terça-feira, 9 de julho de 2019

O distanciamento da modernidade


Os governadores dos estados da região Nordeste se reuniram e divulgaram carta pedindo a liberdade do ex-presidente da República petista, preso pela Operação Lava-Jato, em Curitiba (PR), e o afastamento do ministro da Justiça e Segurança Pública.
O pedido foi motivado pela polêmica dos vazamentos criminosos feitos pelo site The Intercept Brasil, acerca de conversas entre o então juiz da Lava-Jato e membros do Ministério Público Federal.
Eles disseram que “Apoiamos firmemente o combate à corrupção, porém consideramos que também é uma forma de corrupção conduzir processos jurídicos desrespeitando deliberadamente a lei”.
Os governadores ressaltaram que “É inadmissível uma atuação que se denuncia  ilegal entre membros do Ministério Público e do Judiciário, combinando previamente passos de uma importante investigação, com o intuito de perseguir e prender pessoas. Em discurso recente, na Cúpula Pan-Americana de Juízes, o Papa Francisco já demonstrou a sua preocupação com atos abusivos e de perseguição por meio de processos judiciais sem base legítima. Reivindicamos a pronta e ágil apuração de tudo, com independência e transparência. É preciso também avaliar o afastamento dos envolvidos. Defendemos, ainda, a revisão ou anulação de todo e qualquer julgamento realizado fora da legalidade.”.
Os veementes apelos feitos pelas mencionadas autoridades têm por supedâneo informações obtidas por meios ilegais, que ainda continuam sendo vazadas pela imprensa, as quais são indiscutivelmente irregulares, já reconhecidas por pessoas sensatas e equilibradas.
Diante disso, em termos de bom senso e razoabilidade, não faz o menor sentido pedido estapafúrdio e atabalhoada, tendo por base, pasmem, informações que foram obtidas por meios ilícitos, não tendo qualquer validade perante o regramento jurídico pátrio, cuja autoria pode concorrer para a criminalização dos envolvidos, na forma da lei.
Os governadores demonstraram visível açodamento, que é absolutamente inadequado para autoridades de nível capaz de compreender que informações ilícitas, diante do mundo jurídico, são incapazes de produzir qualquer eficácia antes da confirmação sobre a sua autenticidade, algo que até o momento ainda não houve.
À toda evidência, os governadores, ao se anteciparem com pedido completamente destituído de fundamento jurídico, se expuseram ao ridículo, de forma prematura, apenas mostrando o seu verdadeiro sentimento de amor a cidadão que se encontra preso, cumprindo pena sentenciada pela Justiça, em razão da prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, que é a única pessoa, juridicamente falando, capaz de reclamar, nos trâmites apropriados, seus direitos, caso se sinta prejudicado, à vista das informações vazadas ilegalmente, mas tão somente depois que elas forem reconhecidas como verdadeiras por quem de direito.
Convém se ressaltar que os governadores, enquanto estiveram investidos dessas autoridades públicas, não podem se arvorar em se constituírem defensores senão dos interesses de seus respectivos estados, porque, na forma legal, qualquer atividade estranha ao seu cargo, pode-se caracterizar desvio de finalidade.  
 Por via das dúvidas, convém, antes de tudo, não os governadores do Nordeste, mas sim os advogados nomeados pelo condenado, por cautela, somente podem agir, em obséquio à segurança jurídica, depois que for confirmada a autenticidade das informações em questão, por enquanto, consideradas ilícitas, não se admitindo que autoridade por mais despreparada que seja fosse capaz de cogitar a liberdade de alguém e punição para o magistrado que proferiu a respectiva sentença.
Imagine-se, hipoteticamente, que, com base nas informações vazadas, ainda sem a devida autenticidade sobre a sua validade jurídica, haja a antecipação da liberdade do político e o afastamento do ministro, apenas em atendimento ao veemente apelo feito pelos governadores do Nordeste, mas, tempos depois, constatam-se que aquelas informações foram editadas e fraudadas, não tendo qualquer validade jurídica e, então, a quem responsabilizar, aos governadores do Nordeste?
Impende se frisar que, em defesa de causa absolutamente estranha aos interesses dos estados, houve desperdício de dinheiro público, jogado nos ralos da incompetência, em razão do deslocamento dos governadores e respectivos assessoramento, segurança, transporte, diárias etc. para tratarem exclusivamente de interesse particular, ou seja, lançarem carta em defesa de político preso, cabendo aos órgãos de fiscalização e controle promover as devidas investigações com vistas à responsabilização e à condenação dos envolvidos ao ressarcimento dos prejuízos causados ao erário de cada estado.
