O
presidente da República criticou severamente um ministro do Supremo Tribunal
Federal, por ele ter determinado a instalação, no Senado Federal, de Comissão
Parlamentar de Inquérito, para investigar a atuação do governo federal no
enfrentamento da pandemia da Covid-19.
O
presidente do país afirmou que falta “coragem moral” ao ministro e que
ele fez “politicalha” ao determinar a abertura da CPI e criticou o fato
de a comissão se concentrar na apuração de eventuais omissões do governo
federal no combate à pandemia e desafiou o ministro a determinar que o Senado
abra processos de impeachment pedidos contra alguns ministros do Supremo.
O presidente
disse, em alto e bom som, que “É uma jogadinha casada, Barroso e bancada de
esquerda no Senado para desgastar o governo. Eles não querem saber o que
aconteceu com os bilhões desviados por alguns governadores e alguns poucos
prefeitos também”, embora ele não tivesse citado quem teria praticado
desvios de recursos públicos.
O
presidente do país afirmou que “Lá dentro do Senado tem processo de
impeachment contra ministro do Supremo Tribunal Federal. Eu quero saber se o
Barroso vai ter coragem moral de mandar instalar esse processo de impeachment
também. Pelo que me parece, falta coragem moral para o Barroso e sobra ativismo
judicial”.
Além disso, o presidente aproveitou o ensejo para fazer insinuações sobre intimidades pessoais do ministro, ao afirmar que conhece o passado dele e como ele teria chegado ao Supremo, tendo o atacado pessoalmente, dizendo que antes da sua indicação para o Supremo e teria atuado, corte, na defesa de criminoso ex-guerrilheiro italiano.
Em tom de
muita revolta, o presidente mandou recado direto para o ministro, quando disse:
“Barroso, nós conhecemos teu passado, tua vida, o que você sempre defendeu,
como chegou ao Supremo Tribunal Federal, inclusive defendendo o terrorista
Cesare Battisti, então use a sua caneta para boas ações em defesa da vida e do
povo do Brasil e não politicalha dentro do Senado Federal. Se tiver
moral, um pingo de moral, ministro Barroso, mande abrir processo de impeachment
contra alguns de seus companheiros de Supremo Tribunal Federal.”.
Na noite
da véspera, em tom menos agressivo, o presidente acusou o Supremo de interferir
em outros poderes, após a decisão em causa, que atendeu a pedido em ação movida
por dois senadores, para a instalação da CPI, que havia atendido a exigência constitucional.
Na
liminar, o ministro destacou que a Constituição estabelece que as CPIs devem
ser instaladas sempre que três requisitos forem preenchidos: “assinatura de
um terço dos integrantes da Casa, indicação de fato determinado a ser apurado e
definição de prazo certo para duração.”.
Segundo
o ministro, não caberia ao presidente do Senado instalar a CPI conforme a sua
conveniência, ou seja, a instalação de CPI é imposição de sede constitucional,
que não pode ser sequer haver postergação.
Em que pese
a veemente cobrança do presidente do país, para que o ministro se digne a
determinar a abertura de processo de impeachment contra pares dele, o ministro
do Supremo não tem competência para decidir nesse sentido sem que tenha sido acionado
por meio de ação movida junto à corte, a exemplo do que foi feito no caso do
pedido por senadores, no caso da CPI da Covid, objeto desse terrível imbróglio.
Ou
seja, nesse caso, a indignação presidencial só conspira contra a sua falta de conhecimento
sobre o manejamento de ações no âmbito dos tribunais, a exemplo de recente
pleito da sua lavra ao Supremo, que foi negado, precisamente porque ele não
tinha competência para fazê-lo, que é privativa do advogado-geral da União.
No
despacho que respalda a decisão em causa, o ministro fez menção, em especial, ao
agravamento da crise gerada pela pandemia da Covid-19, como um dos argumentos
que justificariam a instalação da CPI.
O
ministro ressaltou que, "Além da plausibilidade jurídica da pretensão
dos impetrantes, o perigo da demora está demonstrado em razão da urgência na
apuração de fatos que podem ter agravado os efeitos decorrentes da pandemia da
Covid-19. É relevante destacar que, como reconhece a própria autoridade
impetrada, a crise sanitária em questão se encontra, atualmente, em seu pior
momento, batendo lamentáveis recordes de mortes diárias e de casos de infecção".
O
ministro fez questão de esclarecer que a Constituição Federal estabelece que as
CPIs devem ser instaladas sempre que três requisitos essenciais sejam satisfeitos,
a saber: a) assinatura de um terço dos integrantes do Senado; b) indicação de
fato determinado a ser apurado; e c) definição de prazo certo para duração.
