Com
o envio de projeto de lei ao Congresso Nacional, o governo pretende eliminar a
meta de superávit primário para 2014, ficando livre para abater da meta o
volume de investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e de
desonerações que forem feitas até o final do ano.
Uma
autoridade da República disse que o superávit não é "questão de governo, mas de Estado" e o governo vai ganhar
grande flexibilidade para administrar a meta de superávit primário das contas
do setor público, caso seja aprovado o citado projeto, ou seja, nessas
condições, fica eliminada a meta fiscal, com a alteração, de última hora, no
bater do gongo, das regras fundamentais da política fiscal brasileira em
2014.
O
mais espantoso de tudo isso é que, em que pese a mudança quase no apagar das
luzes do regime fiscal, o governo ainda tem o desplante de insistir e afirmar
que o resultado do ano será positivo, como se os bestas dos brasileiros nada
entendessem de malabarismo nas contas públicas, reiteradamente manipuladas para
disfarçar os resultados das contas nacionais, inclusive na tentativa de enganar
a opinião internacional, embora ela seja a primeira a perceber a incompetência
administrativa do país, que sobrevive às custas dos famosos e ridículos
jeitinhos brasileiros da vexatória criação da contabilidade criativa, em
contraposição ao princípio universal da honestidade contábil.
Até
o ministério do Planejamento, responsável pelos levantamentos e acompanhamentos
das contas públicas, afirma que, apesar da mudança na Lei de Diretrizes
Orçamentárias de 2014, para a retirada do limite para abatimento da meta fiscal
com despesas com o PAC e com as desonerações tributárias, "o Executivo está comprometido a realizar o
máximo de superávit primário e ao mesmo tempo garantir a execução de investimentos
prioritários e a manutenção dos incentivos à economia nacional, por meio de
desonerações de tributos", ou seja, meras argumentações falseadas,
mentirosas, inverídicas e ilegítimas, por não condizerem com a realidade dos
fatos, porque, do contrário, não precisava do escandaloso artifício da mudança
proposta ao Congresso Nacional.
O
certo mesmo é que o questionado projeto acaba com o limite fixo de R$ 67
bilhões para o abatimento das desonerações tributárias e dos investimentos do
PAC, deixando o governo desobrigado de abater da meta fiscal o volume dos
recursos do PAC e das desonerações que forem feitas até o final de 2014,
tornando letras mortas as normas essenciais estabelecidas pela Lei de
Diretrizes Orçamentárias, por força das regras firmadas na Lei Complementar nº
101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal.
Impende
se ressaltar que, até setembro último, as desonerações e os gastos com o PAC
somavam a cifra de R$ 122,9 bilhões, ou seja, as desonerações somavam o valor
de R$ 75,69 bilhões e a quantia do PAC atingiu mais R$ 47,2 bilhões, fato que
demonstra o estouro da meta fiscal de R$ 67 bilhões, embora o rombo continuasse
crescendo depois daquele, porquanto esse valor deve aumentar substancialmente
até o final do ano, fato que pode garantir margem para o governo trabalhar até
mesmo o resultado desfavorável nas contas públicas, que, até setembro, as
contas do setor público acumulavam o déficit de R$ 15,3 bilhões.
Com
os investimentos e as desonerações já processadas até setembro, no valor de R$
122,9 bilhões, e as projeções até o final do exercício fiscal, o volume
potencial de abatimentos soma o valor de R$ 163,8 bilhões, o que se poderá
projetar, com base nesses cálculos, a margem para déficit nas contas do governo
da ordem de R$ 50 bilhões.
Embora
o projeto do governo demonstre claramente flagrante afronta à dignidade do
compromisso presidencial de cumprir o regramento jurídico do país, o presidente
do Senado Federal disse que haverá empenho da base aliada para a aprovação do
projeto, que tem merecido tratamento superespecial pelo Parlamento, quando
deveria ter a dignidade de também zelar pelo fiel cumprimento das leis
aprovadas por ele, a exemplo da importante Lei de Diretrizes Orçamentárias, que
simplesmente poderá ter alguns de seus essenciais dispositivos menosprezados e
jogados na lixeira do Legislativo, que cada vez mais se afunda no descrédito da
sociedade, que ainda tem a obrigação de arcar com a suntuosa manutenção do
Parlamento.
