terça-feira, 3 de junho de 2014

Justificar o injustificável?

A presidente do país, em visita a estados do Nordeste, para vistoriar as obras de transposição do Rio São Francisco, rebateu críticas sobre atrasos nessas obras, declarando que “quem nunca fez nada, desanda a cobrar”. Ocorre que a construção teve início em 2007, com a conclusão prevista para 2012. O projeto de integração do São Francisco tem 469 quilômetros de extensão, com a estimativa de atendimento do fornecimento de água para 11,6 milhões de pessoas, abrangendo cidades dos estados do Ceará, da Paraíba, de Pernambuco e do Rio Grande do Norte. Veja-se que se trata de investimento de suma importância que exige, no mínimo, prioridade absoluta, que não houve, à vista da inexplicável procrastinação. O atraso é tão significativo e prejudicial que as obras deverão ficar prontas somente até o final de 2015, segundo previsão do governo federal. Não obstante, a presidente, ignorando tamanha imprudência gerencial e ironizando as cobranças por competência, afirmou: “Acontece uma coisa engraçada no Brasil, não sei se vocês já notaram. Quem nunca fez, desanda a cobrar de quem fez. Então é isso que nós estamos assistindo. Gente que nunca fez quando pôde, cobrar de quem está fazendo quando pode”. Não deixa de ser engraçado o fato de a presidente tentar se desculpar da incompetência do governo, acusando possível incapacidade e omissão de outros administradores, quando se sabe, à luz do bom senso, que um erro não justifica outro igualmente grave ou pior. O correto seria Sua Excelência assumir a terrível culpa pelo inexplicável de quase o dobro para a conclusão de obra tão importante para o povo nordestino. No caso, o atraso é bastante significativo por refletir não somente na demora do abastecimento de água ao sofrido povo sertanejo, mas no expressivo custo das obras, orçadas inicialmente em R$ 2,5 bilhões, mas, ao final, o rombo orçamentário-financeiro deverá ultrapassar, pasmem, a cifra de R$ 8 bilhões, justamente em razão da falta de preparo dos administradores públicos, que preferem atribuir a culpa pelos fatos ao acaso. Ao invés de rebater criticas dos adversários, por cobrar eficiência do governo, que seria a sua normal obrigação, principalmente em se tratando da aplicação de recursos públicos, que não admite qualquer espécie de desperdício, a presidente do país deveria ter a dignidade de admitir e reconhecer a injustificável inabilidade gerencial para impedir impunemente que as obras de transposição do Rio São Francisco tivessem passado por cruel processo de paralisação e de expressivo atraso, causando enormes prejuízos não somente financeiros, por perdas de obras realizadas, depósitos de material saqueados e outras precariedades contra o patrimônio, mas pelo injustificável atraso do empreendimento, posto que a retomada das obras fosse possível senão com a majoração dos preços, cujo valor total será mais do que triplicado, justamente em razão da incompetência administrativa, que obrigou a promoção de novas licitações para o seguimento dos trabalhos pertinentes à transposição. Agora, causa enorme perplexidade o fato de a presidente visitar as obras não na fase que elas estavam largadas à própria sorte, ao deus-dará, mas justamente na proximidade da campanha eleitoral, possivelmente em atendimento às orientações dos marqueteiros de plantão. À toda evidência, a presença dela era bastante importante no momento da paralisação, quando houve completo desprezo e abandono ao empreendimento pelas construtoras, mas, à época, ela se fez de mouca às reclamações dos nordestinos, não demonstrando o mínimo interesse em visitar os canteiros vazios, principalmente para mostrar sua autoridade de principal responsável pelas obras começadas ainda na gestão de seu antecessor. Esse fato lastimável evidencia com nitidez a personalidade e a responsabilidade dos políticos quanto ao seu real interesse de solucionar as questões que afetam a vida do povo brasileiro, que somente é valorizado por ocasião dos pleitos eleitorais, a exemplo da visita da presidente do país ao interior da Paraíba, onde aproveitou para criticar seus opositores, por terem estranhado, embora com toda correção e justiça, o desprezo, por muito tempo, às obras tão importantes da transposição em apreço. É absolutamente injustificável que a presidente do país aproveite visita à obra que deveria ter sido entregue em 2012, com preço três vezes menos, conforme previsão inicial, para tentar ridicularizar exatamente quem critica e considera verdadeiro absurdo que, em pleno século XXI, ainda se permita tanto desperdício de recursos públicos, na execução de obras planejadas e executadas por quem não teve o devido preparo para administrar com eficiência país tão importante como o Brasil, conforme denuncia o injustificável e inaceitável atraso, que não poderia jamais ter existido, porque este não é o momento para alegar que em qualquer outro país haveria atraso, porquanto noutras plagas inexistem tanta incompetência como há no país tupiniquim, onde os políticos procuram desculpas esfarrapadas para suas incapacidades gerenciais. O povo precisa, com urgência, reconhecer que o país não pode continuar sob o signo da incompetência, das mentiras e das evasivas sem plausibilidade, como forma de justificar o injustificável. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 02 de junho de 2014

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