sábado, 10 de junho de 2017

Banalização da hipocrisia

No depoimento prestado ao juiz responsável pela Operação Lava-Jato, o maior político brasileiro da atualidade disse que “Se, em algum momento, um dos 204 milhões de brasileiros chegasse ao presidente da República e dissesse ‘tem um esquema de propina na Petrobras’, seria mandada embora a diretoria inteira da Petrobrás.”.
Isso dá um pouco da exata dimensão do nível da hipocrisia de como os fatos são realmente levados em conta na gestão pública, exatamente com enorme desprezo aos princípios do zelo e da responsabilidade sobre a coisa pública, tendo em vista que, na verdade, nos idos de 2009, o então presidente do país foi oficialmente informado, não apenas por “um dos 204 milhões de brasileiros”, mas sim, em especial, pelo principal órgão de controle externo do país, ou seja, o Tribunal de Contas da União, que teve a sua decisão referendada pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional, sobre graves irregularidades, notadamente quanto ao superfaturamento em quatro obras da Petrobrás.
À época, a citada comissão votou pela exclusão daqueles quatro projetos do Orçamento da União, até que se apurassem as irregularidades, mas o ex-presidente não somente ignorou a gravidade dos fatos como vetou a medida legislativa, embora estivessem em pleno questionamento os gastos com três das quatro importantes obras, a saber: a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) e a Refinaria Presidente Vargas (Repar), no Paraná, cujo rombo financeiro causado por elas se tornou objeto de denúncias e investigações na Operação Lava-Jato.
O jornal O Globo aduz que as obras da Refinaria Abreu e Lima estavam iniciando quando o TCU constatou superfaturamento do valor de R$ 121,6 milhões, cujas licitações estavam sob a responsabilidade de diretores e gerentes da Petrobras, que se tornaram protagonistas de denúncias de corrupção pela Lava-Jato, os quais já foram condenados à prisão e à devolução de dinheiro à estatal, ou seja, o homem, mesmo tendo sido avisado, diferentemente do que disse ao juiz, preferiu ignorar o alerta e deu continuidade ao processo ilícito e prejudicial aos cofres da empresa.
Em 2010, na solenidade de batismo da plataforma P-57 da Petrobrás, em Angra dos Reis (RJ), o então mandatário do país afirmou, como se estive em plena campanha eleitoral, que “Houve um tempo em que a diretoria da Petrobrás achava que o Brasil pertencia à Petrobrás e não a Petrobrás ao Brasil. (…) No nosso governo é uma caixa branca e transparente, nem tão assim, mas é transparente. A gente sabe o que acontece lá dentro e a gente decide muitas das coisas que ela vai fazer”.
Não obstante, ao atravessar ileso do escândalo do mensalão, como se não tivesse nada com esse trágico episódio, o político imagina-se poderoso e muito à vontade para tentar se defender das graves suspeitas sobre fatos denunciados e investigados pela Lava-Jato, ao jurar agora, de mãos juntas, obviamente ignorando, por completo, os assuntos do seu conhecimento, como visto acima, sob a alegação de que nunca soube nada acerca do bilionário escândalo do petrolão.
O mais grave de tudo isso é que, além de negar e não ter postura para assumir o conhecimento nem a responsabilidade sobre questões por ele tratadas no passado, conforme mostram as notícias da época, o político incorporou ao seu vocabulário o argumento segundo o qual os depoimentos que suscitam possíveis suspeitas quanto às suas atividades na vida pública não passam de insinuações mentirosas, principalmente aquelas informadas em depoimentos de delatores, que são capazes da prática de qualquer vilania para obter a redução de suas penas, tendo como resultado forte pressão exercida pela força-tarefa da Lava-Jato e o explícito interesse em incriminá-lo.
A verdade é que, diante da implacabilidade do trabalho competente e responsável da força-tarefa da Lava-Jato e ainda à vista da consistência das decisões resultantes, que normalmente são confirmadas em instâncias superiores, as delações não são fruto de pressões dos investigadores, mas sim da necessidade de realmente salvar a própria pele dos envolvidos, com a premiação prevista no regramento jurídico, ou seja, em absoluta harmonia com os princípios constitucional e legal.
A validade ou não das delações premiadas é avaliada segundo a consistência das informações nelas contidas, que normalmente são confirmadas e legitimadas, justamente à vista da normal e consequente concessão da redução da pena ou da liberdade dos envolvidos, que terminam prestando excelentes caminhos para a apuração de novos fatos inquinados de irregulares.
Importa seja ressaltado o magnífico resultado obtido pela Polícia Federal, pelo Ministério Público Federal e pela Justiça Federal, que estão desincumbindo com dedicação e amor funcional das suas missões constitucional e legal, em contrapartida aos gastos suportados pelos contribuintes, que aspiram por que os objetivos primaciais de moralização sejam devidamente alcançados, como forma de se expurgar os maus políticos das práticas delituosas e prejudiciais ao interesse nacional.
É induvidoso que a Operação Lava-Jato vem prestando relevantes serviços à moralização das práticas de gestão pública e isso naturalmente tem o condão de incomodar muitíssimo importantes políticos, que se envolveram em situações nada republicanas, que precisam ser devidamente investigadas, para o fim da revelação da verdade sobre elas, não importando a relevância dos homens públicos envolvidos.
Além da necessidade da revelação da verdade objetivada pelos trabalhos da Operação Lava-Jato, que tem sido realidade, infelizmente a hipocrisia tem sobressaído com abundância, a evidenciar o baixo nível político e moral dos homens públicos tupiniquins, que demonstram atuar ao sabor das suas conveniências, evidentemente em cristalino detrimento do interesse público, que devem prevalecer sobre as demais causas, por mais importantes que elas sejam. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 10 de junho de 2017

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