domingo, 12 de dezembro de 2021

Verdade ou mentira?

 

Não é verdade que o presidente da República brasileiro tenha ganho o título de “Personagem do Ano” da revista Time, norte-americana.

A escolha é da competência dos editores da publicação norte-americana e será anunciada amanhã.

É verdade que a revista publicou o resultado de enquete que fazia indagação sobre quem deveria ser escolhido para a homenagem, onde houve votação online, aberta a qualquer um, que o presidente do brasileiro ficou disparado em primeiro lugar, cujo resultado não define absolutamente nada. 

Ocorre que fãs e idólatras do presidente brasileiro se mobilizaram nas redes sociais, para participar ativamente da enquete, graças a uma campanha impulsionada desde o final de novembro, inclusive pelo próprio presidente, por políticos aliados e por blogs e canais governistas, em verdadeiro movimento que se fosse feito algo semelhante em prol da melhoria das políticas públicas do governo a popularidade interno dele certamente não estaria tão rasteira.  

Nessa campanha, alguns importantes perfis compartilharam a notícia do resultado da enquete sem explicar que se tratava de uma votação popular sem efeito prático, tendo gerado forte confusão nas redes sociais.

O site de uma rádio nitidamente bolsonarista fez postagens de grande alcance, com  reprodução do título “Bolsonaro é eleito personalidade do ano pela revista Time”, fato que está incorreto, por enquanto, por falta de respaldo, salvo se os citados editores concluírem nesse sentido, em decisão para amanhã. 

O presidente brasileiro recebeu pouco mais de 24% dos mais de 9 milhões de votos contabilizados, tendo sido acompanho pelo ex-presidente dos EUA (9%), pelos profissionais de saúde (6,3%), por um ativista (6%) e pelos cientistas que desenvolveram as vacinas contra a Covid-19 (5,3%).

Com ajuda da ferramenta de monitoramento de redes sociais CrowdTangle, um grande jornal brasileiro verificou que o topo da lista de compartilhamento das postagens tem origem em uma deputada federal bolsonarista do PSL-SC, com milhares de interações no Facebook, fato que significa, apenas para se ter ideia, essa forma de engajamento é cerca de 12 vezes maior do que o da própria revista, ao convocar os seus leitores para a votação na mesma rede social, quando o post dela teve pouco mais de 1,5 mil interações, mesmo considerando que  a Time tem 80 vezes mais seguidores do que a parlamentar brasileira, ou seja, houve verdadeira enxurrada de postagens.

Segundo um jornal, a força das postagens se fez presente também no ranking das dez maiores fontes de compartilhamentos no Facebook, com o envolvimento de grupos alinhados com o presidente brasileiro, como as páginas “Brazil Wars”, “Bolsonaro Presidente 2022”, “Nas Ruas” e “Movimento Avança Brasil”, cuja campanha ainda foi estendida para sites e blogueiros no Twitter e no Youtube, em campanha intensa em prol da eleição do presidente brasileiro.

Foi constatado que o próprio presidente brasileiro entrou diretamente na sua campanha, tendo pedido votos em live com simpatizantes, no dia 25 de novembro, nestes termos: “Estamos liderando. Agradeço a quem votou em mim. Quem não votou, peço que entre lá no site da Time e vote.”.

Ressalte-se que levantamentos realizados por institutos especializados, somente com brasileiros e, sem direcionamento ideológico, conforme publicação na mídia, resultam em altíssimo nível de impopularidade do presidente brasileiro, contrastando com essa questionável votação da Time, a princípio, nada republicana, à luz da seriedade.

 É até possível que a enquete para “Personalidade do Ano” possa ser levada em conta pelos editores da Time, mas ela não é decisiva para a escolha, à vista do que já aconteceu em anos anteriores, a exemplo do ano passado, quando o voto popular foi para os profissionais de saúde que atuaram na linha de frente da pandemia de Covid-19, mas os editores escolheram o atual presidente norte-americano e a sua vice-presidente.