O
ministro deixou claro que “não cabe omissão ou análise de conveniência política
por parte da Presidência da Casa Legislativa sobre quando a comissão deve ser
criada.”, ou seja, de acordo com a Constituição, independe de condição a instalação
de CPI, quando estiverem presentes aqueles requisitos.
Consta
da decisão do ministro que “É certo de que a definição da agenda e das
prioridades da Casa Legislativa cabe ao presidente da sua mesa diretora. No
entanto, tal prerrogativa não pode ferir o direito constitucional do terço dos
parlamentares à efetivação da criação da comissão de inquérito”.
As
regras para a instalação de CPIs estão previstas no artigo 58 da Constituição Federal,
nos termos a saber: "As
comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação
próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das
respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal,
em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus
membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas
conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova
a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.".
De
acordo com especialista em Direito Constitucional, os presidentes da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal têm obrigação de instalar CPIs quando cumpridos
os requisitos, cujo rito é bem diferente em relação aos processos de impeachment,
em que “não há nenhuma obrigação
quanto ao presidente do Senado e da Câmara analisar”.
O
mencionado douto disse que “Em relação à CPI, ela é exclusivamente
legislativa. Ela tem os requisitos mais bem delineados na Constituição. Como
regra, já é um entendimento consolidado, o presidente da Casa é obrigado a
instaurá-la. Ele não tem discricionariedade, conveniência ou oportunidade. E
foi o que o Supremo fez, segundo a própria jurisprudência da Corte”.
Um
professor de Direito Constitucional disse que CPI e impeachment são coisas
distintas, tendo esclarecido que "Existem na administração pública
situações em que há discricionariedade e situações onde há ato vinculado. O
discricionário é aquele ato em que há uma margem de decisão dentro da lei. A denúncia
do impeachment é discricionária. Agora, quando a lei estabelece critérios objetivos,
claros, se for cumprido, não há margem de discricionariedade, é obrigatório”.
O
especialista esclarece que, se a CPI cumpre os requisitos e não é instalada: “vai-se
buscar o Judiciário, com a possibilidade de um poder interferir saudavelmente
no outro. No sistema de freios e contrapesos, o poder é uno. Os poderes
podem ter uma ingerência um no outro, um poder controla o outro, mas de modo
saudável, conforme a Constituição.”.
A
vista das opiniões abalizadas de doutos na matéria, fica fácil se concluir que é
preciso que o mandatário do país tenha muito cuidado com as falas de caráter
político, porque elas podem estar despidas do devido fundamento, como no
presente caso, em que o as afirmações presidenciais demonstram dificuldade
quanto à correção de suas afirmações, conquanto o ministro se houve
absolutamente com correção, nos estritos limite e cumprimento da sua
competência constitucional, visto que a sua decisão tem respaldo no ordenamento
jurídico, ficando muito feio para quem a critica, por demonstrar gigantesca
ignorância sobre a matéria.
O presidente
do país demonstrou que a determinação para a instalação da CPI foi capaz de
corroer profundamente as suas estruturas, por, em razão disso, fazer gravíssimas
críticas sobre a intimidade do ministro do Supremo, quando diz, entre outras
grosserias, que gostaria de saber se ele tem coragem moral para determinar a instalação
de processo de impeachment de ministros colegas dele, quando ele não tem
competência para tanto, mas se trata de agressão graciosa que o presidente do
país deveria ter evitado.
Nessa
mesma linha, ele insinua que o ministro teria utilizado meios escusos para
chegar ao Supremo, porque isso é algo que precisa, no mínimo, de comprovação.
Agora,
algo da maior importância, que merece destaque, diz com o conselho feito pelo
presidente do país, no sentido de que “então use a sua caneta para boas ações em defesa da
vida e do povo do Brasil,”, precisamente porque é isso que os brasileiros estão
ansiosos por que ele resolva fazer, especialmente como
sentimento de vontade e interesse em salvar vidas.
Causa
perplexidade que o presidente fique extremamente perturbado, a ponto de perder
a estabilidade psicológica, ao ficar atirando para tudo que lado, em agressões
infundadas e até injustas, quando a CPI se destina a apurar fatos do governo que
tendo a garantia do presidente de que eles estão sendo executados sob rigorosos
cuidados e em estrita observância dos princípios da competência, eficiência e regularidade.
O
certo é que o presidente do país falou muitas palavras fora da curva que ele
queria mesmo, com muita vontade, atingir o âmago do ministro, no sentido de que
ele é desqualificado, por fazer o que fez e não tem moral para fazer o que deveria,
mas a decisão adotada se reveste de legitimidade e o que o presidente queria
que tivesse feito, não.
