Secundo resultado de
fiscalização promovida pela Controladoria Geral da União - CGR, no exercício de
2013, houve a constatação de que servidores, empresários, produtores rurais,
alunos de escolas particulares, familiares de autoridades e até pessoas falecidas
constam na lista de beneficiários do programa Bolsa Família. Com base no conjunto dos 58
processos de fiscalização constantes da programação para os municípios
sorteados, a CGU constatou a uniformidade de indícios de irregularidades nos
casos verificados, demonstrando as precariedades de cadastramento e de controle
do maior programa assistencialista do mundo, que o governo não se cansa de
exaltar a mais bem sucedida distribuição de renda da história brasileira. Causa
perplexidade o fato de que, nesses municípios, foi verificado que mais de cinco
mil benefícios foram pagos a pessoas que supostamente teriam renda per capita
familiar superior ao limite estabelecido pelo programa, evidenciando a completa
leniência do governo com as irregularidades, por se omitir quanto à
fiscalização sobre os beneficiários, com vistas a se confirmar que os
pagamentos são feitos às pessoas enquadradas nas exigências da legislação de
regência. Também não deixa de ser estranho que o Ministério de Desenvolvimento
Social, responsável pela coordenação do programa, se mostrou indiferente quanto
aos fatos irregulares apurados, não prestando esclarecimentos sobre os detalhamentos
de qual maneira são promovidos os cadastramentos dos beneficiários e
principalmente a fiscalização sobre a execução do programa, de modo a permitir
que haja essa enormidade de fatos irregulares, que naturalmente perduram desde
os primórdios do seu funcionamento, embora seja o único programa que o governo
tanto se vangloria de ter priorizado para valer na sua gestão. Veja-se que, somente
no município de Belford Roxo (RJ), houve a constatação de que "1.512 famílias beneficiárias que constam na
folha de pagamento de Julho/2012 na situação de benefício 'liberado' e que
apresentam renda mensal per capita superior a meio salário mínimo". As
maiores irregularidades dizem respeito à inclusão no programa de pessoas com
renda superior ao máximo permitido. Há casos em que, de forma inescrupulosa e
vergonhosa, servidores e familiares de autoridades constam como beneficiários
regularmente cadastrados e recebendo pagamento, na maior tranquilidade. No
município de São Francisco de Assis (PI), a mulher de um vereador constava da
lista do Bolsa Família. A coordenadora de Apoio ao Idoso, da Secretaria
Municipal de Assistência Social, que é responsável pelo cadastro dos
beneficiários, tinha a filha como beneficiária. Além disso, a servidora e seu
marido são donos de panificadora e de pousada. Em Olindina (BA), cinco
servidores públicos, entre eles dois estaduais da Secretaria da Educação e da
Assembleia Legislativa da Bahia, estavam na lista, seus salários eram
superiores ao máximo permitido legalmente. No município de Vazante (MG), vários
servidores com renda superior a R$ 1 mil mensais eram beneficiários do
programa, sendo que um deles recebia o valor de R$ 134 de Bolsa Família, apesar
de ter salário de R$ 2,2 mil. A situação se tornou tão deprimente que, em Xexéu
(PE), foi verificada a existência de pessoas mortas, em 2011, na lista de
pagamentos realizados até o final de 2012, cujas irregularidades foram causadas
por deficiência no controle do cadastro, que, aliás, é a marca dominante no
programa. Em contraposição, enquanto os mortos "recebem" benefício do
Bolsa Família, há pessoas vivíssimas, enquadradas no perfil do programa que
ainda lutam para receber o benefício. É o caso de uma beneficiária de Lagoa
Alegre (PI), que constava do programa e da folha de pagamento, mas nunca havia
recebido o cartão que ficava com pessoa não identificada, a qual recebia, por
mês, o valor de R$ 102,00. Outros casos interessantes dizem respeito a pessoas
consideradas ricas receberem o benefício, como ocorreu em São José do Sul (RS),
onde uma produtora rural, com faturamento anual, em 2011, de R$ 955 mil, era
beneficiária do programa. Já no município de Barra do Ribeiro (RS), uma mulher
era beneficiária, apesar de ser proprietária de empresa e possuidora, junto com
o marido, de cinco veículos. Além dos casos de empresários encontrados em
Jaguaribara (CE) e São Domingos (SE), respectivamente, uma dona de churrascaria
e um dono de mercearia recebiam benefícios do programa. As irregularidades
não ficam somente nos pagamentos aos beneficiários, porque foram constatadas
outras gravidades organizacionais e desvios de verbas pelos municípios, como no
município de Aliança (PE), onde foi verificado que houve fraude nos recursos
enviados ao programa, com a falta de comprovação de despesas no valor de R$ 90
mil, por conta do dinheiro que deveria se destinar à contratação de empresa
para promoção de cursos de qualificação profissional. As irregularidades nos
pagamentos são variadas, desde o cadastramento, por não se ter certeza se os
beneficiários são realmente carentes; a falta de controle da frequência escolar
e do cartão de vacinação das crianças; a inexistência de comissão gestora do
programa; e até desvios de recursos enviados para atividades complementares,
entre outros problemas de gravidade que maculam a seriedade do programa que
deveria funcionar tal qual com o tamanho da eficiência alardeada pelo governo
quanto à sua existência. No entanto, como se percebe, à vista dos fatos
horrorosos fornecidos pelo próprio governo, por conta da fiscalização promovida
pela Controladoria Geral da República. O governo deveria, ao invés de se vangloriar
da existência do programa, se envergonhar de tantas irregularidades na sua
execução do Bolsa Família, que sequer deveria citar o seu nome sem antes
promover generalizada depuração das irregularidades, impropriedades e
deformidades, porquanto as gravidades são capazes de macular por completo o
gerenciamento de programa que realmente deveria ser orgulho do país, não apenas
do governo, caso os recursos comprometidos fossem executados com efetividade,
em harmonia com as normas de regência, observados rigoroso cadastramento e
submetidos a eficientes fiscalização e controle, como forma de certificação do exato
atendimento da finalidade precípua da instituição de tão importante programa
assistencial. Enquanto o “decantado” programa funcionar com enormes
precariedades, recheado de enormes irregularidades, conforme o próprio governo
constatou in loco, somente há
condição de se afirmar que os recursos públicos estão sendo desperdiçados, por
incompetência generalizada dos responsáveis pela administração desse programa,
que devem ser, na forma da lei, responsabilizados pela má gestão de verbas
públicas, por omissão e incapacidade de gerenciá-las em conformidade com as
normas de execução orçamentária e financeira. Não se compreende que os órgãos
de controle externo e de fiscalização também sejam omissão quanto ao
cumprimento do seu dever constitucional e legal de acompanhar e atestar a
regularidade da aplicação de recursos públicos, por serem coniventes com graves
irregularidades, como comprovam os fatos acima aludidos. A sociedade, que pagam
os pesados tributos, também tem sua parcela de responsabilidade, por ficar
calado e inerme diante de tamanha agressividade aos cofres públicos, pela
execução de recursos em programa repleto de irregularidade, totalmente fora do
controle gerencial do Estado, à vista dos fatos apurados nas fiscalizações
realizadas pelo governo. Convém que a sociedade se conscientize não somente sobre
a importância do programa Bolsa Família, que tem por finalidade assistir as famílias
efetivamente carentes, mas, sobretudo, sobre a premente e imprescindível necessidade
de ser rigorosamente observada a regularidade da sua execução, sob pena de
responsabilização daqueles que se omitirem quanto a persecução da eficiência do
programa em apreço. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 21 de junho de 2014
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