sexta-feira, 9 de abril de 2021

Repúdio à deselegância

 

O presidente da República aproveitou a reunião com empresários paulistanos para xingar duramente o governador de São Paulo, quando disse textualmente que “O governador de vocês é um vagabundo, (palavra impublicável)”, segundo relato de pessoas que estavam no evento.

Outras pessoas presentes no evento disseram que, segundo o presidente do país, o referido governador é “um destruidor de vidas e que está acabando com os empregos ao manter o comércio e os restaurantes fechados no estado de São Paulo.”, conforme notícia publicada no jornal Folha de S.Paulo.

Segundo o jornal O Globo, o chefe do Executivo declarou no encontro que espera que o Congresso Nacional aprove as reformas enviadas pelo governo, tendo declarado ainda que a pandemia da Covid-19 não pode levar o Brasil à miséria total.     

Em que pesem as severas críticas do presidente sobre as medidas restritivas adotadas pelo governador, o estado de São Paulo bateu, ontem, novo recorde de mortes diárias, por causa da Covid-19, tendo sido registrados 1.389 óbitos pela doença, em apenas 24 horas.

Os altíssimos números de óbitos levaram o governo e o Centro de Contingência a decretarem a "fase emergencial", a mais restritiva do Plano São Paulo. 

Naquele estado, o Centro de Contingência faz a avaliação da situação da pandemia e encaminha o resultado ao governador, que decide sobre as medidas a serem adotadas no combate à doença, sendo que as restrições são aconselhadas segundo o aumento de mortes e a maior incidência do contágio da doença.

O governador de São Paulo declarou que as decisões são adotadas segundo as necessidades recomendadas para o estado e que, de acordo com ele, "Não cabe aqui fazer avaliação sobre decisão da ciência, eu não interpreto a ciência".

          Quanto às declarações do presidente do país, o governador o respondeu, nas redes sociais, fazendo apelo no sentido de que ele tenha "Calma, @jairbolsonaro. Além da Coronavac, o Butantan é especialista na anti-rábica (sic). Fique tranquilo, vou te vacinar".

A propósito, a vacina antirrábica humana serve para prevenir a raiva em pessoas mordidas por animais, em especial cães e gatos.

A raiva é uma doença que afeta o sistema nervoso central, levando à inflamação do cérebro e geralmente pode resultar em morte da pessoa infectada.

Não há a menor dúvida de que o baixíssimo nível da interlocução tem como protagonistas as duas principais autoridades públicas do país que têm a incumbência de cuidar e combater a mais grave doença que vem abatendo vidas humanas, em escala jamais vista na história do Brasil, mas nada disso tem sido suficiente para amainar os ânimos de pessoas que precisam agir com bom senso e racionalidade, diante de situação extremamente delicada da pandemia.

Isso por si só pode sim concorrer para justificar a quantidade de mortes que se acumula no dia a dia, quando essas autoridades não têm a menor sensibilidade para entender o momento de dificuldade na saúde pública, preferindo ficar discutindo, em público, sobre algo absolutamente estranho às causas do maior infortúnio humanitário.

O dever institucional dessas autoridades é exatamente o de estarem unidos, de mãos dadas, discutindo, implantando e executando medidas urgentes e necessárias ao extermínio ou até mesmo o estabelecimento ou a minimização de tanta desgraça contra a vida humana.

O pior é que tem sido sintomático que o presidente do país fique alegando o caos para o Brasil, quando ele afirmou que a pandemia da Covid-19 não pode levar o Brasil à miséria total, dando a entender que tem sido o desejo de muita gente, exatamente diante da falta de iniciativa por parte de quem tem o dever de coordenar e liderar a criação de ideias e planejamento das medidas indispensáveis ao saneamento das questões nacionais, inclusive no que se refere aos problemas inerentes à saúde pública.

A verdade é que o Ministério da Saúde é o principal órgão do governo que tem a primordial incumbência de trabalhar e apresentar importantes contribuições ao combate da pandemia do coronavírus, mas, infelizmente, a sua participação como agente vital contra a terrível doença tem sido extraordinariamente invisível, quase que nula, ressalvadas as medidas absolutamente necessárias, no âmbito de recursos financeiros e outras não relacionadas com a saúde.

O que se esperava daquele órgão, diante da sua especialização propriamente dita, que diz respeito diretamente à saúde pública, era precisamente a sua efetiva participação, em caráter de urgência, urgentíssima, especialmente porque não faz o menor sentido que órgão com a estrutura de ministério fique apenas acompanhando acontecer a maior tragédia na sua área e nada fazer em benefício ativo da população, à vista da sua indiscutível acefalia por quase um ano e isso representa gravíssimo prejuízo ao interesse dos brasileiros.  

Enfim, a alegação de fato relacionado com a miséria acena para situação lastimosa, em que o presidente dá a entender antevisão de desastre à vista, como sendo o visionário do Apocalipse, a se demonstrar absoluta impassividade diante de suas terríveis projeções catastróficas, não esboçando, ao contrário, qualquer iniciativa para impedir o caos, como maneira esperada e razoável para combatê-lo, em defesa do interesse do Brasil e dos brasileiros, o que só evidencia seu sentimento de alardeador de fatos impossíveis e desnecessariamente alarmantes e intranquilizadores, que somente contribuem para desestabilizar o ânimo e o desempenho da economia e do próprio progresso do país.

À toda evidência, fica patente a total inconformidade dos pronunciamentos desairosos de governantes de relevância nacional, ante a gravíssima situação da saúde pública nacional, que implora, em vão, para a convergência de vontades e interesses dos governantes da federação, para, ao menos, a discussão de medidas visando ao enfrentamento contra a pandemia do coronavírus, algo que poderia contribuir decisivamente para justificar o mínimo de sensibilidade para com os princípios humanitários, que foram, à vista dos fatos, relegados a planos secundários, à custa de possíveis causas indefensáveis, em termos do interesse público.  

Os brasileiros, a par de repudiarem o deselegante comportamento de homens públicos, pugnem por que, neste momento extremamente delicado da pandemia do novo coronavírus, os governantes do país se dignem somente à  preocupação com as urgentes medidas que visem ao efetivo tratamento e combate à doença que já ceifou muitas vidas, o que já é motivo mais do que suficiente para que a sensibilidade de autoridades públicas possa compreender a real importância de se deixar de lado, momentaneamente, desavenças e interesses políticos.

Brasília, em 9 de abril de 2021

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