A
propósito, um importante senador da base governista, sem sopesar a
significância e a relevância do Parlamento, com relação a mais uma desmoralização
que ele poderá materializar, com a aprovação do projeto em apreço, afirmou que
"Nós queremos dar rapidamente
parecer, porque esta é uma questão de Estado. Independentemente da questão
política, eleitoral, partidária, nós temos de ter responsabilidade com a
política fiscal do País, temos de sinalizar claramente a situação econômica do
País, a situação fiscal, não só interna, mas externamente".
A
aludida declaração é tão estapafúrdia, que a aprovação contradiz exatamente as
palavras do parlamentar, porque a medida, se efetivada, sinalizará exatamente
para a materialização da incompetência e o debacle da situação econômica do
país, mostrando o quanto o governo foi incapaz de controlar, mesmo que
minimamente, as contas públicas, tendo se excedido com vantagem o limite da
meta fiscal estabelecido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias, fato que depõe
contra a credibilidade do governo, com evidentes prejuízos para os interesses
nacionais, ante a certeza do afastamento dos investimentos internacionais no
país, haja vista que o capital estrangeiro não sentirá segurança em aplicar no
país cujo governo não observa sequer o limite fixado para a importante meta
fiscal, aprovada pelo Parlamento com base em proposta apresentada pelo próprio
governo.
Ao
extrapolar as metas fiscais, o governo apenas demonstra um pouco de coerência
ideológica, porque, na campanha eleitoral as previsões dos especialistas já
acenavam para as terríveis dificuldades, notadamente quanto ao controle das
contas públicas, mas a presidente do país jurava que a administração do país se
encontrava absolutamente sob controle, inclusive com relação às contas do país,
fato que certamente, agora, funciona como verdadeiro estelionato eleitoral, por
ter induzido os eleitores a acreditarem na conversa dela, que se confirma,
agora, de forma lamentável, como falsa e destituída de credibilidade.
O mínimo
que o governo deveria fazer era respeitar também as metas orçamentárias, por
força das normas previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal, notadamente
porque o descumprimento dessa fundamental regra compromete a credibilidade do
governo e do país, principalmente pela perda da confiança quanto à garantia
sobre o controle das contas públicas, cujas despesas não podem superar a
capacidade de arrecadação.
A falta
de controle orçamentário pode implicar crime de responsabilidade fiscal, ante a
evidente demonstração de incapacidade gerencial, pelo fato de se gastar além da
previsão, advindo graves consequências para o país, motivadas pela desconfiança
quanto à fragilidade dos gastos públicos.
A
sociedade, imbuída do seu dever e da sua responsabilidade cívicos, deve se
conscientizar e se posicionar contrariamente à aprovação do projeto de lei em
comento, por alterar importantes dispositivos da Lei de Diretrizes
Orçamentárias, com o injustificável abandono à meta fiscal acertada no início
deste exercício, em função da meta de superávit primário, que é economia para o
pagamento dos juros da dívida do governo, eis que ela não é definida
numericamente e passa a ser o "máximo superávit primário", ou seja, o
limite para o endividamento do país é simplesmente o infinito sideral, quando
deveria também haver freios, como existe para a meta fiscal, que agora, de
forma irresponsável e injustificável, pode nem mais ser preciso respeitar, em
evidente retrocesso dos princípios da dignidade, do decoro administrativo, da legalidade
e da transparência, que se impõem na governança do país tão importante como o
Brasil, que jamais poderia se confundir com os procedimentos e as práticas
político-administrativas das republiquetas, que simplesmente menosprezam, de
maneira banalizada, os conceitos fundamentais da administração da nação. Acorda, Brasil!
ANTONIO
ADALMIR FERNANDES
Brasília,
em 17 de novembro de 2014
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