Ressalte-se que, no anúncio da vitória do presidente brasileiro na enquete, a Time afirmou que “o líder controverso, que será candidato à reeleição em 2022, está enfrentando uma desaprovação crescente pela maneira como lida com a economia e recebeu críticas generalizadas de políticos, tribunais e especialistas em saúde pública ao minimizar a gravidade da covid-19 e demonstrar ceticismo sobre as vacinas”. 

É mais do que evidente de que a pesquisa conta com amostra terrivelmente viciada e desleal, diante da constatação de participantes majoritariamente bolsonaristas, fato este que, à luz do princípio da seriedade, não serve como real “termômetro” da popularidade do presidente, como defendem os seguidores dele e muito menos põe em descrédito as pesquisas de opinião pública que apontam alta desaprovação do governo. 

Na verdade, não chega a ser novidade que brasileiros se submetam ao ridículo de forjar a construção absurda de liderança sem a menor sustentação de mérito, que até seria louvável se as postagens representassem a realidade natural dos fatos, mediante a participação unânime e voluntária dos brasileiros, sem a prevalência de movimentos defensores de ideologias de direita, que demonstram agir do mesmo modo ou até pior do que os fanatizados da esquerda, muito e justamente criticados por sua irresponsável cegueira para ver as sujeiras da gestão de seus ídolos.

Com base nas constatações de que a eleição em apreço resulta de mobilização de fanatizados, o seu resultado não passa de verdadeira decepção, em forma de desmoralização do eleito, quando inexiste nesse processo, que se imagina que seja da maior seriedade, o envolvimento do devido mérito, no sentido de que a eleição tivesse sido espontânea e refletisse exatamente, no caso, o resultado da gestão reconhecidamente produtiva e satisfatória em benefício dos brasileiros, tendo a aprovação e os aplausos em confirmação dos seus bons frutos, quando os fatos apontam para realidade bem diferente.

Na realidade, todo esse processo não passa de mais uma vergonhosa e deslavada mentira, apoiada por brasileiros que não se cansam de se enganarem a si próprios, porque essa história de se eleger o presidente brasileiro como personalidade do ano, sob a visão internacional, não tem o menor cabimento, à luz dos princípios do bom senso e da racionalidade, exatamente por não haver elementos substanciais que justifiquem o verdadeiro sentido atribuído ao objetivo da enquete, cuja farsa se confirma pela loucura manipulação nas redes sociais.

O sentimento que se tem, diante de fato extremamente deplorável como esse, em que o próprio interessado ao seu resultado não tem o mínimo pudor em trabalhar em causa própria e até que nem seria tanto censurável se houvesse algo de razoabilidade a justificar a medida, é a de que a sensação que finalmente mostra o sentimento de orgulho por conquista que, na realidade, não passa de verdadeiro engodo, desastre mesmo, no sentido de se elevar às alturas o prestígio de quem não conseguiu demonstrar isso na prática.

Ou seja, brasileiros se tornam tão ingênuos que não enxergam que as suas atitudes estão apenas contribuindo para a confirmação da mediocridade, ao colocar alguém no topo do mundo, quando a população brasileira não respaldaria medida bastante controversa como essa.

Na prática, essa atitude esdrúxula tem resultado extremamente prejudicial aos brasileiros, porque a impressão que fica é a de que o presidente se convence que ele é realmente o melhor de todos e imagina que seu trabalho é satisfatório, em termos do atendimento pleno das necessidades dos brasileiros, quando ele deveria, ao contrário, ter a humildade de auscultar os verdadeiros anseios da população, para conhecer a verdade sobre o seu governo, em termos de satisfatoriedade dos serviços prestados à sociedade..

Enfim, a enquete em referência precisa ser reconhecida por sua extrema contribuição à verdade, porque ela mostra a farsa de governo que se alimenta de informações irreais e forjadas, para se manter na simpatia de seus idólatras, que prestam deplorável serviço à causa dos brasileiros que honram e dignificam os princípios cívico, democrático e patriótico, em respeito aos conceitos da seriedade e da verdade, como patrimônio maior de um povo.  

Brasília, em 12 de dezembro de 2021

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