sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Desvalorização da espécie humana


De acordo com pesquisa realizada por Datafolha e divulgada pelo jornal Folha de S.Paulo, 54% dos entrevistados entenderam que a libertação do ex-presidente da República petista foi justa, enquanto outros 42% avaliaram que a libertação é injusta e 5% não responderam.
O mencionado político foi preso no ano passado, para cumprir a pena da condenação no caso referente ao triplex no Guarujá (SP), no âmbito da Operação Lava-Jato.
Um ano e sete meses depois, ele foi solto por força de interpretação  do Supremo Tribunal Federal, reconhecendo o direito dos réus de recorrer em liberdade até o julgamento do último recurso.
A pesquisa foi realizada no início deste mês, abrangendo o universo de 2.948 pessoas, em 176 cidades.
O nível de confiança da pesquisa é de 95% – isso quer dizer que há probabilidade de 95% de os resultados retratarem a realidade, considerando a margem de erro de 2%, para cima ou para baixo.
O levantamento também questionou se o entrevistado confia ou não no ex-presidente, tendo sido obtido o seguinte resultado: 25% sempre confia nele; 36% disseram que confiam às vezes; 37% nunca confiam; e 2% não sabem.
A condenação do político, pela prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, com relação ao aludido imóvel, ocorreu em julho 2017 e foi confirmada, em 2ª instância, em janeiro de 2018.
Em abril daquele ano, logo após o ex-presidente iniciar o cumprimento da pena, o Datafolha perguntou a opinião dos entrevistados sobre a prisão, tendo obtido o seguinte resultado: Justa: 54%; Injusta: 40%; Não sabe/não respondeu: 6%.
O levantamento realizado em 2018 ouviu 4.194 pessoas, em 227 municípios.
Seria extremamente interessante que a pesquisa não somente apresentasse o resultado sobre a preferência das pessoas consultadas, mas, em especial, o que realmente interessa para a motivação, se ideológica, política, religião, piedade, incompetência, imaturidade, indiferença, desprezo aos princípios da ética e da moralidade ou outras causas predominantes para se chegar à conclusão de que a maioria dos entrevistados, mais precisamente 54%, considera justa que um criminoso, assim considerado pelo Poder Judiciário, diante de graves fatos investigados sob a incumbência de entidades extremamente confiáveis, saia da cadeia sem ter absolutamente nada que comprovasse a sua inocência.
Ou seja, causa a maior perplexidade que a maioria de 2.948 pessoas, aproximadamente 1.592 pessoas, chegue ao incrível entendimento de que é muito justo que condenado saia da prisão sem cumprir o total da pena aplicada pela Justiça, em razão de algo errado causado à sociedade ou à administração pública, em evidente afronta aos princípios republicano e democrático, fato que nem deve acontecer mais nas piores republiquetas, à luz dos princípios da ética e moralidade.
É óbvio que seria justo sim que o condenado tivesse a dignidade de sair da prisão precisamente depois de provar, pelos meios jurídicos cabíveis, mostrando que os fatos cuja autoria lhe é atribuída não são capazes de macular a sua idoneidade, o seu caráter ou a sua conduta como homem público, mas nada disso aconteceu e ainda há quem ache isso justo, em alarmante índice.
Não há a menor dúvida de que isso, lamentavelmente, só demonstra a índole injustificável, impensada, de pessoas que concordam com a impunidade, dando a entender que o crime compensa, diante da clara repugnância à condenação.
À toda evidência, esse fato representa, com muita clareza, cumplicidade com os malfeitos, com a criminalidade, em explícito apoio ao delinquente, que somente teria duas alternativas pessoais: a comprovação da sua inocência ou o integral cumprimento da condenação judicial, enquanto resta à sociedade única alternativa de exigir que a legislação penal seja devidamente observada contra as pessoas fora da lei, estando na condição de não comprovação da sua inocência.
Na verdade, essa forma de manifestação de parte da sociedade reflete, de maneira cristalina, diante do absurdo que isso representa, em termos de moralidade no seio da população, como regra geral, que parte do Brasil ainda é povoada por gente primitiva, por demonstrar relativa ignorância sobre o que realmente significam os requisitos indispensáveis quanto à evolução inerente aos princípios de civilidade, no exato entendimento que há justiça na soltura de condenado, em contrariedade ao sentimento de punição pela prática de crimes praticados contra a sociedade.
Certamente que, nos países com o mínimo de seriedade e civilidade, em termos de evolução humanitária, onde a sociedade tem real consciência sobre o sentimento da pureza de princípios e mais ainda sobre o verdadeiro sentido das condutas ética e moral, por certo o resultado da pesquisa, para o mesmo quesito, teria a resposta taxativa de cem por cento para a injustiça da liberdade de criminoso condenado pela Justiça, porque, tanto lá como aqui, ninguém é julgado e condenado sem a devida prova nos autos.
Diante desse contexto que globaliza o mundo da criminalidade, o universo das condenações impostas pelo Poder Judiciário, parece razoável que se questione os exclusivos interesse e finalidade de se aplicar a pesquisa direcionada a importante homem público, quando a sociedade precisa se manifestar sobre a soltura dos condenados em geral abrangidos pela interpretação do Supremo Tribunal Federal?
Conviria que a consulta fosse abrangente, para auscultar o sentimento da sociedade também com relação a outros criminosos que possam ser beneficiados pela mesma regra, quando se teria melhor condições sobre a avaliação pretendida, que, em princípio, parece atender a objetivos específicos, o que demonstra parcialidade inaceitável, em termos de seriedade e compromisso com os princípios e as condutas civilizatórias.
Por fim, a sociedade quer saber se o sentimento retratado pela pesquisa em comento seria o mesmo com relação a outro criminoso não político, desconhecido da sociedade, mas com a mesma índole criminosa, porque condenado, evidentemente depois de julgados pela Justiça, passam a ser todos iguais, em termos de enquadramento como fora da lei, não importando a sua relevância na sociedade, antes da condenação?
Essa demonstração de desvio de mentalidade por parte de brasileiros, por achar justa a soltura de condenado, sem aparente motivação sobre a sua plausibilidade, é extremamente prejudicial à construção da sociedade sadia e purificada, onde o seu pensamento não possa ter influência senão sobre as coisas voltadas para o bem comum, o interesse público, com base apenas nos melhores princípios da imaculabilidade, imunes às influências ou interferências ideológica, religiosa, política, sentimental, cultural etc., em harmonia com a evolução da humanidade, que já evidenciou que o homem, para o seu bem e da humanidade, precisa agir em sintonia com a racionalidade, como forma de valorização da espécie humana.     
Brasília, em 13 de dezembro de 2019

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