sábado, 8 de janeiro de 2022

Eleições limpas?

 

O presidente da República afirmou que as eleições de 2022 serão "limpas" porque as Forças Armadas irão participar de "todo o processo eleitoral", em que pese a indicação, como que desacreditando dele de que existiriam supostas "fragilidades" no sistema.

O presidente do país disse que "Tenho certeza que vamos ter eleições limpas. As Forças Armadas foram convidadas e vamos participar de todo o processo eleitoral (sic).".

Durante vários meses no ano passado, até os atos do dia 7 de Setembro, o presidente do país fomentou, de maneira reiterada e ingênua, dúvidas sobre a segurança e a confiabilidade das urnas eletrônicas, tendo inclusive pedido a aprovação do voto impresso, que foi negada pelo Congresso Nacional, e ainda chegou a insinuar que não haveria eleições este ano, caso o voto auditável não fosse implantado no país.

Não obstante, pressionado pelos partidos integrantes do Centrão, que passaram a compor a base do seu governo, o presidente do país amainou o tom agressivo e passou a aceitar, mas não de todo, a ideia de que as eleições seriam seguras depois que as Forças Armadas foram convidadas a participar do grupo formado pelo Tribunal Superior Eleitoral que acompanha o pleito.

Em evidente persistência da dúvida, recentemente, o presidente do país voltou a questionar a lisura das urnas eletrônicas, ao dizer que o Ministério da Defesa tinha levantado pontos sobre a "fragilidade das urnas eletrônicas", que, segundo ele, precisam ser explicados.

Em conclusão do seu discurso, o presidente do país houve por bem fazer ameaças, dizendo que "Não vai ser com bravata que vamos aceitar o que querem nos impor. Teremos eleições limpas e transparentes".

Causa estranheza que o presidente do país cite a existência de fragilidades das urnas, mas, inexplicavelmente, ele não as explicite, quando o correto é tanto se fazer a indicação dos pontos questionáveis e indicá-los para os brasileiros, à vista do consagrado princípio da transparência que precisa imperar na administração pública, onde nada pode ficar sob sigilo, notadamente no que se refere ao funcionamento do sistema eleitoral, que até pode não ser perfeito, porque quase nada é perfeito, mas ninguém conseguiu provar a existência de falhas nesse sistema, a ponto de ter prejudicado o resultado das urnas, salvo milhares de suspeitas que precisam urgentemente que elas sejam provadas por meio de elementos consistentes e válidos juridicamente.  

Nas insistentes falas do presidente do país, fica muito evidente a falta de paz de espírito que atormenta terrivelmente a sua alma, a ponto de ele não confiar no sistema eleitoral brasileiro, quando ele fez bravatas sobre a existência de votações fraudadas, mas foi incapaz de indicar um único caso suficiente para provar a sua teoria do imaginário, sendo obrigado ao ridículo de dizer que não tinha provas, para que a sua credibilidade, nesse particular, não se tornasse ainda mais prejudicada, porque não pode haver coisa pior do que se questionar algo sendo, ao mesmo tempo, incapaz para sustentar as suspeitas com base em elementos probatórios.

Essa absurda preocupação do presidente do país, com as urnas eletrônicas, termina prejudicando o seu desempenho no cargo, por ter o condão de o impedir de se dedicar à solução dos gravíssimos assuntos afetos exclusivamente à sua competência constitucional, uma vez que ele não consegue abandonar do pensamento algo que devora a sua tranquilidade, nem mesmo havendo a importante participação das Forças Armadas, que tem competência para avaliar a segurança e a eficiência do sistema eleitoral brasileiro.

Não fica nada bem para a imagem do presidente do país fazer ameaças sobre algo inexistente, quando alega, de forma insensata e despropositada, diante da inexistência de fundamento ou consistência, de que “Não vai ser com bravata que vamos aceitar o que querem nos impor.”.

Não passa de pura insensatez em se falar em bravata sobre o sistema eleitoral brasileiro que vem funcionando na forma da lei, cuja legitimidade, até se provar em contrário, vem sendo confirmada em todas as eleições, salvo se houve e até deve ter havido fraude na manipulação interna da contagem dos votos, mas isso também, por enquanto, ainda não foi nada comprovado, o que vale dizer que bravata mesmo é se suspeitar sobre a existência de fraudes e não ter como comprová-las, pelos meios juridicamente válidos, porque é exatamente assim a credibilidade eleitoral que funciona nos país sérios, evoluídos e civilizados, em termos político-democráticos.

É preciso se esclarecer às autoridades públicas que não existe a ideia imaginária e sem fundamento no sentido de que “querem nos impor”, porque o sistema eleitoral brasileiro foi imposto, ou melhor, isto sim aprovado por lei, cujas normas, que são censuradas indevidas e casuisticamente por quem tem o dever legal de respeitá-las, no caso, por falta de provas, vêm sendo observadas normalmente nas eleições, inclusive na última, tal e qual como previsto na forma da lei aplicável ao caso, o que vale dizer que é ingenuidade se afirmar em bravata e até em imposição, diante da inexistência de amparo fático para tanto.

A autoridade pública, para conquistar credibilidade da sociedade, precisa agir e atuar sob os princípios da verdade dos fatos, procurando identificar precisamente as questões que possam obstaculizar a perfeita dinâmica da gestão pública e adotar as medidas necessárias ao seu aperfeiçoamento, de modo que todas as medidas apresentadas tenham por parâmetro apenas o critério da sensatez, da competência e da responsabilidade, em consonância com os princípios ínsitos da administração pública, voltados exclusivamente para a plena satisfação do interesse da população.

Enfim, caso o presidente do país tivesse o mínimo sentimento de sensatez político-administrativa e realmente quisesse solucionar a angústia que vem torrando o seu juízo, em especial com relação às urnas eletrônicas, por se tratar de assunto da maior importância para a legitimidade do sistema eleitoral brasileiro, ele simplesmente poderia constituir comissão de especialistas, tendo por objetivo o estudo da matéria, com vistas à apresentação de projeto de lei pertinente, com capacidade para sanear possíveis deficiências, sem necessidade desse terrível tormento que o persegue permanentemente, quando ele tem autoridade e competência plenas para solucioná-lo, em definitivo, bastando apenas o emprego dos princípios da sensatez, da competência e da racionalidade administrativas.         

Convém que os homens públicos primem pelas dignidade e grandeza das causas públicas, somente decidindo e tratando os assuntos com base nos princípios da seriedade, sensatez, competência e responsabilidade, no âmbito das suas atribuições constitucionais, de modo que a sua atuação possa apenas contribuir para o bem da sociedade, evidentemente tendo por base o conceito da veracidade e da segurança sobre a materialidade deles, sob pena de se cair no ridículo da perda de tempo com a exploração de fatos inexistentes, sem se chegar a lugar algum.

Brasília, em 8 de janeiro de 2022

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