quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Interferência indevida?

 

Em resposta sobre questionamento qual teria a sua satisfação ou insatisfação com o ano de 2021, o presidente da República afirmou que a tristeza maior ocorrida neste ano foi a interferência no Poder Executivo.

O presidente do país disse que “As tristezas são as interferências indevidas. O tempo todo interferência indevida no Poder Executivo, afasta a presidente do Ibama, não deixa nomear não sei quem lá, tem que fazer isso, tem que fazer aquilo, não é atribuição dessas outras pessoas isso. Poderíamos estar melhor se não tivessem algumas pessoas nos atrapalhando.”.        

O presidente do país não declinou nome diretamente envolvido nessa interferência, mas fez referência a decisões do Poder Judiciário no seu governo.

O ano político foi marcado pela crise política entre o presidente do país e o Supremo Tribunal Federal, principalmente com a forte atuação de um de seus ministros, que provocou a ira incontrolável do mandatário brasileiro.

Em atos convocados e promovidos pelo presidente do país, no dia 7 de Setembro, ele chegou a declarar que não obedeceria às decisões desse ministro, em clara demonstração de rebeldia cívica, ante o compromisso de posse, que tem o juramento presidencial de observar e cumprir a Constituição e leis do país, se incluindo nessa linha as decisões judiciais.

Os discursos de teor golpista do presidente do país foram duramente criticados por praticamente todas as forças políticas, o que o levou a publicar carta que denominada de “Declaração  à Nação”,  em que pediu desculpas e dizia que as declarações foram feitas no calor do momento, em que pese ele ter simplesmente se acovardado e se humilhado diante da pressão do Centrão, que o ameaçou de se desculpar pelas agressões, sob pena do seu afastamento do cargo, por meio do processo de impeachment.

Em razão da falta de apoio ao arroubo golpista, o presidente compreendeu que o melhor para o seu governo era a única alternativa, qual seja, o recuo estratégico, acompanhado das desculpas ao ministro do Supremo e de promessa de se comportar com civilidade e respeito ao regramento jurídico, como fazem os governos sensatos, competentes, equilibrados e sérios.

Na verdade, senhor presidente, não são as tristezas das interferências indevidas de outras autoridades no seu governo, mas sim a gigantesca incompetência que reina e domina toda cúpula da corte presidencial, que demonstra enorme alegria em criticar as decisões judiciais envolvendo atribuições do poder Executivo, para se transformar em vítima, sob a alegação de interferência indevida.

Essa maneira de reclamação do presidente somente expõe o elevado nível de incompetência administrativa do governo, que demonstraria ao autor do ato contra o Executivo, pela via legal, o total descabimento da medida por ele adotada, de modo que tudo poderia ser resolvido por meio de recurso, em que os argumentos jurídicos de direito seriam o cenário capaz e suficiente para se mostrar que a decisão impugnada teria sido gravíssimo erro contra o governo.

Ou seja, para se passar de vítima, o presidente brasileiro prefere não recorrer da decisão judicial, para se valer do direito, como fez no seu discurso, de se passar por injustiçado e que não consegue trabalhar por motivo de interferências externas.

Na verdade, isso se chama incompetência, diante da aceitação de decisões judiciais indevidas, conforme declarado por ele, em notório prejuízo à eficiência da gestão pública, uma vez que o presidente do país precisa ter a devida consciência sobre as atribuições das funções institucionais, inclusive das demandas de recursos aos tribunais, quando necessárias, porque procedimento dessa natureza faz parte do sistema democrático vigente no Brasil.

Enfim, a compreensão que se tem é a de que, se não houve recurso contra a alegada interferência, o ato de que se trata estava errado e precisava de medida corretiva. 

Convém que o presidente da República se conscientize de que a competência e a eficiência da administração pública se realizam com a integral observância do regramento jurídico do país, de modo que também se insere nas suas atribuições a defesa contra as interferências indevidas, conquanto o seu consentimento a elas possa implicar no intrínseco reconhecimento da incompetência, como clara forma de omissão de agir em defesa do Executivo.

Brasília, em 29 de dezembro de 2021

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