Bem
ao estilo do populismo interesseiro e despreocupado com a seriedade exigida na administração
pública, o presidente da República houve por bem acusar um ministro do Supremo
Tribunal Federal de fazer “politicalha”, só porque ele decidiu que o Senado Federal
instale a CPI da Pandemia.
Vejam-se
que a aludida medida atendia pedido de senadores que viam a iniciativa barrada
na Câmara Alta, em que pese o cumprimento das exigências previstas na Constituição,
cuja instalação pendia apenas da vontade do presidente dessa casa, mas o mandatário
brasileiro entendeu de pôr a culpa em cima do ministro, que foi simplesmente desmoralizado,
por conta disso, em momento de visível desequilíbrio.
Diante
da decisão em tela, o presidente do Senado deve sair do conforto do “juízo de
conveniência e oportunidade” e instalar a CPI que se destina a apurar possíveis
descaminhos administrativos na gestão referente ao combate à pandemia, que já deixou
triste rastro de destruição de muitas vidas, mas, mesmo assim, o governo de
mantém em ritmo normal, sem se atentar para a maior crise que se abateu sobre a
saúde pública brasileira.
No
momento, a mídia estarrece o mundo, diante da revelação de conversa, por
telefone, entre o presidente do país e um dos senadores autores do pedido que
foi atendido pelo Supremo, compartilhada no fim de semana pelo próprio
parlamentar, no Twitter.
Na
conversa, o presidente se queixa, pasmem, de supostos obstáculos criados contra
o Executivo por integrantes do Legislativo e Judiciário, ocasião em que ele se
expõe ao máximo quanto às suas brilhantes ideias, tendo deixado muito cristalino
o seu pensamento, para dizer ao senador como ele imagina que devem ser conduzidos
os trabalhos da CPI, ou seja, desde já o mandatário antecipa para o parlamentar
como quer que a comissão atue, segundo o que pensa, certamente de melhor para a
imagem do governo.
O
presidente antecipou que, “Se não mudar o objetivo da CPI, ela vai vir para
cima de mim. O que tem que fazer para ser uma CPI útil para o Brasil: mudar a
amplitude dela. Bota presidente da República, governadores e prefeitos”, embora
tendo assegurado que nada tem a temer, a não ser um relatório “sacana”,
i.e., desde já ele imagina que pode haver sacanagem, pondo em dúvida, de forma
bem clara, a seriedade dos senadores, inclusive do seu interlocutor.
Em
outro trecho da conversa, o presidente adiantou, em defesa de suas ideias, que “Vamos
fazer do limão uma limonada”, deixando implícito a possibilidade de armações,
para o desvio da verdade, que não condiz com a seriedade que se espera dos
homens públicos.
À
toda evidência, só o fato de haver indevida articulação para tratar,
antecipadamente, de assunto que envolve interesse do governo, já sinaliza para
claro escândalo envolvendo órgãos de alto nível da República, à luz da
seriedade que precisa prevalecer no âmbito da administração pública, porquanto o
Palácio do Planalto acha conveniente mostrar o seu sentimento sobre os fatos objeto
das investigações e sinaliza que tentará implantá-lo a fórceps, de goela adentro
dos senadores, para que o governo não seja prejudicado.
Talvez
a imposição da CPI possa contribuir para a mudança sobre aquela conversa de que
coronavírus tem apenas os sintomas de “resfriadinho”, como forma de se tentar a
justificativa que seja feito apenas o necessário, sem maiores preocupações com
todo estrago já causado às vidas dos brasileiros.
Também
devem ir por terra outras conversinhas de que o melhor imunizante era a
contaminação em massa, que as regiões do Nordeste e do Norte não sofreriam com
a pandemia, porque o uso de cloroquina no combate à malária serviria como
“vacina” e que a vacina produzida pelo governador de São Paulo produziria
apenas “morte, invalidez e anomalia”.
A
CPI poderá refrescar a memória do presidente do país, para reafirmar que nunca
promoveu aglomerações nem em momento algum maldisse o uso de máscaras, mas sempre
foi gigante na defesa dos protocolos e das orientações científicos, a exemplo do
distanciamento social, entre outras medidas necessárias ao combate à pandemia,
apenas em confirmação de todo negativismo imperante até o presente momento.
A
grandeza da CPI poderá mudar o pensamento prevalecente do presidente, que
tentará passar nova mentalidade de homem público, para mostrar que procurou
sempre fazer tudo o que estava ao alcance do governo, para salva vidas, quando
os fatos vão mostrar exatamente o que realmente aconteceu, sendo que o mais contundente
é a terrível estatística de mais de 350 mil mortes pela Covid-19.
Possivelmente,
a versão mais autêntica do presidente, para se isentar perante a CPI, será a de
que tantas mortes havidas pela pandemia são da culpa única e exclusiva de
governadores e prefeitos, que receberam recursos federais e deixaram morrer os
brasileiros, sem a prestação do devido socorro, ou seja, a parte do governo foi
religiosamente cumprida e sem reparos.
A
tormenta do presidente não é à toa que, nessa conversa com o parlamentar, porque
a convocação do último ministro da saúde o preocupa em horrores, visto que ele já
se contradisse ao divulgar informações distintas sobre o fornecimento de
oxigênio para o Amazonas, antes de as pessoas começarem a morrer por falta de
ar nos hospitais do estado, fato que deixou o governo em maus lenções e em situação
complicada.
A
grande vantagem da CPI é que os depoimentos, os fatos e até os vídeos poderão ser
mostrados ao vivo, com forte poder de desmascaramento ao vivo e em tempo real, não
se permitindo mais ser desmentidos por meio de notas oficiais posteriores, na tentativa
de justificar o injustificável.
Outra
importante contribuição da CPI será a exposição da verdade, por meio de depoimentos
sinceros e material audiovisual, para mostrar as mentiras e os fatos
verdadeiros sobre o que realmente aconteceu na falta de combate à pandemia e
isso poderá mudar a história, da água para o vinho, visto que as mentiras já
causaram estragos imperdoáveis.
O
importante é que essa história que envolve a pandemia do coronavírus possa ser
contada com base na sua versão verdadeira, a partir da CPI, de modo que as
mentiras, a incompetência, a insensibilidade e a irresponsabilidade contribuam para
prestar respaldo à ilustração verdadeira de quadro real do que verdadeiramente
tenha acontecido e ainda possam fundamentar decisão não de “sacanagem”, como
disse o presidente do país, mas sim de punição, ser for o caso, aos verdadeiros
culpados por essa tragédia humanitária.
Enfim,
os brasileiros honrados e dignos esperam e confiam que os trabalhos da CPI, se realmente
forem realizados imunes às indevidas interferências de autoridade pública que, em
síntese, é o principal alvo das investigações, possam contribuir para que o
Executivo se conscientize, finalmente, sobre a real gravidade da tragédia causada
pela temível pandemia do novo coronavírus e decida adotar, em caráter emergencial,
as necessárias e revolucionárias medidas que já deveriam ter sido objeto de
cuidados há muito tempo, porque os fatos mostram que essa lacuna de preocupação
por parte das autoridades públicas pode ter contribuído para elevar a inadmissível
quantidade de mortes.
Brasília,
em 12 de abril de 2021
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