As
ofensas do presidente atingem em cheio as honra e dignidade do ministro, sendo,
por isso, impensável que elas fiquem sem a devida resposta por parte dele, ante
a imperiosidade do respeito que precisa existir entre as autoridades da
República.
O
silêncio do ministro pode abrir precedente perigoso, que não é aconselhável em
um país com o mínimo de seriedade e civilidade, em termos democrático e
político, visto que, depois disso, qualquer pessoa insensata pode se achar no
direito de agredir a imagem de qualquer autoridade pública e simplesmente ficar
impune.
Em
nome da dignidade da República, o ministro tem o dever de interpelar o
presidente do país, nas vias apropriadas, sobre as acusações ofensivas feitas às
suas honra e dignidade, sob pena de desmoralizar a sua autoridade de magistrado.
Por
sua vez, é preciso se entender, sem margem de dúvidas, de que o presidente do
país tem todo direito de se insurgir contra as decisões relacionadas com as atribuições
inerentes ao seu cargo, mas somente no estreito âmbito da correção e da decência
em harmonia com a liturgia da relevância das funções constitucionalmente
atribuídas a ele.
Ou
seja, é preciso que o presidente da República se conscientize de que ele não
pode discutir assunto da maior importância nacional como se estivesse em botequim,
entre amigos, como ele fez de esculhambar e por sob suspeitas a honra e a
dignidade de ministro do Supremo, ao dizer que ele não tem moral, no meio da
rua, tratando com a maior banalidade algo que envolve muita responsabilidade,
que exige serenidade e competência para ser analisado.
A
matéria objeto da decisão do ministro diz respeito à instalação de CPI, que é
da maior significância nacional, por afetar, no caso, o desempenho do governo
com relação ao combate à pandemia do coronavírus e isso exige que seja
conduzido com muita competência e seriedade.
Como
foi demonstrado pelo presidente, ele não gostou da medida e pensou que
esculhambar o ministro, na via pública, seria o melhor remédio para o
saneamento do caso, mas, à toda evidência, o destempero dele somente expõe precipitação
e incompetência no trato de assunto da maior relevância, que precisa ser
analisado com ponderação e tranquilidade, no próprio gabinete.
Pois
bem, senhor presidente, nesses casos, a competência, a sensibilidade, a decência
e a responsabilidade administrativas recomendam a única medida a ser adotada,
como naturalmente faz o estadista sereno e consciente dos seus deveres institucionais,
qual seja, a impetração de recurso ao Supremo, mostrando com argumentos fáticos
e jurídicos o possível descabimento, se assim for o entendimento, da medida
adotada pelo ministro, em razão dos possíveis prejuízos que ela pode causar ao
Executivo e ao país.
Ou
seja, toda a indignação demonstrada pelo presidente, no meio da rua, apenas serviu
para mostrar o quanto é importante o respeito aos salutares princípios da
civilidade e republicano, no sentido de se realizar a gestão pública com as
necessárias decência, serenidade e responsabilidade, sem nenhuma necessidade de
agressão a ninguém, tendo em vista que as questões que afetem os interesses nacionais
precisam ser discutidas e resolvidas pelos canais e vias competentes, exclusivamente
pela maneira recomendada pelo bom senso e pela racionalidade, à vista da normal
compreensão dos princípios da civilidade, competência e responsabilidade.
Nesse
caso, se nada há de errado nem o que se questionar sobre o desempenho do governo,
evidentemente na compreensão do presidente, o bom senso diz exatamente que a instalação
da CPI em causa precisaria ser entendida como extremamente benfazejo motivo de
tranquilidade por parte dele, por apenas ter a certeza de que os trabalhos dela
irão chancelar a grandeza das políticas executadas com relação ao combate da
pandemia do novo coronavírus.
Ou
seja, para o governo sério e competente, não poderia haver nada melhor para se conspirar
a favor do sua gestão o trabalho com a credibilidade de CPI, diante da certeza
de que o seu resultado certamente irá mostrar os acertos da gestão objeto das investigações,
que, no caso, será a atuação do governo federal, no enfrentamento da pandemia
da Covid-19.
Enfim,
a CPI em causa deve oferecer ao presente da República excelente oportunidade
para que ele possa mostrar o maravilhoso trabalho do seu governo no efetivo
combate à pandemia do novo coronavírus, assim considerado por ele, em que pese
a marca deplorável de quase 350 mil mortes por causa da Covid-19, a par de também
ser possível a indicação das reais e fantásticas medidas adotadas para o controle
desse terrível vírus, que os brasileiros precisam conhecer, à luz do princípio republicano
da transparência.
Brasília,
em 10 de abril de 2021
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