quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Injustificável deselegância?

O presidente da República houve por bem voltar a atacar o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, o também ex-juiz da Operação Lava-Jato, ao afirmar que ele passou mais de um ano “sem abrir a boca” quando estava à frente do Ministério, mas que agora parece que tem “solução para tudo”.

Em conversa com apoiadores, ao se referir ao ex-ministro, que havia proferido discurso versando sobre política, o presidente do país afirmou, em tom sarcástico e de deboche, que “Veio um idiota agora, não vou falar o nome dele, e disse: ‘Ah, comigo a economia vai ser inclusiva, sustentável…'”.

O presidente chegou a afirmar, em recente encontro com seus apoiadores, que o ex-ministro não aguentaria dez segundos de debate, em visível demonstração de graciosa tentativa de depreciar a capacidade intelectual do seu declarado inimigo, que decidiu ser candidato à Presidência da República, nas próximas eleições.

Para mostrar a sua insatisfação com o ex-ministro, o presidente do país ressaltou que “Esse cara passou um ano e pouco no meu governo e nunca abriu a boca em reunião de ministro. Sempre de boca fechada. Até que aconteceu a saída, um pouco tarde, mas aconteceu. Agora, ele tem solução para tudo. Estando fora do governo é fácil ter solução para tudo”.

Na tentativa de diminuir a capacidade política do ex-ministro, o presidente do país disse que “Esse não aguenta 10 segundos de debate”.

À toda evidência, não é da aprimorada educação nem próprio dos princípios de civilidade, ninguém tratar o seu semelhante com a pecha de idiota, como fez, estranhamente, logo o presidente do país, porque isso tem a conotação de idiotice, que é forma de deficiência mental grave, em que se tem a ideia de pura bobagem sobre algo do que se afirma.

No caso, a idiotice teria sido pronunciada por personalidade que é candidato a Presidência da República, o principal cargo ocupado por quem acusa alguém de idiota, sem que haja absolutamente nada para justificar essa maneira deselegante e até desumana de tentar denegrir a imagem o ex-ministro, como se ele, o presidente fosse o suprassumo em tudo e estivesse imune a qualquer suspeita, no exercício do relevante mandato.

É evidente que não se pode qualificar o presidente da República de idiota, com a mesma acepção como talvez ele quisesse distinguir o ex-juiz, em forma de se tentar evidenciar defeito insanável, mas nada que o mandatário brasileiro fizer, enquanto estiver no exercício do atual mandato, terá o condão de justificar a espúria aliança dele com o famigerado e recriminável Centrão, grupo político que é símbolo escrachado do recriminável fisiologismo, que tem como princípio filosófico o deplorável e odiável sistema do “toma lá, dá cá”, que jamais poderia ser aceito, como parceiro, por governo com o mínimo de seriedade, decência e moralidade.

Mesmo que tivesse justificado motivo, que não é caso, porque é visível que o mal-entendido entre ambos tem causa rixa pessoal, que deveria ter sido resolvida entre pessoas civilizadas, o presidente do país não teria  moral, depois que colocou o Centrão dentro do Palácio do Planalto e entregou o governo para as lideranças desse nefasto grupo político, em termos de decência comportamental, para criticar mais ninguém, porque seria o mesmo que se dizer que o sujo fala do mal lavado.

Essa referência à falta de decência do presidente do país é decorrente dos compromissos da campanha eleitoral, onde ele demonstrava ser o paladino da moralidade, tendo prometido realizar governo imune às indecentes negociatas, mas elas se tornaram realidade e funciona na sua gestão, como se fosse absolutamente normal, enfim, logo em enleado com o Centrão, grupo político que era tratado por ele com distanciamento de desprezo e ojeriza.

O então candidato se referia ao Centrão como a “velha política”, prometendo nunca se associar a ele, juramento político este que foi desrespeitado e quebrado, exclusivamente por força da conveniência política, que sempre fala muito mais alto do que o caráter do político, que muda de lugar com a mesma facilidade como as nuvens se alternam de posição.

Esse fato da mudança de pensamento político se caracteriza como verdadeiro calote eleitoral, praticado contra os brasileiros honrados e dignos, porque acreditaram nas palavras do candidato e votaram nele, exatamente porque não aguentavam mais os abusos dos governos corruptos do passado, que não se incomodavam com a convivência inescrupulosa que o atual governo adotou de maneira muito prazerosa, tanto que até assinou a ficha de filiação a um dos principais partidos integrantes desse poderoso grupo político, sob a afirmação de que sempre pertenceu ao Centrão.

Nada justifica que o presidente do país, a título de querer se manter em evidência junto aos seus apoiadores, na saída da sua residência oficial, fique perdendo seu precioso tempo, procurando debochar dos sentimentos de pessoas que merecem ser tratadas com respeito e educação, mesmo que elas não sejam da sua simpatia, como ele fez questão de demonstrar ao se referir ao seu ex-assessor, que teria sido o principal do seu governo, simplesmente de “cara”, quando seria muito mais elegante para ele, porque teria evitado a sua exposição ao ridículo, que esse deprimente episódio jamais tivesse ocorrido.   

O certo é que, ao contrário do que se pode imaginar, a atitude do presidente brasileiro, nesse episódio, somente conspira contra a autoridade dele, por comprometer, de forma visível, a sua sensatez no sentido de ele ter o dever de ser sempre amável, compreensível e tolerante no exercício do cargo, tendo ainda a obrigação institucional de ser exemplo das boas condutas sociais, em qualquer circunstância, justamente porque isso se insere na liturgia do mandato presidencial, por exigir a permanente disponibilização do sentimento de cortesia e educação perante a sociedade.

Enfim, ao tentar denegrir a imagem de ex-ministro de seu governo, com adjetivação completamente dissonante da liturgia recomendada pela boa civilidade, o presidente do país perde excelente oportunidade para se comportar, perante o público, como o verdadeiro príncipe da República, a quem não se permite sair da linha da pureza vernacular, por ele ter o dever de sempre primar pelo sagrado respeito à dignidade dos cidadãos.

Convém que o presidente brasileiro se conscientize sobre a imperiosa necessidade do respeito aos princípios da fina educação, sobrelevando a importância do cargo exercido por ele, que exige o alto nível de relacionamento com a sociedade, não importando nem mesmo as adversas circunstâncias.      

          Brasília, em 9 de dezembro de 2021 

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