sexta-feira, 23 de abril de 2021

A bem da verdade?

 

Um jornalista fez análise da decisão adotada por um ministro do Supremo Tribunal Federal, negando pedido formulado por um senador, que pretendia que a corte determinasse que o Senado Federal abrisse processo de impeachment contra um ministro desse tribunal.

Nas palavras entusiasmadas do jornalista, o ministro teria dito que o Supremo não teria autonomia para interferir em outro poder, tendo com isso criticado as decisões monocráticas adotadas por outros ministros, como uma anterior à dele, onde um ministro determinou que o Senado instalasse CPI, tendo chegado a insinuar que essa decisão poderia ser anulada, quando ela já foi até respaldada pelo plenário.

Por fim, o jornalista concluiu que a decisão de negar o pedido do senador teria sido duro recado para que os demais ministros evitassem decisões monocráticas.     

Com a devida vênia, o ilustrado jornalista está redondamente equivocado e transmite informações absolutamente erradas, extremamente distorcidas da verdade.

Vejam-se que o ministro que antecedeu este último decidiu corretamente, com base na Constituição, sobre matéria realmente de direito de recorrer por parte de dois senadores, que constataram que a CPI da Covid, embora formalizada nos termos do artigo 58 da Constituição, há algum tempo, não fora instalada pelo presidente do Senado, que não pode se sentar em cima dela, ante a imposição constitucional.

Ou seja, depois de preenchidos os requisitos constitucionais, a CPI precisa ter seguimento e, nesse caso, o ministro ordenou ao presidente do Senado que ele precisava cumprir o que consta da Constituição e isso é absolutamente normal, no regime democrático, em termos da decisão do ministro, que age em nome do Supremo.

É de se notar, a propósito, que a CPI em causa já estava com o seu objeto definido por mais de um terço dos senadores, à luz do disposto no art. 58 da  Constituição e foi sobre ela que houve a decisão do Supremo.

A pretensão de se investigar outros assuntos dentro dessa CPI, como queriam os governistas, a partir do presidente do país, talvez dependesse da boa vontade dos autores dela ou então da criação de outra CPI, conforme a conveniência.

De maneira alguma o ministro do Supremo poderia determinar a ampliação do alvo da CPI já aprovada, mas, a despeito disso, os doutos entendidos em normas constitucionais acham que o presidente da República está certo.

Agora, o caso referente ao pedido negado pelo último ministro é outra história completamente diferente daquela, por se tratar de pedido de impeachment de ministro do Supremo.

Nesse caso, a decisão de instaurar ou não o processo pertinente fica a critério estritamente da esfera política, no âmbito da discricionariedade dos parlamentares, não cabendo ao Poder Judiciária realmente se pronunciar, no sentido de agilizar o procedimento, principalmente porque não existe prazo e a Constituição não é incisiva como é o no caso da CPI, onde consta que ela será instalada, obviamente depois do preenchimento dos requisitos constitucionalmente exigidos.

Ou seja, a denúncia sobre o impeachment é considerada como caso discricionário, cabendo margem de decisão por parte da autoridade que vai decidir sobre o pedido e isso realmente não cabe a interferência do Supremo, como assim decidiu o ministro, mas no caso da CPI, há o estabelecimento de critério vigente, que é cogente, sem margem para discricionariedade.

Para o caso da CPI, há a regra constitucional que impõe a imediata instalação e, assim, é saudável que se busque o remédio para a situação com recurso a outra poder, quando o presidente da Casa Legislativa não o faz, de modo a retardar as investigações pertinentes, deixando de cumprir a sua competência constitucional para o seguimento da matéria da espécie.

Nos processos de impeachment, não há nenhuma obrigatoriedade quanto aos presidentes da Câmara e do Senado em analisá-los e não faz sentido que o Supremo inove, em termos de interferência, o que significa dizer que o senador incorreu em ato de extrema incompetência, por recorrer sobre tema que não cabe providência senão daquelas autoridades, que podem se sentar sobre os pedidos de impeachment e fica tudo bem, embora a boa regra da dinâmica processual, no serviço público, seja a de se promover a devida decisão nos processos, o mais brevemente possível, no sentido do provimento ou não do pedido pertinente.

Em ambos os casos vistos acima, penso, salvo melhor juízo, que os ministros do Supremo decidiram com acerto, à luz do ordenamento jurídico pátrio.

Espero ter contribuído com esclarecimentos sobre matéria da maior importância técnico-jurídica para os brasileiros que, infelizmente, muitos ainda ficam fazendo juízo de valor com base em informações equivocadas, infundadas e completamente reais, em detrimento da verdade, embora seja preciso ficar muito claro que cada qual tem a sua verdade sobre a interpretação dos fatos da vida.

Brasília, em 23 de abril de 2021

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