sábado, 24 de junho de 2017

A vida sem valor

Em tom de desabafo, o diretor de Fiscalização do Conselho Regional de Medicina da Paraíba disse, recentemente, que, “Por causa das condições de assistência, os médicos estão fazendo o papel de juízes da vida, tendo que escolher quem continua vivendo e quem vai morrer. Existe um termo utilizado para isso: ‘mistanásia’ ou eutanásia social, que é a morte antes da hora, por causa da miséria da medicina”.
O referido diretor afirmou que os médicos são obrigados a enfrentar quadro lamentável de adversidade, no dia a dia, ante a falta generalizada de estrutura dos serviços de saúde pública para suprir as necessidades médico-hospitalares e atender de forma satisfatória aos doentes, no momento preciso das suas carências médicas e na forma exigida para a situação emergencial.
Na opinião dele, é preciso que os governos se conscientizem sobre a premência de investimentos em saúde, em percentual bem superior ao que prevê a lei, sabendo-se que, na forma constitucional, as receitas mínimas destinadas à saúde são de 13,2%, 12% e 15% da receita corrente líquida, respectivamente para a União, os Estados e os municípios, que são indiscutivelmente insuficientes para atender à demanda sempre crescente.
A situação do atendimento emergencial, na Paraíba, é tão grave que uma idosa só conseguiu ser internada, em uma UTI da Capital, depois da intervenção do médico da família da paciente, mesmo depois de ter sido barrada na entrada do hospital.
O secretário de Saúde da Paraíba reconhece que “Temos uma escassez, embora aumentamos os leitos. Com um gerenciamento, você consegue fazer boa gestão da escassez. As UTIs estão lotadas com pessoas idosas. Se fosse na França, elas iriam para uma unidade de cuidados paliativos. Precisamos discutir isso com a sociedade e com a comunidade médica.”.
Nas condições atuais, esses percentuais são insignificantes e somente contribuem para aumentar o quadro aflitivo das dificuldades da saúde pública, que agoniza e pede socorro, ante o substancial aumento da legião de carentes, que não pode ficar à mercê da fria matemática orçamentária, cujo quadro precisa ser revertido para haver urgente compatibilização com a necessidade de se cuidar e se zelar por vidas humanas, que clamam desesperadamente por socorro.
A única maneira de se haver melhora das condições de atendimento à saúde e de dar acesso dos doentes aos leitos hospitalares, aos medicamentos e às novas tecnologias médicas é com expressivo incremento de mais recursos para a saúde pública, uma vez que a medicina se moderniza e consequentemente fica mais cara, por força da sua evolução, com o aperfeiçoamento dos equipamentos e dos novos tratamentos médicos, o que se exige que os recursos públicos também passem a ser disponibilizados em quantidade sempre crescente.
Não há a menor dúvida de que é preciso que os governantes se conscientizem, o mais rápido possível, de que recursos para a saúde não podem passar pelo rígido crivo do processo de limite mínimo previsto nas leis do país, tendo em conta que a integridade do ser humano não pode ficar adstrita à escassez de recursos aplicável às demais áreas de incumbência do Estado.
A saúde pública precisa ser compreendida, nos planos de governo, como a área que deve merecer prioridade sobre as prioridades, porque não há preço para a vida humana, que exige ser apoiada sobretudo pelas autoridades do país, evidentemente sem descurar dos demais projetos e atividades, que também precisam ser cuidados, como forma de equilíbrio das ações governamentais em benefício da sociedade.
É absolutamente inconcebível que, em pleno século XXI, seja permitido ou mesmo imaginável que a saúde pública possa trabalhar tendo como princípio ou parâmetro, pasmem, a escolha das pessoas que devem continuar vivas entre aquelas que estão fadadas à morte, porque isso fere mortalmente os verdadeiros sentimentos humanitários, porquanto todos têm direito à vida, enquanto os recursos da medicina possam garantir a sua sobrevida, mesmo estando em precárias condições de saúde.
Essa triste realidade demonstra a total falência dos princípios humanitários, que infelizmente se comprazes com situação absolutamente inadmissível nos dias atuais, em que é preciso que os agentes públicos sejam cobrados no sentido de terem indispensáveis e suficientes dignidade e racionalidade para não permitir que essa forma degenerativa prospere sem que nada seja feito para solucionar a grave e inaceitável calamidade pública que grassa na saúde pública. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 24 de junho de 2017

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