quinta-feira, 8 de junho de 2017

Abuso de poder?

Em tempos de vacas magras, no embalo das crises política e econômica, o governo acena para a liberação de verbas destinadas a emendas parlamentares, como forma de atrair para junto de seus projetos de permanência no poder o indispensável apoio do Congresso Nacional, de suma importância para as suas imediatas pretensões políticas.
O Executivo pensa em liberar recursos para projetos indicados por deputados e senadores como forma de contar com o apoio no Legislativo, obviamente para se fortalecer contra as intempéries e ameaças à perda do cargo presidencial, que se mostram perigosamente em forma de avalanche em direção ao Palácio do Planalto, diante do mar de denúncias de atos irregulares que estão sendo investigadas no Supremo Tribunal Federal, com o peso devastador de insustentabilidade no cargo.
O presidente do país pode liberar verbas em momento bastante crucial do seu governo, em razão da necessidade da garantia da manutenção da base unida, para votações importantes, a exemplo da reforma da Previdência, que ameaça não ser aprovada depois dos escândalos deflagrados com os depoimentos do empresário da JBS, que contribuíram para a debandada de vários partidos da sua base de sustentação no Congresso, fato que o obrigou a decidir por essa forma de “generosidade” com recursos públicos.
Ao que se tem conhecimento, as emendas parlamentares individuais são verbas contempladas no Orçamento da União, tendo a finalidade, em princípio, de abastecer os redutos eleitorais dos congressistas com recursos para obras e ações em saúde e educação, entre outras consideradas essenciais.
Historicamente, o Palácio do Planalto liberava essas verbas em harmonia com o cronograma de deliberações importantes no Congresso Nacional, segundo as conveniências e os interesses palacianos, para pressionar parlamentares a votar com o governo, mas, agora, com a aprovação do chamado Orçamento Impositivo, os pagamentos passaram a ser obrigatórios, que também podem ocorrer em casos esporádicos, como nas situações de aperto político do presidente do país, como agora.
          Em um país sério e governado com o mínimo de responsabilidade pública, a liberação de emendas ou de recursos para parlamentares, sabidamente com escassez de recursos para investimentos prioritários de interesse da sociedade, em especial a saúde pública e tantas despesas essenciais, constitui explícito abuso de poder e falta de sensatez e de zelo para com a coisa pública.       
Com absoluta certeza, jamais o governo ousaria promover a questionada liberação, caso não fosse a difícil situação de relacionamento entre o Palácio do Planalto e Congresso Nacional, no que diz respeito à aprovação dos projetos do governo e à sua sustentabilidade no poder, diante das pletoras denúncias de atos contrários aos princípios democrático e republicano.
A liberação das emendas parlamentares é a forma mais eficaz para se tentar afagar o ego dos beneficiários das emendas em questão, ficando explícita a esdrúxula maneira para a sensibilização da consciência dos congressistas, por meio mais direto de se agradá-los e se afagá-los com o repasse imediato de recursos públicos, que sabidamente são existentes para o atendimento de políticas prioritárias do governo.
É curioso que, num passe de mágica, o dinheiro aparece sabe lá de onde, para agradar os congressistas, que podem confirmar a fidelidade às alianças, por força da recriminável prática do indecente “toma lá, dá cá”, visto que a liberação de recursos funciona como bálsamo sedutor correspondente à compra da consciência de parlamentes, que não compreendem que esse procedimento dissente da sua real função de atendimento ao interesse público, que não comporta acordos espúrios.
A pulverização de dinheiro para as emendas parlamentares contribui para a falta ou a diminuição de recursos para a educação, saúde, segurança pública, infraestrutura etc. e a precariedade da prestação dos serviços públicos à população.
O governo, diante da crise econômica que afeta os orçamentos públicos, por decorrência da escassez de arrecadação, não pode se dar ao luxo de liberar recursos para parlamentares apenas por bondade, fazendo uso do já minguado dinheiro público, com o evidente propósito de se buscar, em troca, benefício pessoal com seu magnânimo ato de injustificável benevolência, que é inaceitável, nas circunstâncias, diante do estado de extrema penúria que se encontra o Tesouro Público, que não aguentaria verdadeira sangria, nem mesmo em condições de normalidade.
Como no caso em comento há o envolvimento de recursos públicos, é imprescindível que, na sua aplicação, sejam observadas as normas de administração orçamentária e financeira, quanto aos devidos controle, fiscalização e prestação de contas, como forma de se aquilatar a sua efetividade nos projetos indicados nas emendas dos interessados, ou seja, nas finalidades precípuas de interesse público, com vistas à finalística observância do princípio constitucional referente aos orçamentos públicos, que devem atender exclusivamente aos fins sociais. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 8 de junho de 2017

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