa Família. 
A desnutrição em crianças, grupo mais vulnerável, é o indicador recomendado pela FAO (órgão da ONU para alimentação) para medir a fome, segundo a professora.
Conforme a última pesquisa realizada pelo IBGE, em 2013, sobre o tema alimentação, 7,2 milhões de pessoas viviam em situação de insegurança alimentar grave, no país, que é quando a pessoa passa o dia inteiro sem comer por falta de alimentos e há redução quantitativa de alimentos entre crianças.
Outras 10,3 milhões de pessoas entraram na categoria de insegurança alimentar moderada.
Entre as crianças com menos de cinco anos, 641 mil passavam por insegurança alimentar grave, e 864 mil por insegurança alimentar moderada.
Diante de avaliações infundadas e conclusões distanciadas da realidade, conforme as palavras do presidente do país e a realidade do quadro alimentar, não há a menor dúvida de que já passou do tempo de o governo brasileiro se fingir de morto a imprensa, por longo período, e somente se pronunciar à opinião pública, o estritamente necessário, somente e terminantemente para cumprimentar as pessoas, deixando que as informações de governo fiquem a cargo dos órgãos incumbidos das respectivas áreas, de modo que ele fique a salvo, em termos de críticas da opinião pública, que vem explorando o máximo a falta de atualização dele sobre informações pertinente ao seu governo.
Aliás, de modo geral, à vista de suas continuadas declarações dissonantes com a realidade, cujos reflexos são prejudiciais à sua imagem como a principal autoridade da República, ele faria bem danado ao Brasil se conseguisse se policiar para falar o estritamente necessário, abstendo-se ao máximo quando não tivesse certeza sobre a matéria enfocada pelos jornalistas, o que se evitaria interpretações equivocadas, que são normalmente objeto de posteriores esclarecimentos para o restabelecimento da verdade.
Cabe ao presidente do país ser o mais reservado possível, segundo a liturgia do relevante cargo que ocupa, tendo o dever de somente falar em eventos oficiais e se o cerimonial permitir que ele discurse ou faça pronunciamento protocolar, não precisando dizer absolutamente mais nada, em obséquio à sua notória falta de conhecimentos gerais, denunciada neste caso do fome e em outras situações em que o silêncio dele teria contribuído enormemente para se evitar confundir as verdadeiras informações oficiais.
O problema do presidente sobre as informações desencontradas pode ser solucionado imediatamente, basta ele apenas seguir o cerimonial e falar somente o indispensável, porque os esclarecimentos, as informações e as notas oficiais são normalmente prestados pelo Porta Voz do Palácio do Planalto, que tem a obrigação de fornecê-los absolutamente com correção e precisão, na forma do figurino protocolar.
A situação da forme no Brasil é crítica e preocupante, constituindo tremenda aberração alguém alegar que quem passa forme vai se apresentar em praça pública, para denunciar seu corpo raquítico, quando é sabido que, quem passa fome, não tem nem disposição para sair de casa, quanto mais ficar passeando os centros das cidades.
É preciso que as autoridades públicas se esforcem em identificar os bolsões de pobreza, para o fim de constatar a tristeza da forme que impera nesses lugares desassistidos pelos governos e as autoridades públicas, que estão muito preocupados com a reeleição, quando eles deixam de aprovar algo de interesse da nação temendo a reação do eleitorado na próxima eleição, em evidente aberração de se misturar conveniências e projetos pessoais com o interesse público.
Convém que o presidente da República, agora alertado e consciente sobre a real gravidade quanto à existência de muita fome que grassa no Brasil, exatamente na atualidade, determine a imediata criação de programas destinados à distribuição de alimentos nessas localidades onde a fome chega a ser endêmica e letal, quando a grande parte da população já se acostumou com esse terrível martírio, que conta com imperdoáveis omissão e irresponsabilidade governamentais, conforme mostram os fatos, diante do seu completo desconhecimento, porque os políticos somente aparecem por lá uma vezesinha, no período de quatro anos, mas não é para distribuir alimentos, não, porque a sua presença lá é apenas para pedir voto e depois tomar banho de álcool, para ficar higienizado até o próximo pleito eleitoral.    
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 20 de julho de 2019

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