As imagens mostram o indicado,
familiares dele, a primeira-dama e mais um grupo de pessoas acompanhando, pela
televisão, o anúncio do resultado da votação no plenário do Senado.
O vídeo mostra a
primeira-dama pulando e vibrando, aos gritos de louvor, após o anúncio do
resultado da votação no Senado, enquanto o indicado se abraçava com familiares.
O futuro ministro se
torna o segundo nome indicado pelo presidente da República para aquela corte.
Depois desse anúncio, o
presidente do país afirmou que, com a aprovação em causa, ele cumpria promessa
feita a apoiadores de indicar para o Supremo um ministro “terrivelmente
evangélico”, de vez que o amigo indicado é pastor da Igreja Presbiteriana
Esperança, em Brasília.
Trata-se em si de desdobramento
de fato extremamente estranho e inusitado, porque o Supremo tem por competência
em sede constitucional, de forma precípua, à luz do disposto no art. 102 da Lei
Maior do país, de zelar pela “guarda da Constituição”, tendo por finalidade,
basicamente, o julgamento dos assuntos que estejam afetos a ela e digam
respeito aos seus princípios, sem qualquer conotação com tema teológico ou
religioso, o que significa abissal estranhamento presidencial à liturgia que ele
tem dever institucional de observar e cumprir, na forma de compromisso de posse.
No caso da indicação em
causa, conforme enfatizou o presidente do país, foi levada em consideração, prioritariamente,
o saber teológico dele, por seus notórios saberes “terrivelmente evangélicos”,
quando a Constituição se refere a apenas a conhecimentos relacionados com o “notável
saber jurídico e reputação ilibada.”.
Extremes de dúvidas, esse
estrambótico fato poderia ensejar questionamento acerca da nomeação em apreço,
caso o Brasil fosse um país com o mínimo de seriedade, em relação às normas
jurídicas, quando se trata dos assuntos relacionados com o Estado, onde o
desrespeito às regras constitucionais parte exatamente da principal autoridade
da República, que se vangloria de cumprir compromisso visivelmente ao arrepio do
ordenamento legal do país, para o fim apenas de satisfazer, pasmem, o prometido
para grupos de evangélicos, algo completamente dissonante dos princípios
republicanos, onde, necessariamente, o magistrado somente tem compromisso com a
satisfação do interesse da sociedade, ou seja, com o público em geral e não com
grupos de apoiadores.
O presidente do país tem
obrigação de dá bons exemplo de fidelidade às normas jurídicas, partindo-se do
seu juramento de posse perante o Congresso Nacional e a nação, ou seja, os
brasileiros, quando ele firmou compromisso, por força do disposto no art. 78 da
Constituição, “de manter, defender e cumprir a Constituição, observar as
leis”, ficando muito claro que, nesse ponto, foi quebrada a regra
fundamental aqui referida, o que é indiscutivelmente inadmissível em nação
evoluída, à luz do que se espera de seriedade e responsabilidade em defesa da
integridade da Constituição e do Estado, uma vez que precisa exercer a sua missão
institucional com o máximo de eficiência, competência e responsabilidade.
Certamente que o
ministro “terrivelmente evangélico” jamais poderia assumir o cargo que exige,
na forma da Constituição, pessoa “terrivelmente jurista”, que somente entenda das
Ciências do Direito, de modo a se permitir que o Supremo tenha condições de cumprir,
com as esperadas competência e eficiência, em nome do Estado, a importante
missão que os brasileiros exigem dele, o que certamente não poderá fazê-lo
tendo a contribuição de pastor, com terrível experiência em termos evangélicos,
à vista da garantia presidencial de que ele é “terrivelmente evangélico”.
A entusiástica e efusiva
comemoração pela primeira-dama do país, diante do anúncio da aprovação do
evangélico para o Supremo, mostra, com muita clareza, a verdadeira decadência
dos princípios republicanos, ficando evidenciada a esculhambação no preenchimento
de relevante cargo de ministro sem a devida observância dos critérios fundamentais
exigidos pela Lei Maior, que deveria ter sido indicado alguém exclusivamente com
notórios conhecimentos jurídicos, sem qualquer conotação com outros saberes,
porque certamente a participação desse importante pastor na corte de Justiça
tem o condão de prejudicar ainda os seus trabalhos, que já são bastantes
criticados pelas morosidade e ineficácia.
Nesse caso, não somente
perde o país, como especialmente a sociedade, com a escolha de ministro sem a
observância do devido critério que se exige constitucionalmente para a ocupação
de tão relevante cargo, diante da certeza ainda de que ele saiu do Palácio do
Planalto, sede do governo brasileiro, por escolha pessoal do presidente da República,
para decidir e fazer as vezes de agente do Executivo naquela corte e isso é completamente
inadmissível se o Brasil fosse um país decente e sério, em termos de respeito
aos princípios éticos e morais, porque as autoridades públicas se envergonhariam
de ferir as comezinhas regras constitucionais, que é o caso em comento.
Ao contrário disso, a
primeira-dama festejou a aprovação de algo completamente dissonante com o
regramento jurídico, tendo a certeza de que o ministro apadrinhado do presidente
do país há de fazer excelente trabalho no Supremo, em defesa do interesses do
Executivo, quando a verdadeira missão de qualquer ministro é tão somente trabalhar
em defesa da sociedade, em nome do interesse público.
Nesse questionável episódio,
o presidente da República se expôs em ferir importantes princípios constitucionais,
em especial porque a indicação desvia, de forma visível, das normas pertinentes
à impessoalidade, ao juramento de posse e ao mérito do indicado, consoante o
disposto nos arts. 37, 78 e 101 da Carta Magna, fato este que põe sob suspeita
a legitimidade do ato administrativo pertinente.
É bastante lamentável
que muitos brasileiros se conformem com procedimentos visivelmente contrários
às regras constitucionais e ainda tendo comemorações absurdas por parte de quem
deveria contribuir para respeitá-las ou, ao menos, exigir a sua devida observância,
como forma de preservação da seriedade e da moralidade da gestão pública.
Enfim, cada povo tem o
governo que merece, porque isso deriva da democracia republicana, que permite a
escolha de seus representantes no governo e no Parlamento, apenas lembrando que
estes teriam a obrigação de observar as regras constitucional e legal, para que
o Estado pudesse ser administrado sob a égide da legitimidade, da competência,
da eficiência, da responsabilidade, entre outros princípios próprios da civilidade
e da decência compatíveis com a evolução da humanidade.
Brasília, em 6 de dezembro
de 2021
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