terça-feira, 4 de janeiro de 2022

O pior sentimento do ódio

         Não é que bolsonaristas estejam errados, mas é bastante estranho que eles usem as redes sociais para cobrar apuração pelo Supremo Tribunal Federal sobre supostos ataques e ameaças contra o presidente da República, após a internação dele, para tratamento de obstrução intestinal. 

Em especial, um deputado federal e um dos filhos do presidente cobraram ação do Supremo nesse sentido, porquanto o parlamentar citou como ameaça post em que um ator global disse que deseja que o presidente exploda.

No Twitter, o deputado disse que "Alguma investigação, diligência ou atitude parecida será tomada com os donos das contas das mídias sociais que ameaçam e desrespeitam o presidente?”. 

Ao compartilhar a postagem do ator, o filho do presidente marcou a página do Supremo, na plataforma, cobrando medidas da corte.

O ex-secretário de Comunicação da Presidência da República afirmou que "qualquer incentivo/ameaça à vida do presidente deveria ser considerada promoção da instabilidade institucional e da ordem democrática". 

Os bolsonaristas usaram as redes sociais para classificaram a ira ao presidente como "ódio do bem", a exemplo das postagens do ator e de outras páginas em que muitas pessoas desejam a morte do presidente ou questionam a internação após passar mal durante as férias em Santa Catarina. 

Uma deputada federal disse que "Esse ódio do bem está dando muita raiva. Polarizar sobre política é uma coisa. Desejar a morte é outra completamente diferente".

Sob o aspecto dos direitos humanos, não resta a menor dúvida de que somente a nefasta e doentia ideologia política pode acomodar o desejo de alguém agredir o seu semelhante com o sentimento do asco da morte ou de qualquer má sorte para a pessoa que não tenha simpatia, como nesse caso que acontece contra o presidente do país.

A sensação que fica é a de verdadeiro sentimento de irracionalidade que alguém chegue ao extremo do ódio para extravasá-lo por meio do pior desejo de vingança, somente porque não gosta da pessoa, porque isso só expõe o baixíssimo nível de desumanidade e mediocridade de quem se comporta com tamanha maldade impregnada na mente e no coração.

Na verdade, essa forma de comportamento animalesco se tornou normal, no Brasil, por força do irracional culto à ideologia política, que tem como cerne o endeusamento de lideranças políticas, que são valorizadas como o suprassumo de todas as causas, de modo que outras pessoas opositoras passam a merecer total desprezo, por força do antagonismo de desumanidade que foi institucionalizado pelos ídolos de esquerda, que conseguiram plantar a arraigada ideia do “nós contra eles”, em que o “nós” são os puros sabidões e poderosos que estão na superfície e os “eles” representam o nada, que precisa ser tratado em forma de isolamento social.

Vê-se, com muita clareza, que a ideologia do ódio se mostra cada vez mais agressiva e prejudicial ao relacionamento social, diante da monstruosidade exposta por seus cultores, de ambos os lados, que se alimentam pelo intenso desejo de vingança e destruição de seus adversários, conforme fica patente nesse caso, em que muitos compartilham a triste ideia de se satisfazerem com o desejo de que o presidente não fique bom o quanto antes, mas sim que ele morra ou exploda, ficando muito evidente o puro sentimento de incompreensível desumanidade, que é absolutamente incompatível com a normalidade e racionalidade humanas.      

Cite-se, a propósito, a ânsia dos bolsonaristas em querer que o Supremo mostre suas garras sobre os abutres que querem o fim do presidente do país, entendendo que aquela corte foi severa com os trogloditas que ameaçaram matar ministros, embora a argumentação do mandatário e de seguidores dele tem sido que isso faz parte do direito de manifestação, no âmbito da liberdade de expressão.

Vejam-se o que os bolsonaristas entendem como liberdade de expressão usada por seguidores do presidente do país, textos como os seguintes: Morra careca filho da... terça-feira vamos te matar e toda sua família (...) sou PM e nós militares te eliminaremos.”. “Agora no Brasil, com os ministros do Supremo, vai ser assim, vai ter prêmio pela cabeça deles”, entre outras agressões sempre do mesmo quilate, que são contrárias aos princípios humanitários e de respeito à dignidade.

Como entender esse povo, em que, para ele, as ameaças de morte, que têm o mesmo sentido da pretensão de morte, não passam de livre manifestação da vontade, na contextualização da liberdade de expressão, o que não é verdade mesmo, tanto que teve o devido entendimento pelo Supremo, cujo ministro decidiu sancionar os agressores, na forma da lei, a despeito de que o presidente do país e seus apoiadores divergirem dessas medidas, apenas no âmbito do esperneio, sem o menor fundamento jurídico.

É preciso ficar claro que os ministros do Supremo agiram em sua defesa sob o pálio da lei, o que é diferente do presidente do país, que precisa entrar com recurso na Justiça, em cada caso, exigindo a reparação do dano à sua imagem por parte daqueles que agrediram a sua honra, porque é assim que a Justiça funciona, não havendo a menor possibilidade de o Supremo apurar, como exigiram os seguidores do presidente, porque as situações são distintas, em termos da compreensão judicial, na forma da lei.

Compete exclusivamente ao presidente do país ou a quem ele represente legalmente a iniciativa de impetrar recurso sobre quem investe contra a “instabilidade institucional e da ordem democrática" ou a dignidade do mandatário, não tendo o Supremo competência para tanto, ficando claro que é absolutamente indevida e injusta a cobrança para que ele promova apuração dos fatos em comento.

Urge que os brasileiros se conscientizem de que não existe sociedade civilizada e evoluída sem o devido respeito aos princípios humanitários, em que os direitos de cada cidadão terminam precisamente quando começam os do outro, e que a sociedade somente se torna digna e valorizada quando todos os princípios e direitos aplicáveis ao homem sejam devidamente respeitados.

           Brasília, em 4 de janeiro de 2022

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