Diante desse imbróglio, é preciso mais serenidade e responsabilidade, principalmente das autoridades públicas, que precisam cuidar exclusivamente das suas incumbências constitucionais e legais, deixando que os interessados tomem as providências em proteção de seus direitos, como, no presente caso, em que somente cabe ao condenado adotar as medidas que melhor lhe aprouver, com vistas à adoção das medidas cabíveis contra o juiz que o sentenciou  e ainda na busca da sua liberdade, aproveitando as possíveis falhas processuais, já que ele não teve capacidade para provar, dentro do processo legal, a sua inocência, passando, em razão disso, a apelar pela junção de medidas populares em seu socorro  e erro judicial, como única esperança de ser libertado das garras da Justiça.
O que se percebe é a insensibilidade de autoridades públicas que, de forma insensata, leviana, precipitada e estranha, considera como sendo regulares as informações vazadas de maneira visivelmente ilegal, contendo conversas entre o então juiz da Lava-Jato e membros do Ministério Público Federal, mas não se atentam para o fato de que, sendo elas irregulares, na origem, não podem gerar efeitos jurídicos, diante da sua inexistência no mundo jurídico, o que significa dizer que nenhuma medida se pode tomar com fulcro nelas, que até podem revelar abuso de autoridade, mas até o momento não se pode cogitar por nenhuma das medidas aventadas por essas autoridades, nem a liberdade do político condenado e muito menos o afastamento do ministro da Justiça, exatamente por falta amparo jurídico para respaldar as medidas pleiteadas.
É preciso que as autoridades ajam com o devido equilíbrio, porque elas têm o dever supremo de atuar com responsabilidade e motivação, de modo a se cogitar a adoção de qualquer medida estritamente em sintonia com os princípios da justiça, da imparcialidade, da ética, com embargo do pressuposto da ideologia sempre tendenciosa e visivelmente em benefício de quem espera o milagre do erro cometido por outrem para salvar a sua honra, porque ele mesmo foi incapaz de fazê-lo, à vista dos entendimentos unânimes da Justiça, conforme pronunciamentos das primeira, segundo e terceira instâncias, na forma da ação pertinente ao tríplex.
Não se pode olvidar que há importante ditado segundo o qual: o povo tem o governo que merece, em razão da falta de sensibilidade dos eleitores, que têm enorme dificuldade em escolher seus governantes e o resultado é essa triste realidade do Brasil, cujas autoridades no poder confundem os interesses públicos com o privado.
Não é crível que autoridades decidam opinar sobre a competência de poder estranho ao que pertence, senão em se tratando da estrita defesa do interesse público, como forma de opinar ou lançar luzes sobre o esclarecimento referente a matéria que diz respeito aos brasileiros em geral, perdendo sentido e razão quando isso se faz de forma deliberada e injustificável em defesa de somente um preso, pedindo a sua liberdade, sem o reconhecimento de seu erro, quando outros condenados pela força-tarefa, por crimes idênticos, sequer têm seus nomes lembrados, fato que evidencia imperdoável parcialidade, por se inferir que conversas vazadas na imprensa não prejudicaram os demais sentenciados, caso elas sejam realmente autenticadas como verdadeiras.  
Nos países sérios e evoluídos, em termos políticos, civilizados e democráticos, as questões jurídicas são resolvidas normalmente no âmbito do Poder Judiciário, onde as decisões judiciais são questionadas e dirimidas com base e por meio dos recursos cabíveis, de exclusiva iniciativa dos envolvidos que se julgarem prejudicados, na tentativa da reparação de seus direitos, em sintonia com os devidos processo legal e ordenamento jurídico.
Não obstante, procedimento diferenciado disso somente se admite, porque faz parte da tradição nada civilizatória, nas piores republiquetas, onde há completos desrespeito e anarquia aos princípios constitucional, legal e jurídico, em que é normal e aceitável as autoridades e o povo insistirem, até com veemência, em querer resolver os casos envolvendo condenados à prisão pela Justiça, com base em provas, quanto à autoria sobre a materialidade dos fatos denunciados, apenas com base no grito, que é o meio mais primitiva usado pelos povos das cavernas.
Os saudáveis ensinamentos e lições propiciados pelas conquistas da humanidade, em termos de conhecimentos científico e tecnológico, ainda estão distantes de muitas pessoas, que preferem se acomodar às práticas em uso ainda na idade da pedra, quando a humanidade já experimenta fantástica evolução, em termos de modernidade, justamente em benefício do Homo sapiens.      
É evidente que o livre arbítrio e o Estado Democrático de Direito possibilitam que o homem possa pensar da maneira que melhor lhe aprouver, mas isso tende a evidenciar tremendo descompasso com a modernidade real ou será que quem já vive na atua era, de saudável evolução da humanidade, está errado e em dissonância com o princípio da razoabilidade?
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 9 de julho de 2019

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